Os Deep Purple está de volta com Turning to Crime, vigésimo segundo álbum de estúdio gravado pela banda. O grande chamariz do álbum é o repertório composto apenas por covers, algo até então inédito na carreira . Aliás, esta opção causou uma certa apreensão nos fãs, mas os motivos são bastante razoáveis: como alguns dos integrantes vivem em países diferentes, reunir a banda e a equipe em estúdio para compor e gravar durante a pandemia não era uma opção viável, sendo assim, para não deixar o ano passar batido, surgiu a ideia de gravar remotamente um álbum com versões para canções de outros artistas.
Para coordenar as atividades, o grupo reeditou a bem-sucedida parceria com Bob Ezrin (Pink Floyd, Lou Reed, Alice Cooper e Kiss), responsável por produzir os três últimos trabalhos da banda. Turning to Crime chega às lojas e serviços de streaming pouco mais de um ano após o lançamento do elogiado Whoosh!.
As 12 canções selecionadas são bem diversificadas e fogem da obviedade na maioria nos casos. Afinal de contas, quem esperaria ouvir o Deep Purple interpretando “Dixie Chicken” clássico da banda de southern rock Little Feat ,“Let the Good Times Roll”, um standard do jazz composto por Louis Jordan ou a country “The Battle of New Orleans” imortalizada por Johnny Horton nos Estados Unidos e por Lonnie Donegan no Reino Unido? Provavelmente ninguém.
O álbum abre com a psicodélica “7 And 7 Is”, um dos poucos hits da banda californiana Love. Aqui a canção ganhou peso e solos atmosféricos de guitarra e sintetizador. O clima muda um pouco na sequência com a divertida “Rockin’ Pneumonia and the Boogie Woogie Flu” (composição de Huey “Piano” Smith), sucedida por uma poderosa versão para “Oh Well”, um blues rock do Fleetwood Mac (era Peter Green).
O rock de garagem dos anos 60 é lembrado numa versão frenética para “Jenny Take A Ride!” (Mitch Ryder & The Detroit Wheels). “Watching the River Flow”, composição de Bob Dylan, recebeu uma roupagem honky-tonk. “Let the Good Times Roll”, por sua vez, manteve a verve original pontuada por metais e ganhou um inspirado solo de órgão Hammond tocado por Don Airey no melhor estilo Jimmy Smith.
A banda não faz feio na inusitada regravação para “Dixie Chicken”, mantendo a pegada suingada proposta pelo Little Feat. “Shapes of Things”, recebeu um tratamento mais lento e mais pesado que a gravação dos Yardbirds.
O baixista Roger Glover divide os vocais com Ian Gillan em “The Battle of New Orleans”, propiciando um momento de pura descontração. Em “Lucifer”, de Bob Seger, a banda passeia pela crueza do rock de Detroit. “White Room”, uma das músicas mais marcantes do Cream, talvez seja a escolha mais óbvia do disco. Entretanto, o Purple sabidamente acrescentou algumas novas nuances à canção, evitando assim a chamada reprodução nota por nota.
O encerramento do disco fica por conta de “Caught in the Act”, um medley despojado com trechos de “Going Down” (Freddie King), “Green Onions” (Booker T. & the M.G.’s), “Hot Lanta” (The Allman Brothers Band), “Dazed and Confused” (Led Zeppelin) e Gimme Some Lovin’ (Spencer Davis Group).
É impossível não falar sobre dos atributos musicais dos integrantes do Deep Purple. Ian Paice constrói levadas de bateria repletas de groove e pegada. Don Airey é praticamente uma enciclopédia musical, capaz de tocar com profundidade e brilhantismo qualquer tipo de gênero – do jazz ao hard rock. Ian Gillan, dono de uma das vozes mais marcantes do rock, ainda mantém a solidez do passado, ainda que tenha perdido parte dos agudos devido à idade avançada. Steve Morse, diminuiu um pouco a “fritação” de outrora devido a problemas nos dedos, passando a escolher as notas com maior sobriedade privilegiando o feeling. Roger Glover segura as pontas com linhas de baixo precisas e sem exageros. Todas essas competências instrumentais se fazem notar em cada faixa do álbum.
Também é preciso exaltar o trabalho de Bob Ezrin na produção e mixagem do disco. Apesar de ter sido gravado individualmente pelos músicos em vários estúdios espalhados pelo mundo, a sonoridade do álbum é impressionante e sem pontas soltas. É possível ouvir cada instrumento com bastante definição.
Em Turning to Crime o Deep Purple não pisa em nenhuma casca de banana e entrega ao ouvinte um trabalho divertido, despretensioso e repleto de musicalidade. Um bom remédio para os tempos sombrios em que vivemos.
FICHA TÉCNICA:
Artista: Deep Purple
Álbum: Turning to Crime
Produção: Bob Ezrin
Duração: 49m
Data de lançamento: 26 de novembro de 2021
Gravadora/Selo: earMUSIC/Shinigami Records (Brasil)
Faixas:
01. “7 and 7 Is” (Love)
02. “Rockin’ Pneumonia and the Boogie Woogie Flu” (Huey “Piano” Smith)
03. “Oh Well” (Fleetwood Mac)
04. “Jenny Take A Ride!” (Mitch Ryder & The Detroit Wheels)
05. “Watching the River Flow” (Bob Dylan)
06. “Let the Good Times Roll” (Ray Charles & Quincy Jones)
07. “Dixie Chicken” (Little Feat)
08. “Shapes of Things” (Yardbirds)
09. “The Battle of New Orleans” (Lonnie Donegan/Johnny Horton)
10. “Lucifer” (Bob Seger System)
11. “White Room” (Cream)
12. “Caught in the Act” (Medley: “Going Down”/”Green Onions”/”Hot ‘Lanta”/”Dazed and Confused” /”Gimme Some Lovin'”)
Clique aqui para ouvir Turning to Crime nas plataformas de streaming.
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