quinta-feira, 16 de fevereiro de 2023

10 discos essenciais: New Wave


Austr


Por volta de 1978, a fúria punk que havia estourado em 1976 sob a liderança dos Sex Pistols e que havia sacodido a cena musical britânica, começa a entrar em declínio. Mesmo assim, o movimento deixou um legado que marcaria tudo o que seria feito no rock nos anos seguintes. Enquanto isso, uma nova geração de bandas começava a despontar, trazendo consigo alguns ensinamentos do punk como a simplicidade e economia dos três acordes, e o lema “faça você mesmo”, em que qualquer um poderia montar a sua banda de rock, numa clara oposição ao virtuosismo e excessos de perfeccionismo das grandes estrelas do rock progressivo. 

Contudo, essas novas bandas rejeitavam a postura sisuda, agressiva e pessimista do punk. Preferiam uma conduta mais divertida, alegre e colorida. Logo, essa nova geração de bandas foi rotulada pela imprensa musical britânica de “new wave” (“nova onda”). Já era usada em 1976 pelo fanzine punk Sniffin' Glue e pelo semanário inglês Melody Maker. O emprego do termo buscava designar aquelas bandas que, embora tenham se originado na explosão punk em 1976, procuravam ampliar o seu arco de referências musicais dentro de uma conotação pop. 

Na Inglaterra, artistas como Ian Dury, Nick Lowe, Elvis Costello, Joe Jackson, XTC e The Police foram os primeiros tachados de “new wave”. Do outro lado do Atlântico, nos Estados Unidos, os primeiros artistas considerados new waves foram Talking Heads e Blondie, duas bandas que faziam parte da efervescente cena roqueira independente nova-iorquina de meados dos anos 1970, que tinha como ponto irradiador a casa noturna CBGB, onde tocaram também bandas punks como Ramones e The Mistifs. 

Assim como a imprensa, algumas gravadoras também fizeram uso do termo “new wave” pelas mesmas razões. Em 1976, a gravadora Sire Records começou a contratar bandas que tocavam na CBGB, e para melhor comercializá-las, a companhia as divulgava usando o termo “new wave” porque a imprensa musical americana afirmava que o punk era uma “moda passageira”. A Phonogram lançou em 1977 a compilação New Wave reunindo várias bandas que, na prática, eram em sua maioria punks, como Ramones, The Dead Boys, Richard Hell & The Voidoids e The Damned, mas que incluía também Talking Heads, talvez a única banda new wave presente nessa compilação. O termo “punk” parecia ter virado uma palavra de baixo calão no meio fonográfico americano. “New wave”, por sua vez, soava comercialmente mais “agradável”, “inofensivo” ao consumidor na visão das companhias. 

Musicalmente, a new wave era mais diversificada do que o punk rock. O estilo possibilitava experimentar outras referências musicais como reggae, funk, soul, ska, música eletrônica e até disco music. Ao mesmo tempo, a new wave também tinha uma inclinação ao passado, ao flertar com o rockabilly dos anos 1950 e o pop adolescente dos anos 1960 como as girl groups e o bubblegum. Contudo, ao resgatar alguns elementos do passado da música pop, não significava que a new wave fosse ingênua. Haviam bandas que faziam uso do humor e do deboche (B-52’s, Devo e Nina Hagen) e outras guardavam algum discurso um pouco mais politizado (The Police e Elvis Costello). 

Com o declínio da disco music na virada dos anos 1970 para os anos 1980, a new wave alcançou grande popularidade, avançando à nova década que se iniciava. A sua vocação pop e comercial só facilitou as coisas, atraindo a atenção das grandes gravadoras ávidas em faturar naquele novo estilo musical. 

À medida que a new wave crescia e ampliava a sua popularidade, ela acabou dando origem a novos subgêneros como new romantic e o synthpop na primeira metade dos anos 1980. Enquanto o new romantic se caracterizava pelo visual andrógino, multiétnico ou histórico, o synthpop foi marcado pela música essencialmente eletrônica com o emprego de sintetizadores, instrumentos que também foram bastante utilizados por alguns artistas da new wave e do próprio new romantic. Tanto o new romantic como o synthpop herdaram da new wave a vocação para uma musicalidade essencialmente pop, acessível e radiofônica. 

O surgimento da MTV nos Estados Unidos, em 1981, foi responsável pela popularização da new wave naquele país e, consequentemente, no resto do planeta. A propagação da new wave em escala global influenciou a cena roqueira dos mais diversos países como França, Alemanha, Itália, Portugal, Japão, Argentina e Brasil no começo dos anos 1980. 

No Brasil, a new wave foi de uma importância gigantesca ao revitalizar o rock brasileiro, que até àquele momento, andava combalido. A chegada da new wave ao Brasil abriu espaço no mercado musical para uma nova geração de bandas e cantores do rock brasileiro como Gang 90 & Absurdettes, Blitz, Lulu Santos, Ritchie, Rádio Táxi, Magazine, Lobão & Os Ronaldos, Metrô entre outros. 

Além da música, a new wave ficou marcada também pelo visual: figurino colorido (que poderia ter um aspecto retrô ou futurista), cabelos com cortes e colorações extravagantes, batons com cores vivas assim como a maquiagem bem acentuada. 

Como todo modismo, a new wave entrou em declínio na segunda metade dos anos 1980, diante da ascensão do glam metal, do rap, da house music e do grunge. No Reino Unido, durante os anos 1990, houve uma tentativa de “ressurreição” da new wave através de bandas como Elastica, These Animal Men e Done Lying Down, mas a ideia fracassou ante a força do britpop que estava em voga na época. No começo dos anos 2000, ocorreu um “revival” da new wave e do pós-punk por meio de bandas como The Strokes, Interpol, Franz Ferdinand, Bloc Party entre outras. Durante os anos 2000, tendências da música eletrônica contemporânea como a new rave, somaram elementos da new wave à sonoridade eletrônica. Isso revela que a new wave, de alguma forma, ainda sobrevive e exerce alguma influência na música pop. 

Abaixo, confira dez discos essenciais para conhecer melhor a new wave. 

Talking Heads: 77 (Sire Records, 1977), Talking Heads. Os Talking Heads foram uma das bandas mais importantes da cena alternativa de rock na Nova York de meados dos anos 1970, ao lado de Patti Smith, Ramones, Blondie, Television entre outros. Embora apresente uma sonoridade minimalista, simples, enxuta, Talking Heads: 77, álbum de estreia do quarteto nova-iorquino, já dava indícios do experimentalismo rítmico que a banda iria adotar nos álbuns seguintes, como nas faixas “Tentative Decisions”, “Who Is It?” e “First Week/Last Week ... Carefree”. No entanto, evidentemente que a faixa mais popular é de longe “Psycho Killer”.


 

My Aim Is True (Stiff  Records, 1977), Elvis Costello. Seu nome de batismo é Declan Patrick Macmanus, porém ganhou fama como Elvis Costello. Foi uma das figuras mais representativas da new wave britânica, tanto pelo seu talento como pelo seu visual nerd que faz lembrar o de Buddy Holly (1936-1959). O resgate dos primórdios do rock’n’roll se refletiu também no trabalho de Costello, como neste seu primeiro álbum, My Aim Is True. É possível encontrar traços de estilos musicais populares das décadas de 1950 e 1960 como doo-wop (“Alison”, “Miracle Man” e “No Dancing) e rockabilly (“Less Than Zero”, “Mystery Dance” e “Sneaky Feelings”), porém tudo turbinado referências de new wave, punk e power pop.

 

Q: Are We Not Men? A: We Are Devo! (Warner, 1978), Devo. Formada em 1973 na cidade de Akron, no estado de Ohio, nos Estados Unidos, a banda Devo se notabilizou pelas esquisitices de seus integrantes. A começar pelo figurino: os integrantes costumavam se apresentar vestindo macacões idênticos. Mas o que marcou a carreira da banda mesmo foi a teoria da “de-evolução”, segundo a qual, a raça humana estaria regredindo, voltando ao ser humano pré-histórico. Isso explica o porquê da banda se chamar Devo. O que parece ser uma teoria maluca, no fundo é uma crítica bem debochada da banda ao consumismo e ao individualismo da sociedade contemporânea. Q: Are We Not Men? A: We Are Devo!, álbum de estreia do Devo,  reflete o humor inteligente da banda. Além dos hits “Jocko Homo”, “Mongoloid” e “Space Junk”, o álbum contém uma versão bem amalucada do Devo para “(I Can't Get No) Satisfaction”, dos Rolling Stones.

 

The Cars (Elektra, 1978), The Cars. Este é sem sombra de um dos mais bem sucedidos álbuns da new wave, comercialmente falando. O álbum mais parece uma coletânea de grane sucessos: “My Best Friend’s Girls”, “Just What I Needed”, “Bye Bye Love” e “All Mixed Up”. A receita do sucesso de The Cars, o álbum, resida na receita bem elaborada ao combinar new wave e power pop com apelo radiofônico, e letras recheadas de ironia e sarcasmo. E o resultado não poderia ser outro: mais de 6 milhões de cópias vendidas.



Look Sharp! (A&M, 1979), Joe Jackson. Diferente de boa parte dos seus contemporâneos da new wave britânica, Joe Jackson teve uma formação musical desde a infância até a juventude, chegando até a estudar composição musical na Royal Academy of Music, em Londres, Inglaterra. Essa boa formação musical de Jackson se refletiu na qualidade dos arranjos e na produção dos seus discos. Look Sharp!, primeiro álbum da carreira de Joe Jackson, apresenta todo esse cuidado e bom gosto do artista. É um trabalho pop por excelência, onde é possível perceber referências de reggae, jazz e até rockabilly. Por causa do seu cuidado e refinamento, alguns críticos musicais da Grã-Bretanha costumavam dizer que Joe Jackson era uma das figuras mais inteligentes na new wave britânica, ao lado de Elvis Costello e Graham Parker Jr. Faixas como “Is She Really Going Out With Him?”, “One More Time”, “Fools In Love” e a faixa-título são uma prova de que quando se quer, é possível empregar requinte a canções com apelo pop.

 

Parallel Lines (Chrysalis, 1978), Blondie. Terceiro álbum de estúdio do Blondie, Parallel Lines tinha tudo para dar errado e ser um fracasso comercial. Foi o primeiro álbum do Blondie produzido por Mike Chapman, e a relação inicial do produtor com a banda, a princípio, não foi das mais amigáveis, especialmente por parte da vocalista Debbie Harry. No entanto, no decorrer das gravações, as coisas se acertaram. O saldo positivo foi que Chapman, um especialista na produção de discos com apelo radiofônico, soube extrair do Blondie todo o potencial para uma sonoridade pop que a banda poderia oferecer. Ao longo das doze faixas, o Blondie passeia pelo power pop, surf music, baladas, reggae, pop “chiclete” dos anos 1960 e até disco music. Graças a Parallel Lines, o Blondie foi catapultado para o estrelato do rock internacional graças a um coleção de hits contidos no álbum como “Sunday Girl”, “Picture This”, “Hanging On The Telephone”, “One Way Or Another” e, claro, “Heart Of Glass”, o maior sucesso da carreira do sexteto nova-iorquino.  

 

Regatta de Blanc (A&M Records, 1979), The Police. O Police surgiu como uma grata e surpreendente surpresa no final dos anos 1970, como uma banda formada por três rapazes louros misturando reggae, punk e música pop, cujo resultado é uma fusão musical irresistível, radiofônica e inteligente. Regatta de Blanc (título esquisito que significa “reggae de branco”) é o segundo álbum de estúdio do Police, e dá continuidade a essa bem sucedida fusão iniciada no primeiro e homônimo álbum do trio britânico, lançado em 1977. Dois dos maiores sucessos da carreira do Police estão em Regatta de Blanc, “Message In The Bottle” e “Walking On The Moon”.

 

The Pretenders (Sire Records, 1979), The Pretenders. Embora nascida em Akron, nos Estados Unidos, Chrissie Hynde começou a sua carreira no mundo da música quando mudou-se para Londres, Inglaterra, em 1973, aos 22 anos, trabalhando como repórter da revista de música NME (Ne Music Expresse). Durante cinco anos na NME, escreveu resenhas de discos e entrevistou astros de rock, até que em 1978, ela Hynde decidiu montar a sua própria banda, The Pretenders. Em seu primeiro e homônimo álbum, os Pretenders promovem uma bem dosada mescla de punk, pop e new wave. O álbum estreou em 1° lugar na parada britânica de álbuns, puxado pelo hit “Brass In Pocket”.

 

The B-52’s (Warner, 1979), The B-52’s. Fundada em 1976 na cidade Athens, no estado da Georgia, Estados Unidos, os B-52’s é uma das mais populares bandas da história da new wave. A banda é a própria personificação do estilo. O B-52’s resgatou a estética da cultura pop da primeira metade dos anos 1960 ao trazer de volta o penteado “bolo de noiva” (beehive hairstyle, nos Estados Unidos), os figurinos de filmes B de ficção-científica, histórias-em-quadrinhos entre outras referências. Tais referências embrulhadas numa embalagem new wave estão presentes no ótimo e autointitulado álbum de estreia da banda, que contém dos maiores sucessos do B-52’s, “Rock Lobster” e “Planet Claire”. É diversão garantida.

 

Beauty And the Beat (IRS Records, 1981), The Go-Go’s. Pode nem parecer, mas as Go-Go’s, quando surgiram em Los Angeles, em 1978, era uma banda de punk rock. Após algumas trocas de integrantes, as Go-Go’s viraram uma banda alegre e solar banda new wave. Beauty And the Beat é o primeiro álbum de estúdio das meninas, que logo de saída, foi um grande sucesso comercial, chegando a alcançar mais de 2 milhões de cópias vendidas. As duas faixas mais conhecidas do álbum, “We Got The Beat” e “Our Lips Are Sealed”, foram responsáveis por alavancar o álbum. No Brasil, , “We Got The Beat” e “Our Lips Are Sealed” foram incluídas na trilha sonora do filme Menino do Rio, de Antônio Calmon.

 



“Psycho Killer” - Talking Heads
(apresentação ao vivo no Old Grey Whistle Test Show
no canal BBC2, em Londres, Inglaterra, 1978)


“Hanging On The Telephone” - Blondie
(videoclipe original - 1978)


“Just What I Needed” - The Cars
(videoclipe original - 1978)


 “Message In The Bottle”  - The Police
(videoclipe - 1979)


“Brass In Pocket” - The Pretenders
(videoclipe original 1979)


“Rock Lobster” - The B-52's
(apresentação no programa Countdown na  rede de 
TV Australian Broadcasting Corporation (ABC)
Austrália, 1980)


“Our Lips Are Sealed” - The Go-Go's
(videoclipe original -1981)


Sem comentários:

Enviar um comentário

Destaque

However "Sudden Dusk" (1981)

  A história da formação americana  do Contudo  (McLean, Virgínia) é ramificada ao ponto da impossibilidade. Ao abordar o assunto, os cronis...