Resenha
Still Life
Álbum de Opeth
1999
CD/LP
Me lembro até hoje de quando ouvi Still Life pela primeira vez e o quanto fiquei estarrecido com aquilo. Lembro-me que me fiz uma simples pergunta, “onde eu estava que ainda não conhecia esses caras?”, isso no ano de 2006 se eu não estiver enganado. Nesse quarto álbum da banda é mostrado uma clara intenção em expandir o seu som e também de continuar com a sua tendência progressiva. Mikael começa a arriscar pela primeira vez alguns vocais mais suaves e emocionais, antes ele parecia não ter muita confiança em si e achava mais confortável permanecer apenas nos gritos de death metal - não estou dizendo que isso é ruim, mas sim, que ele agora está mais versátil, mostrando um sinal de evolução. Still Life tem muito mais equilíbrio do que os seus predecessores, pois apesar das seções de metal serem ainda mais fortes, poderosas e surpreendentes e os gritos de death metal funcionarem muito bem quando acionados, há mais quebras acústicas e passagens de violão clássico, bem como a sua aura sombria que já costumam ser identificadas antes mesmo antes de ouvirmos as músicas, ou seja, nas capas dos seus discos. Instrumentalmente, podemos ver a marca do Opeth no álbum por meio de músicas longas e complexas estruturadas com trechos contendo riffs pesados e complexos e rosnados intercalados com partes acústicas extremamente suaves. Still Life é um disco conceitual. O personagem principal é banido por uma sociedade majoritariamente odiosa por causa do que parece ser uma diferença de crenças, ele retorna quinze anos depois por um único motivo, sua amada Melinda. Quando ele a encontra, no entanto, ele descobre que um dos homens daquela sociedade corrupta está fazendo o que quer com ela. Ainda assim, ele continua a amá-la e continua determinado a tirá-la daquele lugar. No entanto, ambos são capturados e condenados à morte, sendo Melinda enforcada primeiro. Após esse ocorrido, consumido pela dor e raiva reprimidas, ele mata brutalmente todos os soldados que mataram Melinda, em um ato de agressão antes de sucumbir e desmaiar pela exaustão. Quando ele recupera o controle de sua mente, o Conselho da Cruz está lá para levá-lo. Desacordado, ele emerge de seu estado de sonho, que lentamente se transforma em realidade. O Conselho da Cruz tenta fazê-lo se arrepender, mas ele é irredutível. Ele é conduzido à forca. Em um momento de reflexão antes de morrer, ele sente uma mão em seu ombro e, ao olhar para trás, vê Melinda parada ali, pronta para que ele se junte a ela na morte para finalmente ficarem juntos. Sobre a capa desenvolvida por Travis Smith, o artista gráfico disse, “...depois que Mikael explicou o conceito por trás do álbum, enquanto ele contava a história de como o personagem principal foi banido de sua cidade natal porque não compartilhava de sua fé, então voltou vários anos depois para se reconectar com sua namorada e o que aconteceu depois, a imagem simplesmente veio para mim. O que eu estava fazendo era tentar capturar os sentimentos e emoções de Melinda, a personagem feminina dessa trágica história. É Melinda aceitando a morte de seu amante e a própria morte, a profunda perda que ela tem na época. Escolhi as cores para refletir o fato de que, como acontece com grande parte da música do Opeth, há uma escuridão geral aqui, mas também tem uma qualidade misteriosa. Também criei uma nova arte para Still Life em 2008, quando uma nova edição foi lançada.” “The Moor” inicia o disco por meio de um belo trabalho de violão até que a peça explode em uma passagem instrumental pesadíssima. Uma música que consegue ser pesada, melódica e sofisticada ao mesmo tempo. Os rosnados combinados com cantos mais normais, digamos assim, que servem como backing vocals é maravilhoso. A estrutura da música nem sempre segue uma linha reta, pois entrega algumas variações de estilos e alguns fragmentos de transição em passagens mais calmas e que são dominadas geralmente por violão. O solo de guitarra próximo do sétimo minuto antes da música silenciar é simples e maravilhoso. Uma composição brilhante e que não poderia fazer com que o disco começasse de maneira mais interessante. Com a sua quantidade de emoções contidas, considero “The Moor” uma das melhores músicas de todo o catálogo da banda. “Godheads Lament” já começa cheia de energia e raiva. Essa música - como todas as outras do disco na verdade - é bom ouvir com bons fones e no volume muito alto para ir captando com mais clareza todos os detalhes dos sons produzidos. A guitarra tocada ao fundo em um estilo mais de solo do que base é um dos principais atrativos aqui. Os vocais mais uma vez se equilibram perfeitamente entre o rosnado e canto mais normal – que nesses momentos costumam ter a companhia de violões. No geral é uma faixa cheia de energia e muito dinâmica, simplesmente incrível. Mais uma vez, há um solo de guitarra simples e bonito que ao mesmo tempo reflete muita tristeza. “Benighted”, com 5 minutos é a música mais curta do disco. Uma espécie de exploração psicodélica até então sendo algo inédito feito pela banda. Bastante calma, serena e bonita, possui uma excelente combinação entre violão e um vocal sentimental. A atmosfera combina bastante com a narrativa, em que durante um encontro as escondidas, o personagem tenta convencer Melinda a abandonar sua superstição e ir embora com ele porque ele a ama. Ele diz a ela que ela sofreu uma lavagem cerebral e deveria deixar tudo e ir embora com ele. Quando a bateria entra, a peça se transforma em algo de linhas mais jazzísticas - e até um pouco floydiana na hora do curto solo de guitarra. “Moonlapse Vertigo”, após o descanso da faixa anterior, digamos assim, o disco retorna para uma pegada de energia pura. Há uma grande combinação de guitarra elétrica e violão, linhas sólidas de baixo e uma bateria muito bem direcionada. As guitarras duplas são impetuosas, épicas e góticas, enquanto as partes acústicas exploram um pouco de jazz. Considero que é nessa música em que Mikael desempenha a sua melhor perfomance de death metal de todo o álbum. “Moonlapse Vertigo” é aquele tipo de música que flui tão bem que quando acaba queremos mais, tanto que a música não parece ter os seus nove minutos. “Face Of Melinda” é uma faixa em que pouco mais da primeira metade é suave e extremamente agradável. Um trabalho de violão excelente. A bateria da peça também é muito suave e cria um ambiente jazzístico, tendo a companhia na seção rítmica um baixo fretless. Tudo é tão intimista que parece que estou ouvindo algum tipo de álbum nos moldes de “um barzinho e um violão”. A temperatura da música então aumenta com a entrada da guitarra distorcida – os vocais continuam limpos. O solo de guitarra na parte final - além de novamente simples - é lindo. Sabe com o que eu fico impressionado? Em como que esses caras conseguem ser uma banda de sonoridade tão agressiva e ao mesmo tempo também tão delicada. “Serenity Painted Death” traz o disco novamente para uma linha rítmica de condução pesada e com o vocal rosnado cativante – isso pode soar estranho para algumas pessoas, mas pra mim não. Novamente encontramos algumas melodias grandiosas e algumas das sonoridades mais brutas do álbum. Os riffs de guitarra dão um clima meio caótico à peça, enquanto que alguns harmônicos dobram o caos. Uma música cheia de angústia em que novamente a narrativa combina bastante com a atmosfera, com Melinda sendo levada e enforcada por ser “infiel” com a igreja, com a qual ela deveria ser “casada”, afinal, por não imaginar que seu amado regressasse um dia, ela havia se tornado freira. “White Cluster”, será que teria como a banda deixar o melhor para o final depois de desfilar tanta genialidade no disco? A princípio eu responderia que não, mas após ouvir “White Cluster”, quase que de forma incrédula eu respondo que sim. Se você quer saber o que é um puro death metal progressivo, eis aqui um belíssimo exemplar. Seção rítmica incríveis, além de muito enérgica e dinâmica, guitarras tanto rítmicas quanto solo desfilam de maneira arrasadoras, linhas pulsantes de baixo e uma perfomance vocal maravilhosa. O momento acústico que representa a parte em que o Conselho da Cruz dá ao personagem uma chance de se arrepender e ele nega é arrepiante, mesmo que seja uma parte curta, cria uma imagem assombrosa para a situação de morte iminente. A música então segue novamente cheia de peso até findar de forma muito suave. Um final glorioso para um disco de musicalidade forte e envolvente, além de liricamente ser de uma história trágica. Primeiramente, devo confessar que eu não me lembrava que gostava tanto assim de Still Life. Eu recomendaria esse disco até mesmo para pessoas não familiarizadas em metal progressivo ou death metal, pois ainda que elas o odiassem, eu sei que fiz minha parte em passar essa música adiante de alguma forma. Particularmente, considero um dos melhores que já ouvi na vida dentro dos dois gêneros. Costumo dizer que não estamos diante apenas de um disco que é sublime musicalmente, mas que também possui letras descritivas, imaginativas, sombrias e deprimentes que aumentam as emoções invocadas por cada uma das faixas.
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