Resenha
The Bedlam In Goliath
Álbum de The Mars Volta
2007
CD/LP
The Bedlam In Goliath é o quarto da discografia, mas foi o primeiro disco da The Mars Volta que ouvi, lembro que baixei ele - e os três anteriores - da comunidade Sábado Som do nosso finado Orkut, mas antes de ouvir a música, uma coisa na banda já havia me impressionado, a beleza de suas capas. Mas também me veio uma pergunta, será que o conteúdo do disco é tão belo quanto essas artes? A resposta é sim, porém, se com os desenhos foram paixão à primeira vista, tive que ter um pouco mais de paciência com a música, já que ela inicialmente não me pegou de jeito. O rock progressivo aqui quase sempre é visceral, sem tempo pro ouvinte respirar, sendo, justamente essas pancadas uma seguida da outra por quase 80 minutos, o que pode intimidar ouvidos menos doutrinados pelo gênero - ou até mesmo alguns já acostumados com sons progressivos diversos. Agora imagine as bandas que vocês conhecem e que possuem os compassos mais irregulares, então, se a The Mars Volta não está nesse meio, escute esse disco e acrescente mais um nome obrigatoriamente na sua lista. Todos os músicos - que inclui de forma surpreendente, John Frusciante do Red Hot Chilli Peppers – desempenham suas funções de forma incrível e quase sempre coesa do primeiro ao último segundo do álbum. The Bedlam In Goliath se trata de um álbum conceitual, onde o fio condutor tem algo a ver com um tabuleiro Ouija assombrado e uma força demoníaca exigindo ser reencarnado. “Aberinkula” já começa mostrando para o ouvinte, por meio de uma explosão inesperada de sons, o que vai ser encontrada durante o resto do disco, ou seja, músicas frenéticas e em alta voltagem. Linhas de baixo e bateria marcantes, guitarras às vezes agressivas e às vezes até mesmo de influência funk. Destaque também para o ataque de saxofone, que, quando acionado na parte final, entrega mais algumas estranhezas brilhantes que poucas são as bandas que conseguem fazer. É como se eles tivessem ideias para várias músicas, mas escolhem colocá-las em apenas uma, porém, de uma forma tão correta que tudo acaba fazendo sentido. “Metatron”, somando essa e a faixa anterior são quase 14 minutos e elas se combinam bastante entre si, me dando a entender que inicialmente chegaram a ser uma peça mais longa, mas que foi dividida em duas. Mantem toda a acidez instrumental – isso quando não soa ainda mais intensa. A guitarra aqui está mais insana e a música possui uma mudança constante de ritmos. “Ilyena” direciona a banda para uma linha mais funkeada, mas sempre dentro de uma sonoridade forte e cheia de nuances. A seção rítmica - principalmente a bateria - é simplesmente de tirar o fôlego. Há algo que eu não mencionei ainda e acho que aqui seria impossível de deixar passar, os vocais, é realmente impressionante como são construídos de uma maneira incrivelmente única - aqui em especial, há alguns falsetes que soam muito apropriado. Uma espécie de final falso ocorre por volta dos 4:10, mas a peça apenas muda de ritmo, seguindo assim até o final. “Wax Simulacra” é uma das duas faixas com menos de 3 minutos. A bateria é sensacional do começo ao fim e certamente é o grande atrativo na peça, mas toda a sua força e brutalidade só é atingida graças as interações alucinantes de todos os instrumentos – o saxofone nos últimos segundos é a cereja do bolo. “Goliath”, em um disco cheio de músicas incríveis, ainda há espaço para aquelas que se destacam. O trabalho de guitarra – base e solo - é brilhante. Conforme ela vai se desenvolvendo, vai ficando mais robusta e melhor. As seções rítmicas mais uma vez são sensacionais. É possível perceber em sua estrutura um aceno ao King Crimson, mas feito com bastante frescor e personalidade. “Tourniquet Man” é a outra música com menos de 3 minutos de duração. É aquele tipo de música suave, que parece existir apenas para dar um descanso para o ouvinte, que estava até o momento, sendo atacado por instrumentações fortes, intrincadas e aventureiras uma após a outra. Não vejo outro propósito para um som desse tipo no meio desse álbum. “Cavalettas” tem como único problema, o seu tamanho, pois apesar de possuir momentos excelentes, algumas vezes estão distantes um do outro, sendo separado justamente por partes menos inspiradas e coerentes – algo incomum no disco. Talvez, se fosse menos experimental, funcionasse melhor. “Agadez”, inicialmente não empolga muito, mas quando ela se desenvolve se transforma é uma peça maravilhoso. Inicialmente, segue uma linha blues, porém, não tradicional, mas um tipo de blues que uma banda como a The Mars Volta faria, ou seja, bem peculiar. Após o segundo refrão, ela muda de direção, entrando em uma musicalidade cheia de nuances e energia que a deixam muito mais poderosa do que a “simplicidade” da primeira metade. “Askepios”, se você já chegou até aqui, não vai estranhar um começo “fora do ritmo”, afinal, as faixas anteriores já foram mais do que o suficiente para entender como a música do álbum funciona. Mais da primeira metade da música é muito experimental, enquanto o restante, é mais acessível - dentro da medida, afinal, falamos de uma banda difícil. Inicialmente, a peça entra em uma levada funk rock, linhas fortes de baixo, bateria criativa e guitarras gritantes principalmente na parte do solo. Enquanto os vocais, mais uma vez estão excelentes. “Ouroborous” começa por meio de um peso quase metálico, mas que também contém alguns acenos para a música latina e um pouco de funk – realmente eles sabem misturar muita coisa sem se perder. Há mais alguns solos eletrizantes e uma seção rítmica - principalmente bateria – fervorosa. “Soothsayer”, o fato de ser uma música estranha não acho que possa ser algo relevante a essa altura do campeonato, de qualquer forma, ela parece ter uma estranheza maior que as demais peças do disco. Além dos 9 integrantes fixos, aqui a peça ainda conta com mais 7 convidados que trazem para a música, entre outros, violoncelo, viola e dois violinos. A melodia de cordas do início remete ao Oriente Médio, porém, isso é feito em alguns tons muito complexos. O trabalho de cordas é bem evidente por toda a música. O solo dissonante de guitarra em seu núcleo é um dos melhores momentos da peça, embora, sei que nem todo mundo goste desse tipo de solo. Considero sem dúvida a música do disco mais difícil de ser assimilada. “Conjugal Burns” é a faixa que encerra o álbum e com certeza é um dos seus melhores momentos. Começa por meio de alguns vocais expressivos sobre uma base instrumentais bem “baixo astral”, mas não demora para ser invadida por toda uma selvageria instrumental de tirar o fôlego. Novamente, a bateria é sensacional e mostra o quanto é um dos instrumentos mais importantes dentro do DNA da banda. Linhas de baixo pomposas e guitarras bastante furiosas também dão o tom de uma peça que fecha o disco de forma incrível. Se você se importa com as letras de todo disco que escuta, talvez ache essa aqui um pouco vulgar, mas tirando isso, nada está fora do lugar. The Bedlam In Goliath não é feito para ouvintes de rock progressivo que quer ter em mãos apenas uma música mais pura e melódica em relação aos seus ritmos, ou para aqueles que procuram abraçar apenas o lado mais sinfônico do rock progressivo. A banda entrega um disco com bastante peso e energia dentro de uma coleção de peças quase sempre explosivas em uma área progressiva basicamente nova e que consegue ultrapassar os limites do heavy prog moderno.
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