Resenha
Birds: Passage to the Forest of Mysterious
Álbum de Karfagen
2023
CD/LP
A cada ano que passa, eu tenho duas certezas em relação ao rock progressivo, a primeira é que uma grande quantidade de excelentes discos serão lançados e a outra é que Antony Kalugin vai contribui pra isso, inclusive, 2023 está sendo um dos seus anos mais prolíficos do incansável multi-instrumentista ucraniano. No início do ano, Kalugin, lançou um álbum de inéditas com a Sunchild, Exotic Creatures and a Stolen Dream, e no final de março, foi a vez da Karfagen aparecer com mais um disco, Passage to the Forest of Mysterious. Além disso, o músico ainda trabalhou em mais dois relançamentos, Dragon Island, uma versão instrumental 'Directors Cut' do álbum Echoes from within Dragon Island, lançado em 2019, e Birds, uma versão instrumental "Director's Cut" do álbum, Birds of Passage, lançado em 2020. Passage to the Forest of Mysterious entrega algumas das características bastante conhecidas da banda, como linhas sinfônicas bucólicas que ao mesmo tempo que remete o ouvinte ao rock progressivo 70’s, também produz peças com um frescor maravilhoso, além de belíssimas e de melodias adequadas que, apesar de progressivas, não são do tipo “músicas para músicos”, mas sim, muito acessíveis e com capacidade de agradar todos os ouvidos. A faixas centrais do disco são os dois épicos de 14 e 19 minutos, sendo esses épicos cercados por músicas mais curtas que variam entre 4:21 e 1:38. Embora não seja necessariamente um disco inovador, dentro de sua zona de conforto, Kalugin consegue manter a banda como uma das grandes forças do rock progressivo sinfônico contemporâneo. Sem querer entrar no mérito de quem está errado ou certo nessa guerra, mas mesmo Kalugin sendo um cidadão ucraniano, é impressionante o quanto ele consegue focar em sua música a ponto de entregar um material tão substancial, mesmo em tempos sombrios para o seu país, tornando Passage to the Forest of Mysterious não apenas mais um lançamento, mas sim, uma conquista. “Kingfisher and Dragonflies Part 4”, como o nome sugere, é a quarta parte da música que começou em 2007 no disco, The Space Between Us, seguida pela segunda e terceira parte que estão nos álbuns, Solitary Sandpiper Journey de 2010 e Land of Green and Gold de 2022. Possui um clima pastoral, com violões bem-soante e algumas vocalizações. Este arranjo poderia ser tirado de algum disco 70’s do Genesis - A Trick of the Tail talvez -, principalmente pela maneira como violão e teclas trabalham de forma bela e muito harmônica. Um começo de álbum excelente e que serve como espécie de amostra para o que está por vir. “Mysterious Forest Part 1 - World in a Grain of Sand”, com 14 minutos, é um dos dois épicos do disco. Tem um início bastante atmosférico, com teclas e violão antecedendo os vocais brandos, então que a peça se intensifica em uma sonoridade sinfônica que me lembrou o The Flower Kings, mas com direito a até um saxofone que permeia a peça brilhantemente. O breve solo de sintetizador é bastante característico da banda, assim como o solo de guitarra que o sucede. A forma polivalente, caprichosa e profunda que Antony lidera o seu exército de músicos sempre me impressiona. Até mesmo quando a banda atinge sons que podem ser considerados mais experimentais, ela consegue se manter agradável em qualquer tipo de radar. “Mysterious Forest Part 1” é um rock progressivo sinfônico com altas doses de requinte e sofisticação, exatamente como Kalugin adora fazer. “Mysterious Forest Part 2 - The Ominous Ride” é uma peça instrumental que a banda entrega uma mescla bastante desenvolvida. Pratos e algumas notas de piano iniciam a música que logo em seguida ganha um ritmo mais rápido e clima enérgico. Teclados e guitarras irão se alternar como instrumento principal – exceto por um curto período que começa por volta dos 1:35 em que bateria e percussão tomam a frente. No geral, é uma música dinâmica e agradável. “To Those Who Dwell in Realms of Day”, é muito suave e entra em contraposição em relação à faixa anterior. A genialidade de arranjador de Kalugin não é novidade pra ninguém, mas quando o vejo cantar de uma forma tão tocante e se contrabalançando perfeitamente com a melodia da música, percebo que ele está evoluindo até na condição de intérprete. “Birds of Passage and the Enchanted Forest”, com os seus 19 minutos, é a peça mais longa e também a obra máxima do disco. Há um pouco de muita coisa, neo-progressivo, folk, algumas linhas jazzísticas e até mesmo acenos ao metal progressivo, orquestrações ora ferozes e ora mais serenas, excelente trabalho rítmico e guitarras sempre muito bem encaixadas que em alguns conjunturas lembram The Flower Kings – Max Velychko nunca escondeu ser um grande admirador de Roine Stoilt -, além de uma alta performance de teclas por toda a parte. Os vocais de Kalugin também estão ótimos. Tudo nesse épico acontece dentro de uma incrível noção romântica de domínio harmonioso e natureza pacífica, além de temas preponderantes intercalados com momentos suaves, fabulosos e de universo de arranjos variados intrinsecamente de um espírito progressivo sinfônico. “Through the Whispers of the Wind”, com pouco mais de um minuto e meio, é a peça mais curta do disco. Depois de um épico tão poderoso, a banda entrega uma música que exala delicadeza e brandura. O violão e a cama orquestral de teclado ao fundo, deixam bem acentuado o clima pastoral que é característico da banda. “Mysterious Forest Part 3 - World in a Grain of Sand Reprise”, como o nome sugere, apesar de ser a parte 3, há também uma reprise, nesse caso, a temática lírica é a mesma da primeira parte. Violão e guitarra excelentes, saxofone adequado e sintetizadores melódicos guiam a música brilhantemente para o final do disco, encerrando mais um capítulo resplandecente do maravilhoso e romântico mundo de contos de fadas de Antony Kalugin. O que me faz gostar tanto do Antony Kalugin, não é apenas o quanto ele é prolífico, mas o quão ele consegue produzir material de qualidade em um curto espaço de tempo, sempre soltando discos novos seja solo ou em algum dos seus projetos – que pra mim já se consolidaram como bandas oficiais. Como sempre, além de arranjos fúlgidos, Kalugin tem bastante cuidado com a produção de seus trabalhos, e aqui não é diferente. Novamente a Karfagen consegue ser de forma convincente um atrativo para qualquer entusiasta de rock progressivo sinfônico.
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