Resenha
Hymns for Hungry Spirits, Vol. II
Álbum de Great Wide Nothing
2023
CD/LP
Acho que a minha preferência pelo rock progressivo está bem destacada no gráfico de resenhas na minha página aqui do site. Mas tudo é muito amplo dentro do gênero e estou sempre em uma fase diferente em relação ao que mais escuto, sendo que, ultimamente, a minha preferência está inclinada às bandas modernas de rock progressivo, mas que não deixam de entregar um som que se mistura com o progressivo clássico e até mesmo com outros gêneros do rock, como por exemplo, o alternativo, sendo exatamente o que corre com Hymns for Hungry Spirits, Vol. II, terceiro disco dos estadunidenses da banda Great Wide Nothing. Inclusive e acredite se quiser – ou tire as suas próprias conclusões ouvindo o álbum -, mas há acenos até ao punk rock. Um álbum em que há muito equilibrado e feito com bastante inteligência, Hymns for Hungry Spirits, Vol. II, é de uma qualidade homogênea nivelada por alto. “Blind Eye To A Burning House” começa por meio de alguns efeitos atmosféricos, mas que logo são substituídos por uma linha instrumental que – tirando o uso de piano – é possível perceber algumas influências entre o Rush dos anos 80 e o rock alternativo. Possui uma aura muito agradável. Além de uma excelente performance dos músicos, vale destacar a produção do disco que é muito boa. Uma peça que funciona muito bem do começo ao fim, entregando vocais adequados e uma banda que instrumentalmente mostra-se muito desenvolta. Como eu não canso de dizer aqui que adoro um bom refrão, aqui ele é daqueles que viciam e de repente estamos cantando ele sem parar. Eles não poderiam ter escolhido uma maneira melhor de começar o disco. “The Portal And The Precipice”, uma bateria que parece está sendo tocada no quarto ao lado começa a música, então todos os instrumentos entram e entregam uma sensação inevitável de Deep Purple, principalmente pela maneira com que o órgão é arquitetado durante a peça - que inclui um solo incendiário. Essa é daquelas músicas, que conseguem entregar ao mesmo tempo, uma ardência de rock progressivo clássico e moderno. “Viper”, vocês que ainda compram ou compravam CDs, lembram do dizer, “Parental Advisory Explicit Content” que continham em alguns materiais quando havia no geral um excesso de palavrões ou referências inapropriadas? Então, se todo o disco tivesse a mesma linguagem que essa música, provavelmente haveria esse aviso nele. Traumas e abusos na juventude, resiliência aplicada à situação em que viveu e uma raiva pelo que lhe aconteceu que embora não o domine, sempre vai existir – essa eu tive que ir entender sobre o que se tratava, depois de ver o aviso de que era uma letra que destoava das demais. Musicalmente, começa com um piano, mas que aos poucos vai crescendo em uma sonoridade tendendo primeiramente ao rock de arena, mas depois passeando por linhas sinfônicas. Seus vocais variam entre seções gritadas e raivosas – me lembrando um pouco Roger Waters - e outras mais amenas com vocais melódicos que se justapõem muito bem ao tema. Esses contrastes – tanto vocais quanto instrumentais - são brilhantes e fazem desta peça um dos destaques do disco. “Inheritor”, acho que faltam mais músicas sobre a pandemia nesse tom otimista, que celebre a vida, afinal, isso não vai fazer ninguém parecer que não se importa com os milhões de mortos, muito pelo contrário, eles querem apenas mostrar que, apesar de tudo, conseguiram sobreviver a essa fase terrível do mundo. A banda não nega que gosta de AOR e aqui é onde eles estão mais evidentes e misturado com uma sonoridade 80’s, porém, eles nunca deixam de soar progressivos. Não sei se o grupo chegou a lançar alguma das músicas como single, mas eu a vejo mesmo assim como o single do disco. Uma peça memorável e que consegue até melhorar o humor de quem a escuta. “To Find The Light, Part Two” é a faixa que encerra o disco, um épico com quase 20 minutos. Começa por meio de algumas notas de piano antes de toda a banda entrar em ação, porém, o piano permanece sendo o instrumento de liderança por alguns segundos. A peça continua a evoluir, entregando primeiramente uma linha melódica e outra mais pesada, fazendo a banda soar pela primeira e única vez no disco como uma banda de metal progressivo. Uma guitarra cheia de swingado leva a música para uma outra direção, até que os vocais aparecem pela primeira vez. A faixa permanece em uma constante evolução, entrando de uma maneira crescente, cada vez mais em zonas progressivas. Pouco antes da metade, a peça cai em um interlúdio e ganha ares dramáticos, além de completamente diferente do que havia sido feito nos pouco mais de 9 minutos anteriores. Um solo de sintetizador ajuda com toda a pungência encontrada no tema. Consigo sentir um pouco de Pink Floyd nessa parte e, mais a frente – depois dos 12:30 -, algo como se o Rush encontrasse a vibração floydiana. Em toda essa crescente, realmente as teclas brilham e entregam muita magia ao assumir a liderança durante todo o processo, em que o ápice, se encontra em um solo efervescente de órgão. Enquanto a peça se prepara para os vocais regressarem, a band parece entrar em um “modo Yes”. Quando enfim os vocais reaparecem, a faixa volta para uma sonoridade menos ambiciosa, mas ainda assim, indiscutivelmente muito progressiva. Caminhando para um final sinfônico, triunfante e poderoso, a peça praticamente silencia de forma abrupta, deixando apenas alguns teclados ambientais que assumem o controle e encerra o disco. Antes de qualquer consideração final, já deixo a afirmação que Hymns for Hungry Spirits, Vol. II vai certamente estar na minha lista dos melhores discos do universo progressivo de 2023. Um trabalho que consegue entregar de forma impressionante, músicas que se conectam brilhantemente com seus temas líricos, como, perda, desgosto, isolamento, esperança e redenção. Sempre ofertando uma paisagem sonora rica e energia musical poderosa, Hymns for Hungry Spirits, Vol. II é um disco de rock progressivo fascinante do começo ao fim.
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