quinta-feira, 25 de maio de 2023

Sérgio Godinho – Lupa (2000)

 

Lupa sucede a Domingo no Mundo como álbum de estúdio de Sérgio Godinho e é apenas mais um disco na carreira do autor. O que no caso dele quer sempre dizer muito.

Há umas quantas canções de Lupa que se mantiveram no repertório ao vivo de Godinho e só isso faz este disco ser merecedor de umas quantas audições. Arranca o álbum com “Bíblias de Um Deus Ateu”, numa suite de cordas e com as “pipocas” tradicionais do vinil quase a anunciar uma faixa de Dzhian & Kamien ou algo assim a atirar para o acid jazz. Mas rapidamente a voz de Sérgio Godinho marca o tom e encarrila o tema. Em “Bem Vindo Sr. Presidente” podemos ouvir Godinho com uns toques de autotune, naquela que é provavelmente a pior invenção de produção em toda a carreira de Sérgio Godinho. Salva-se a letra, como sempre, para suportar a audição da faixa que apresenta de certa forma também a banda que vai acompanhar o autor a partir dos anos 2000.

Mas não desesperemos que “Dancemos no Mundo” vem logo a seguir. Um dos hinos de Godinho de inícios de 2000 mostra que, além das excelentes letras do costume, a música pode acompanhar perfeitamente o ambiente. Quando escutamos várias vezes de seguida não conseguimos deixar de pensar naquele tema famoso de Toy Story, que, se formos a pensar bem, é a melhor canção da carreira de Miguel Ângelo. É uma blasfémia pensar nisto enquanto se ouve um disco de Godinho mas o abalo de ouvir este músico com autotune é tanto que se torna difícil focar de novo a atenção em Lupa . O que nos vale é que melhora francamente para a frente, quanto mais não seja por não ter autotune nas outras faixas.

Segue-se “Maçã com Bicho (Acho eu da Praxe)”, divertida crítica à praxe universitária; logo depois temos “Na Prisão, onde Godinho volta a encarrilar nas canções sensíveis. O disco a partir desse momento só melhora, com “Estou com os Azuis”, que são uns “lusitanos blues“, e “Bom Prazer”. Até ao fim do disco passamos por “Visita Guiada”, “É nosso o S. João” e “A última Sessão”, a primeira e a última destas dignas de ouvir com atenção. “A Última Sessão” é, a par de “Dancemos no Mundo”, a mais forte canção deste Lupa.

A diferença de estilos e ecleticismo de Sérgio Godinho não é novidade nos seus trabalhos e os toques de guitarras com distorção estão perfeitamente enquadrados na época, algo que só vai melhorando à medida que prossegue a colaboração com os Assessores. É aliás brilhante a reintrepretação de canções anteriores com guitarras distorcidas. Por agora soa algo estranho e desconexo, como único fio condutor apenas a voz e letras brilhantes de Godinho. Não quer dizer com isto que soem mal as canções, de todo. Quer é dizer que Lupa não é o mais estilisticamente consistente ou brilhante dos álbuns de Sérgio Godinho, ainda assim tendo espaço para os seus rasgos de génio. É um disco que se ouve bem de início ao fim mas nunca um dos primeiros a escutar quando mergulhamos na sua discografia.



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