Última integrante do The xx a se aventurar em carreira solo, Romy Madley Croft convida o ouvinte a se perder pelas pistas em Mid Air (2023, Young). Com produção assinada pela própria artista em parceria com Fred Again e coprodução de nomes como Stuart Price, Brian Eno e o companheiro de banda Jamie XX, o registro marcado pela fluidez das batidas diz a que veio logo na introdutória Loveher, música que cresce aos poucos, destaca o aspecto dançante do trabalho, porém, preserva o lirismo confessional da cantora. “Dance comigo, ombro a ombro / Nunca no mundo dois outros estiveram mais próximos do que nós“, canta enquanto uma base pulsante prepara o terreno para o que será apresentado no decorrer do material.
Em geral, são canções que se revelam ao público em pequenas doses, indicando uma abordagem talvez formulaica, efeito das pequenas repetições que marcam os trabalhos mais recentes de Fred Again, como Actual Life 3 (January 1 – September 9 2022) (2022), mas que sustentam na voz e nos sentimentos da artista inglesa o principal componente criativo da obra. “Você não precisa ser tão forte / Você carrega tanto sozinho / Se precisar de alguém em quem se apoiar“, canta na acolhedora Strong, uma delicada reflexão sobre a morte e a necessidade de seguir em frente que destaca a força criativa e sensibilidade de Romy.
É como se a cantora seguisse exatamente de onde o The xx parou no último trabalho de estúdio, I See You (2017), alternando entre momentos de maior melancolia e doce libertação sentimental. Exemplo disso fica bastante evidente na combinação entre a própria faixa-título do disco e Enjoy Your Life. Partindo de trechos de La Vita, do cantor e compositor norte-americano Beverly Glenn-Copeland, a faixa destaca a fluidez das batidas, melodias e vozes, como um acumulo natural de tudo aquilo que Romy busca desenvolver ao longo do registro. Composições que buscam dar vazão o que há muito parecia represado dentro da artista.
Embora movido por um precioso senso de libertação, Mid Air em nenhum momento soa como uma obra dotada de um escapismo vazio. Parte desse resultado vem do esforço da artista em garantir ao público um registro equilibrado, transportando para dentro do trabalho uma seleção de faixas que destacam o lirismo angustiado ou mesmo as pequenas inseguranças da cantora. É o caso da já conhecida The Sea, canção que traz de volta as guitarras atmosféricas do The xx e sustenta nos versos as incertezas de um amor. “Quando ela me disse que estava indo embora / Deixei meu coração na praia“, confessa em tom melancólico.
Ainda assim, são as canções que arrastam o ouvinte para as pistas que realmente tornam a experiência de ouvir o trabalho atrativa. Em Weightless, por exemplo, enquanto os versos refletem o lado romântico de Romy (“E quando ela olha para mim, eu escondo o que sinto / Mas acho que ela descobriu“), batidas e sintetizadores ganham forma em uma medida própria de tempo, destacando a riqueza de detalhes do material. Já outras, como Did I, parecem transportar o registro para o início dos anos 2000, soando como uma música perdida da eurodance, conceito que volta a se repetir em outros momentos ao longo da obra.
Talvez difícil de ser imaginado quando voltamos os ouvidos para os primeiros trabalhos de estúdio do The xx, onde imperava o reducionismo dos elementos e atmosfera soturna dos arranjos, Mid Air não apenas transporta o som de Romy para um novo território criativo, como destaca a versatilidade da cantora em estúdio. Do momento em que tem início, na já citada Loveher, passando por músicas como Strong, Enjoy Your Life e demais composições que abastecem o disco, poucas vezes antes a artista se mostrou tão liberta emocionalmente e capaz de dialogar com uma parcela ainda maior de ouvintes quanto no presente álbum.
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