terça-feira, 24 de outubro de 2023

Marcelo Falcão – Viver (Mais Leve Que o Ar) (2019)

 

Vocalista de O Rappa segue agora a solo, pelo mesmo caminho que levou a sua antiga banda ao sucesso.

O Rappa foi um dos projectos mais marcantes da música brasileira das últimas décadas, sendo a sua mistura de hip-hop, reggae e rock uma versão ilustrativa do Brasil urbano. Entre 1992 e 2017, a banda editou seis discos de originais e mais uma catrefada de coisas ao vivo, unplugged, etc, como é muito frequente no país-irmão. A despedida dos álbuns deu-se com Nunca tem Fim, de 2013, embora o nosso destaque vá para o fantástico trabalho anterior, Sete Vezes, de 2008. Em 2017, o conjunto – que chegou a tocar em Portugal – anunciou nas redes sociais uma pausa, por tempo indeterminado. Pausa essa que dura até hoje.

Marcelo Falcão, o carismático vocalista, não perdeu tempo. Mergulhou fundo nos seus arquivos de muitas dezenas de músicas, ideias e excertos que foi coleccionando ao longo dos anos, para dar gás à sua carreira a solo. O resultado é Viver (Mais Leve Que o Ar), editado em 2019, e que tem servido de base a uma digressão bem sucedida pelo Brasil.

A primeia coisa que sentimos ao ouvir este novo trabalho é alívio: está ali o som de O Rappa, que nos habituámos a ouvir e a adorar. Ao longo de 13 temas e 66 minutos, estamos imediatamente de volta ao Rio, ao calor tropical e ao imaginário daquela selva urbana. Havendo essa indiscutível continuidade, há um certo predomínio do reggae enquanto fio condutor, em detrimento do rock.

E se este é um disco feito de sol e mar, com os atractivos irresistíveis que isso acarreta, acaba por se sentir uma certa uniformidade eventualmente excessiva entre os temas, talvez por tudo ser passado, de uma forma ou de outra, pelo “filtro reggae”, que não é exactamente o estilo mais dado a grandes versatilidades.

No Brasil, uma crítica apontava um factor interessante: se o Rappa sempre se distinguiu pelas suas letras de cariz social, de luta contra as desigualdades, este disco a solo de Marcelo Falcão tem na mesma uma mensagem, sem dúvida, mas é agora mais pessoal, mais individual, de incitamento à descoberta do amor e do melhoramento pessoal. Nada contra, mas não podemos deixar de questionar se o actual momento do Brasil, em pleno consulado proto-fascista de Bolsonaro, não deveria ter incentivado Falcão a usar a sua arte para o combate que é também papel da música, nomeadamente de intervenção.

Seja como for, Viver (Mais Leve Que o Ar) é um óptimo disco de Verão, que nos dá vontade de calçar os chinelos e sentir a areia nos pés. Não sabemos se O Rappa voltará – Marcelo Falcão, em entrevistas, não o afasta – mas se isso não acontecer teremos aqui um porto seguro no qual podemos ir matando as saudades.



Sem comentários:

Enviar um comentário

Destaque

DE Under Review Copy (CHATEAU ROYALE)

  CHATEAU ROYALE A ideia de formar um grupo teria sido já congeminada em 1989, ano em Luís Garcês e Adozinda Peguincha trabalhavam na Jukebo...