domingo, 17 de dezembro de 2023

FKA Twigs – Magdalene (2019)


 

Desde o primeiro instante FKA Twigs é uma espécie estranha, com um pé bem assente na electrónica de vanguarda e outro, em bicos dos pés, na pop.

“Magdalene” é o primeiro álbum em quatro anos, influenciado pela muito pública relação com Robert Pattinson, terminada em 2017.

Neste trabalho a britânica está em topo de forma, com músicas e letras com princípio, meio e fim. O disco abre com “Thousand Eyes”, onde a voz da cantora se sobrepõe num tema quase à capella. O fim das relações e os corações partidos serão uma constante nesta viagem onde por todo o disco Tahliah Barnett aborda temas pessoais, sempre de uma forma sensível e apontada directamente ao coração. “Would you make a wish on my love?”, pergunta em “Sad Day”, uma das canções onde mais ecoa Kate Bush.

Há uma colaboração, com o rapperFuture, em “Holy Terrain”, canção que tem créditos de produção para Skrillex. Também aparecem como produtores Nicolas Jaar, Benny Blanco, Oneohtrix Point Never, Jack Antonoff e Koreless, que muito bem pintam a mensagem de Fka Twigs e entendem esta sonoridade entre o electrónico e o extraterrestre.

Se pelo nome não é óbvio, este mais recente trabalho tem inspiração na figura bíblica de Maria Madalena, personagem complexa e alvo de centenas de anos de ambiguidade, que Fka Twigs interpreta como movida pelo desejo de amor. É um álbum sobre reconstrução de identidade, de voltar a ser um, sem outra metade. Além da separação, Tahliah Barnett passou por uma operação emocionalmente devastadora para remover tumores benignos que levou a artista a escrever, no texto de lançamento do disco, “nunca pensei que o desgosto pudesse ser tão abrangente”. Apesar disso, cabe muito no coração partido de Fka Twigs. Em “Mirrored Hart” canta “but I’m never gonna give up/ Though I’m probably gonna think about you all the time”.

O álbum de apenas nove canções termina com o single “Cellophane”, uma balada comovedora que Fka Twigs interpreta com mestria. Da forma como estão ordenadas as canções, até conseguimos sentir as emoções de Tahliah Barnett durante esta viagem além dos tablóides e de uma relação sempre escrutinada pelo olhar público.

De uma forma geral e bem equilibrada, a voz doce de Fka Twigs também sabe ser áspera, com sons agressivos e suaves intercalados de forma a nunca nos deixarmos embalar completamente por “Magdalene”. A artista sabe atacar as canções alternadamente com delicadeza e violência, tirando-nos do torpor que ela própria cria, trazendo-nos de volta à vida esporadicamente para espicaçar os sentidos. Tal como ela, estamos vivos e reconstruídos.



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