Formado em 1966, o Ten Years After foi um grupo de bastante sucesso e muito solicitado entre o fim dos anos 60 e início dos anos 70. Frequentou as esteiras da febre de blues na Inglaterra, mas conseguiu logo progredir e se mostrar como um grupo multifacetado. Com a guitarra nervosa de Alvin Lee e os teclados elegantes de Chick Churchill, unidos com a cozinha gordurosa de Ric Lee e Leo Lyons, o Ten Years After manteve firme um séquito de fãs ao longo das décadas, em um trajetória cheia de boas energias musicais. Esta série, em duas partes, desconsiderará alguns discos ao vivo da banda, especialmente aqueles relacionados com períodos em que estiveram pouco ativos.
Ten Years After (1967)
O grupo, em sua estreia, demonstra do que lhe valeram tantos quilômetros rodados antes de encarar a aventura de se registrar em álbum. Os primeiros acordes do disco já demonstram muita confiança e uma saudável auto estima. Além, é claro, de predicados musicais que os colocariam par e passo com os bambas do blues-rock britânico. 10 anos depois da ascensão musical de Elvis Presley, o Ten Years After se alinha ao som de Paul Butterfield Blues Band, John Mayall and Bluesbreakers, Graham Bond Organisation e Electric Flag, com uma dinamítica combinação de blues, rockabilly, country e swing jazz. A releitura de “I Can’t Keep from Cryin’ Sometimes”, de Al Kooper, é o maior destaque do disco, e as performances velozes da guitarra de Alvin Lee e dos teclados de Chick Churchill já dão as credenciais do que se esperar da obra do conjunto. Esta canção e o blues arrastado “Help Me” se transformariam em ícones do repertório da banda ao longo dos anos.
Undead (1968)
Para atender pressões do selo Deram, que exigia um novo lançamento antes da primeira tour do grupo pelos EUA, o Ten Years After surge com Undead, um disco ao vivo. Nele, a habilidade de Alvin Lee é latente, contudo, o repertório não favorece a demonstração dessa habilidade por diferentes ângulos. Sendo assim, o que impressiona logo aos primeiros segundos do disco, pode tornar-se enfadonho pouco tempo depois, ou soa como malabarismo. O disco é uma coleção de canções agitadas, que se equilibram entre um swing jazz acelerado, com fortes influências de Jimmy Smith e outros batutas do organ jazz, ou em possantes canções rockabilly, que rezavam “amém” a cada sequência de 12 compassos do blues que era executada. Em outras palavras, o disco é bom, contudo muito previsível e monocromático. Undead leva crédito pois é nele que aparece a primeira versão de “I’m Going Home”, canção que tornaria o Ten Years After mundialmente conhecido, por conta da participação no filme oficial do festival de Woodstock, exibido em 1970.
Stonedhenge (1969)
Composto ainda em 1968 em meio a uma efervescente popularização da banda, o terceiro disco do grupo, e o segundo em estúdio, foi lançado no início de 1969. O Ten Years After resolve apostar numa espécie de rota de fuga para o som centrado exclusivamente na guitarra de Alvin Lee. O tecladista Chick Churchill lança-se a usar novos timbres de teclados, Ric Lee experimenta com percussões e o baixista Leo Lyons trata de abrir o leque em suas linhas de baixo, antes centradas no esquemão jump bass. Contudo, a sensação geral era de que o Ten Years After queria surfar numa onda que não era a sua. Talvez devido a correria da turnê ou por um excesso de pretensão, a banda não maturou bem as ideias para o disco, e ao se envolver com experimentações em colagens sonoras e arriscar em passagens individuais dos instrumentos, não consegue um resultado atraente ao ouvinte. E no caso, os melhores momentos do disco referem-se aos minutos em que a banda decide tocar na linha do que já havia feito anteriormente. “Hear me Calling” é uma poderosa canção, mas é interpretada de forma contida. Em 1972, nas mãos do grupo glam Slade, alcançaria uma performance explosiva condizente com sua força.
Ssssh (1969)
Paralelamente ao sucesso em Woodstock, o Ten Years After lança este fabuloso álbum, com sua icônica capa, uma energia e um peso que até então o grupo só presenteava quem os via ao vivo. O disco abre com a poderosa “Bad Scene”, um rock arrasador e com alternâncias blues. O disco é todo embebido em blues, mas assim como no Jeff Beck Group e no Led Zeppelin, o estilo não é exatamente reverenciado, e sim usado como base para um novo som, para a consolidação de um novo estilo. Ssssh tem muito de blues mas não é blues puramente, e sim um rock bravio, um ataque de pugilista nos ouvidos (o que era perfeito para o rock em 1969) e só fez alçar a banda ainda mais ao topo daquela nova cena de rock, da qual os Beatles e sua geração estavam entregando os bastões. A própria guitarra de Alvin Lee busca fugir das piruetas frequentemente usadas nos trabalhos anteriores, como que na ânsia de se mostrar capaz de algo a mais. Apesar de que em “Good Morning Little School” seu maravilhoso solo de guitarra é a mais pura síntese de seu estilo agitado de tocar, cujo resultado é amplificado pelo esplendoroso trabalho de contrabaixo de Leo Lyons. “If you Should Love Me” mostra o Ten Years After se arriscando bem em uma baladinha conduzida ao violão; “The Stomp” é safadeza pura e “I Woke Up this Morning” é um blues nervoso que arremata este ótimo disco.
Cricklewood Green (1970)
As três primeiras músicas deste álbum são assustadoramente boas. “Sugar Road” chega apresentando o mesmo embalo de Ssssh; “Working on the Road” rememora os melhores momentos do Cream de Wheels of Fire, e na mesma pegada, consagra o Ten Years After como uma banda “duas caras” – uma para estúdio, outra para os palcos; “50.000 Miles Beneath my Brain” tem aquele clima de psicodelia-era-de-aquário em uma deliciosa composição. Se ainda te sobrar fôlego, curta um leve refresco de country e blues fechando o lado A, ou com o swing jazz que abre o lado B (coisas que a banda já era craque desde outros carnavais), pois em seguida mais rock poderoso surge em “Love Like a Man”, o riff mais memorável do grupo em sua carreira. E como último destaque de Cricklewood Green a belíssima “Circles”, que lembra os momentos mais tranquilos do Pink Floyd em Atom Heart Mother.
Watt (1970)
Watt vem em uma contínua descarga de energia, mas soa automatizado em muitos momentos. Na época de seu lançamento, a banda estava a mil por hora, excursionando insanamente e sem tempo para se dedicar em um processo de composição mais apurado. O disco deveria se chamar “What?” e não “Watt”, com a banda questionando o ritmo frenético em que as coisas estavam acontecendo. As fórmulas de Ssssh e Cricklewood Green são postas novamente na mesa e, apesar da premissa de entreter público e cumprir contratos, tudo funciona bem no disco, apesar de não trazer nada em que o Ten Years After já não tinha se saído melhor em registros anteriores. “I’m Coming On” é pesada e pegajosa, com um dos melhores solos de guitarra de Alvin Lee. “I Said Yeah” é divertida e traz belos timbres de guitarra e vocoder; “The Band with No Nome” é uma cinematográfica vinheta instrumental e “She Lies in the Morning” tem interessantes variações de ritmo e bons solos individuais.
A Space in Time (1971)
Space in Time divide com pau-a-pau o posto de favorito dos fãs com Cricklewood Green. Tudo aqui soa extremamente bem acabado – composições, produção sonora, timbres, performances. Fruto de uma merecida pausa para o grupo, Space in Time tem em disco as melhores experiência do Ten Years After com violões e orquestrações. “One of these Days” é sim mais um blues para o grupo, mas que soa macio e reanimador como nunca dantes; “Here they Come” é uma pérola de acid folk; “I’d Love to Change the World” é uma maravilha eletro-acústica que se tornou o maior hit do grupo; “Over the Hill” é uma linda balada orquestral; e isso porque estamos falando apenas do lado A do disco. Cada música desse belo disco mereceria uma lauda.
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