quarta-feira, 28 de fevereiro de 2024

Los Hermanos – Ventura (2003)

 


“Quem se atreve a me dizer” que Ventura não é um enorme disco, o difícil terceiro da curta carreira de Camelo, Amarante, Medina e Barba? Ninguém se atreverá a tanto, seguramente. Ventura é um álbum a vários títulos exemplar, conseguindo mostrar uma vez mais os encantos rítmicos e melódicos dos nossos amigos brasileiros.

Gostamos de pensar que Ventura é um álbum de transição. Bebe algo do anterior (Bloco do Eu Sozinho) e encaminha-se para a extraordinária criação que foi 4, disco que muitos consideram ser o clímax criativo do quarteto do país irmão. No entanto, há também quem considere que esse “marco dourado” deverá ser atribuído ao disco de 2003, exatamente este que aqui nos traz. Independentemente dessas subjectividades classificativas, as quinze faixas de Ventura revelam um grupo coeso e fortalecido com as experiências dos trabalhos anteriores, prevalecendo a ideia de ter sido um álbum importante para a história da música indie-rock brasileira. Revela ainda que as duas cabeças motrizes da banda vão optando por sensibilidades poéticas algo distintas, mas que dialogam perfeitamente uma com a outra. Marcelo Camelo desenvolve no disco uma vertente mais romântica, enquanto Rodrigo Amarante prefere letras de contornos mais filosóficos e existencialistas. Não é despropositada a ideia de ver emoção do lado de Camelo e razão como coisa mais próxima de Amarante. Tudo somado, desde “Samba a Dois” até “De Onde Vem a Calma”, Ventura é um autêntico festival de boas e prazerosas composições.

São quinze, como já referimos e nelas encontramos muitas das marcas identificadoras dos Los Hermanos. No entanto, algumas das suas melhores composições poderão não entrar à primeira nos nossos ouvidos, coisa que revela não se tratar de um disco feito com o sentido de produzir hits a todo o custo, embora esteja repleto deles. Mais madura e com bastante maior experiência, a banda soube ir buscar o produtor certo para o álbum que queria fazer. Kassin começava a dar cartas na produção da moderna música brasileira, e para além desse encargo assumiu tocar a viola baixo que bem se nota em alguma faixas (as outras foram entregues a Rodrigo Amarante), isto se soubermos escutar Ventura com a devida atenção.

Outra característica marcante de Ventura é o facto de muito se ouvir o som dos metais. É rica a sua utilização e funde-se muito bem com os temas mais marcadamente sambistas (“Samba a Dois”), mas também em muitos outros que fogem a essa estética tão brasileira, refugiando-se mais na área do indie-rock bem característico da banda. Os temas “Além do Que Se Vê” ou “Conversa de Botas Batidas” são bons exemplos do que dizemos. Mas há outros temas de enorme riqueza melódica e rítmica. A saber: “Deixa o Verão”, “O Vencedor”, “Último Romance” e principalmente “Cara Estranho”, canção das mais impressivas de toda a história do grupo, e um regresso à onda mais punk que marcou o primeiro longa duração da banda.

Mas Ventura também se faz de belas pseudo-baladas. “A Outra” (não é bem uma balada, embora nos embale com uma enorme facilidade) e principalmente “De Onde Vem a Calma” (outro tema que é mais do que essa suposta classificação proposta) são canções superlativas. Esta última termina o disco fazendo a ponte perfeita com algumas das canções mais icónicas do disco seguinte, o triunfante e mágico e belo e tudo 4. Mas essa é já outra conversa da qual vos daremos conta depois.



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