terça-feira, 5 de março de 2024

The Brian Jonestown Massacre – The Brian Jonestown Massacre (2019)


 

O regresso ao rock lo-fi psicadélico que resulta sempre muito bem com Anton Newcombe.

Alguém disse imaginar a brutalidade de música por fazer que todos perdemos com a morte do Kurt Cobain só pode ser alguém que parece ignorar a brutalidade de música medíocre feita por McCartney pós-70s, e depois o mesmo com os Stones, Cornell, Metallica, Gallagher, Beck, Corgan e até o Beethoven (a nona sinfonia é uma bela merda). Olha, e os Sigur Rós. Por contraste tendo a apreciar quem consegue identificar a indisponibilidade de chegar perto do outrora, como o fez Mark Hollis, que se foi no outro dia, mas há décadas afastado da música pós obra-prima do Laughing Stock; ou o exagero da Barbara Loden, realizadora de um único – e misteriosamente genial – filme, Wanda; ou os Portishead, que nos dilaceraram com três álbuns em catorze anos, e já lá vão onze desde o último, não se sabe porquê.

Mas convenhamos música boa é rara e é claro que queremos que exista em quantidade. Os Radiohead, esses, amandam um melhor que o outro, editando em lume brando, sem pressas, no que resulta obras bem pensadas e produzidas ao nano-milímetro, e ainda bem para nós que a mamamos em deleite.
Dum outro lado encontra-se o maluco do Anton Newcombe e os seus The Brian Jonestown Massacre, que editaram há uns meses atrás o décimo-oitavo disco, dezanove anos depois do primeiro. Quem viu o lendário documentário Dig! (2004) não poderia esperar tamanha longevidade, tal o nível de conflito e de abuso de estupefacientes (ou então deveria esperar tamanha longevidade “por causa” do nível de conflito e de abuso de estupefacientes). “You broke my citar, motherfucker!”

A banda desfez-se e refez-se inúmeras vezes, orbitando sempre, claro, em torno de Newcombe, o mais das vezes em trajectórias violentas (os concertos têm três horas, mas hora e meia é dispendida em conflitos, entre Newcombe e a banda e entre Newcombe e público); a música é o mais das vezes excelente. Eu vi-os ao vivo em Roskilde praí em 2006 e não há como não ficar espantado com o contraste entre a aparente imaturidade de Anton Newcombe (bêbado, trocando insultos com toda a gente, caindo do palco) e a performance musical em si – poderosa, genuína, intensa – como se a sua existência para lá da música seja inevitavelmente tortuosa e patética.

É assim, há quem viaje com fins muito claros: ver a merda do Taj Mahal, bater uma punheta na Capela Sistina, tirar uma selfie horrorosa nas cataratas do Niagára, etc. E há quem viaje pela viagem. É assim a música de TBJM, para tripar com rock n roll, música lo-fi de atmosfera preenchida, elíptica, sem refrão, ainda assim de certa maneira humilde e incrivelmente catchy. Adoro a faixa “Cannot Be Saved”. Torna-se difícil a dada altura, admito, identificar a que disco determinada música pertence, e não é por acaso que escolheram como capa do novo disco o velho logo – singela opção que sugere com eficácia uma espécie de retorno aos sons habituais, após algum nível de experimentação electrónica dos álbuns anteriores.
“I cooked for fourteen people. I cooked two legs of lamb and produced a song all in one day”. Não é fácil cozinhar para catorze pessoas.


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