Surpreendendo toda a gente, os Unknown Mortal Orchestra anunciaram um segundo álbum para 2018. O sucessor de Sex & Food peca, no entanto, pela sua natureza semi-acidental

Quando, no final de Setembro, os Unknown Mortal Orchestra anunciaram um novo álbum com o lançamento de “Hanoi 6” muita gente há-de ter cuspido o café que estava a beber. Um single de quase dez minutos, de improviso, com solos de saxofone e um berimbau-de-boca a acompanhar? Uma revolução tão radical não acontece todos os anos.

O disco instrumental foi gravado nas mesmas sessões que Sex & Food em 2017 em Hanói, no Vietname, contando com a participação de Chris Nielson, pai de Ruban e Kody, no saxofone, fliscorne e teclados. Logo na primeira música, “Hanoi 1”, sentimos a diferença: a natureza caótica da música remete-nos logo para a faixa solta “SB-03” com a sua guitarra selvagem e bateria insistente. Mas quando finalmente começamos a entrar na música, esta acaba. Este constrangimento virá a definir o álbum inteiro.

“Hanoi 2” e “Hanoi 4” são maioritariamente grooves; a preocupação da primeira é criar uma paisagem de textura psicadélica. A guitarra de Ruban Nielson, apesar de ser o foco da música é quase ofuscada pelo persistente riff de teclado e baixo que a alicerçam. Ao fim de cinco minutos, a canção acaba sem ter ido a nenhum lugar em particular. A segunda é alicerçada por um riff pantanoso e fantasmagórico de guitarra e breves ornatos de teclado aqui e ali.

Já “Hanoi 3” e “Hanoi 5” são, essencialmente composições breves que enfatizam um único instrumento. No caso de “Hanoi 3” ouvimos um sáo trúc, um instrumento de sopro vietnamita, tocado por Minh Nguyen. É a música mais simples do disco e o grupo teve a inteligência de usar o processamento do instrumento de forma complementar em vez de o afogar em efeitos, como uma banda mais inexperiente faria. Em “Hanoi 5” uma introdução de guitarra e teclado dão rapidamente lugar a um solo de saxofone que acaba antes do ouvinte conseguir perceber o que está a ouvir.

Dizer que “Hanoi 6” é a melhor música do álbum não é tanto um eufemismo como uma maneira inexata de a descrever. Todo o disco gira à volta do seu vortex de cacofonia e experimentalismo. Tem um princípio, um meio e um fim. A sua progressão de acordes é a mais interessante e “pensada” de todo o álbum e, à medida que a música vai prosseguindo ouvimos um sorrateiro berimbau-de-boca e ligeiros suspiros de guitarra no horizonte longínquo. Quando o saxofone finalmente entra, não é da maneira ligeira com que foi introduzido na música anterior. Há um propósito, uma construção que não tínhamos ouvido antes. Esta progressão Coltranesca dita a dinâmica da composição que à volta dos sete minutos começa a entrar em erupção. O saxofone geme furiosamente a bateria explode numa torrente de címbalos e timbalões enquanto a guitarra aglutina as hostilidades com a sua repetição hipnótica.

“Hanoi 7”, que termina o disco, é pouco mais que uma Coda para a canção anterior. O berimbau tem um destaque maior, o reverb estendendo o seu drone interminavelmente. A bateria é arrítmica e a guitarra envereda por uma abordagem pontilhista, mal se fazendo ouvir ao longo da composição.

IC-01 Hanoi, não é um disco mau, mas é completamente esmagado pelas expectativas geradas por “Hanoi 6”. As músicas pecam por falta de desenvolvimento e esfregam-nos constantemente na cara o facto de serem pouco mais que sobras de estúdio. É frustrante porque, como a série SB nos indica, sabemos que os Unknown Mortal Orchestra são capazes de fazer mais e melhor. Ainda assim, é necessário mencionar a coragem do grupo ao lançarem um disco vincadamente não comercial e explorarem a sua veia mais livre. A partir daqui, só podem melhorar.