Os Oh Sees continuam a sua evolução e transformam-se numa autêntica banda de rock progressivo moderno. Smote Reverser é a conclusão lógica de 20 anos de carreira.

A progressão dos Thee Oh Sees é interessante mesmo quando vista à distância: Quando John Dwyer, estreou o projeto a solo este consistia apenas do próprio e uma guitarra acústica, como é documentado no primeiro disco 1 de 2003. Depois de 4 discos de folk mutante chegou a hora de tornar o projeto numa banda a sério e as primeiras sementes dos Oh Sees que conhecemos hoje foram plantadas em 2006 com The Cool Death of the Island Raiders. O garage rock começou a influenciar o grupo e The Master’s Bedroom Is Worth Spending a Night In, de 2008, viu-os abandonar as suas tendências folk finalmente.

Ao longo dos anos, a banda foi absorvendo influências do rock psicadélico, do punk e do krautrock e o seu som foi ficando cada vez mais pesado, como é documentado em discos mais recentes como Mutilator Defeated at Last e A Weird Exits, de 2015 e 2016 respetivamente. No ano passado, Orc mostrou ao mundo que John Dwyer e companhia tinham saído definitivamente do casulo e, com a abreviação do nome para apenas Oh Sees, começava então uma nova fase da banda, mais influenciada pelo krautrock, rock progressivo e até pelo metal. E assim chegamos a Smote Reverser que, apesar de poder ser perfeitamente apreciado sem o contexto dado acima, ganha com ele uma nova camada de significado.

A transformação sente-se imediatamente em “Sentient Oona”: sem a pirotecnia do costume, ouvimos uma guitarra subtil, jazzística até, a colorir o silêncio sobreposta pela voz sussurrada de Dwyer e os coros de Brigid Dawson. Mesmo nas partes mais pesadas da canção percebemos que o ênfase não está na agressão mas na atmosfera. A brincalhona “C” continua esta tendência com um riff orelhudo baseado numa única nota de teclado repetida ao longo da música. É de notar que os sintetizadores, que têm andado a ganhar uma importância crescente no som da banda, são muito mais indispensáveis neste álbum do que nos trabalhos anteriores do grupo.

E, de repente, a casa vai abaixo. A fúria de “Overthrown”, provavelmente a canção mais pesada em todo o extenso repertório da banda, é um buraco negro de distorção. É como se toda a contenção demonstrada nas músicas anteriores servisse apenas de pretexto para que os músicos pudessem soltar-se completamente nesta canção. Depois de um solo fraturado, a poeira assenta e sentimos a sinergia de uma banda que está claramente a viver os seus anos dourados. Mais tarde, “Abysmal Urn”, no geral mais contida que “Overthrown” tem, nos seus momentos mais frenéticos uma intensidade equiparável cuja diferença mais marcante seja talvez o seu solo mais “quadrado”.

Os últimos anos têm visto o grupo a aventurar-se e a acrescentar alguma experimentação ao seu som. O espírito de bandas como os Yes ou os Rush está bem vivo em “Last Peace” que contém um sample de violino nos seus versos, o seu drone insistente dando alguma coerência a uma música que viaja um pouco por todos os lados em solos e secções (aparentemente) improvisadas. Todas estas influências são corroboradas por “Anthemic Aggressor”. Ao longo dos anos fomos vendo o grupo a esticar as suas canções: a faixa-título de Warm Slime de 2010 é uma canção relativamente normal com particularidade de durar treze minutos, “Keys to the Castle”, do álbum Orc, contém apenas uma secção final que abusa da paciência do ouvinte com a sua incessante repetição.“Anthemic Aggressor”, não sendo a primeira música dos Oh Sees a passar dos dez minutos é a primeira que o justifica por inteiro.

Acabamos a viagem da forma mais apropriada. Os Oh Sees sempre tiveram jeito para fazer canções que começam de forma subtil crescendo em intensidade e acabando por explodir deixando o ouvinte transformado e exausto. “Beat Quest” não é diferente: os seus sintetizadores viscosos e a sua guitarra maníaca serpenteiam e transportam-nos do pântano para uma estranha pista de dança povoada por druidas, monstros grotescos e, lá no fundo sentado a um canto, John Dwyer a segurar um copo de vinho barato.