É criminosa a quase total ignorância que grassa em relação a Owen Ashworth e à musica que vem fazendo desde os tempos de Casiotone For The Painfully Alone. Entretanto, o californiano mudou o nome do seu projeto e é como Advance Base que se apresenta desde 2012. O seu novo disco é uma verdadeira pérola e vem repleto de histórias sobre cães, arrependimentos, mortes e outras terríveis dores humanas.
Chama-se Animal Companionship o mais recente disco do muito talentoso Owen Ashworth. Para os que não o conhecem, e serão muitos, demasiados até, seria interessante que passassem a conhecê-lo recuando aos tempos dos maravilhosos discos Answering Machine Music (2001), Pocket Symphonies for Lonesome Subway Cars (2001), Twinkle Echo (2003), Etiquette (2006) ou Vs. Children (2009), quando se apresentava através da fantástica designação de Casiotone For The Painfully Alone. No entanto, é como Advance Base que vem trilhando novos caminhos, embora a sua marca sonora identitária se mantenha basicamente a mesma. Ainda bem. É desse som sujo, gasto, que parece vir sem pressas do fundo de um escuro corredor, que tanto gostamos. Já não tínhamos notícias frescas de Owen Ashworth desde Nephew in the Wild (2015), isto se não tivermos em conta In Bloomington, registo ao vivo gravado em dezembro desse mesmo ano.
O som claustrofóbico que lhe é tão particular mantém-se igual. As melodias que parecem sonhos ou pesadelos (há que entender o que Ashworth canta para que percebamos em que categoria onírica as poderemos arrumar) permanecem lindas, tocantes, magistrais. A nostalgia e a melancolia a que nos foi habituando segue triunfante neste Animal Companionship, disco de pouco mais de meia hora de duração, composto por dez deliciosos momentos sonoros. “True Love Death Dream”, o tema que inicia do álbum, é o que poderemos chamar de um instant classic à maneira de Owen Ashworth. Está lá tudo o que gostamos nele, mas sobretudo a trágica beleza do que nos conta, o embalo que arrepia, o som dos anjos ligeiramente desalinhados, de cabeleira longa e desfraldadas roupas escuras. É melhor explicarmos: depois de um trágico acidente de viação, desfez-se o sonho da vida futura de um casal. O sobrevivente, algum tempo depois, usou o nome do amado morto para o dar a um cão que passou a ter. A história é simples, mas a canção é portentosa, sofrida e bela ao mesmo tempo. Dá o mote a todo o disco, e todo o disco é assim: uma esteira de perfeição sonora ao alcance de poucos.
Com Owen Ashworth, less is more. Utilizando os aparelhos eletrónicos de sempre, Ashworth elaborou mais um compêndio de amor, de perda e dor. Fê-lo em vários temas, como se fossem capítulos de uma história repleta de momentos de beleza arrepiante, coisa que, vindo de quem vem, não é de estranhar. Ouça-se “Dolores & Kimberly” e um pequeno sol nostálgico parece fazer nascer o dia dentro de nós. Pode vir a estar nebuloso, mas isso pouco importa. Haverá sempre beleza na cinza dos dias. O mesmo acontece com “Your Dog” e restantes canções de Animal Companionship. Basta este ou qualquer outro disco seu para que se perceba estarmos na presença de um génio que sabe perfeitamente que faz a música que quer para si e para poucos. É, portanto, um disco de culto de um artista de culto que parece não se preocupar muito com qualquer outra coisa para além da sua música feita através de sintetizadores e outras pequenas e semelhantes máquinas de som. No entanto, desses recursos minimalistas nasce sempre uma obra digna dos maiores elogios. Nós já nos escusamos a usá-los. De pouco ou nada servem. Nunca se ouvirá Advance Base nas rádios portuguesas, nunca se promoverá concertos de Owen Ashworth em Portugal, embora quiséssemos muito estar enganados.
Ouçam Animal Companionship e fechem os olhos. Que se abram apenas à pacificadora beleza dos seus sons, das suas histórias, das suas canções. Elas serão sempre o que não esperava ouvir. Elas serão sempre o que passará a querer ouvir.
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