Em ano bastante positivo para o rock, os IDLES ajudam a puxar o barco, com um contributo visceral e intenso.

Para dar um pouco de contexto a quem está a descobrir os IDLES neste momento – são uma banda de Bristol, cidade que também já deu ao mundo os históricos Massive Attack e Portishead, mas pouco têm a ver em termos sonoros com as mesmas. O punk é a verdadeira força motriz do grupo, já roçando nas fronteiras com o pós-punk e o hardcore, dada uma complexidade bem para lá de 3 acordes e siga a banda. Lançaram em 2017 o seu álbum de estreia, Brutalism, e causaram estrondo sobretudo no underground britânico, tendo usufruído de uma excelente oportunidade de se darem a conhecer ao abrirem para o concerto dos Foo Fighters em Londres.

Ei-los então em 2018, a defender a utilização da alegria como ato de resistência, resistência a todo o status quo actual, tal como fez nos idos finais dos anos setenta o movimento punk original. Os IDLES, através das palavras do vocalista Joe Talbot, disparam em várias direções, seja o Brexit e a incoerência da sociedade britânica nessa decisão, o machismo, o racismo, a frieza nas relações vividas nos dias de hoje, o uso assolapado de tecnologia. Fazem-no de uma forma aguerrida, gritando-nos aos ouvidos, com guitarras frenéticas e sempre a abrir. Hardcore puro e duro, fazendo-nos sentir bem a energia de estarmos não em casa, não no carro, não num escritório com fones nos ouvidos, mas numa sala de concertos, com o suor de Talbot a cair-nos em cima.

“Colossus”, tema de abertura, é um ópera em dois atos, o primeiro com Talbot num confessionário (“Forgive me father, I have sinned”) a partilhar a dificuldade de ter de gerir sombra do pai; o segundo explosivo, catártico, mostrando-se a ele próprio como partes Fred Astaire, partes lutadores de wrestling ou Evel Knievel. Partimos para “Never Fight a Man with a Perm”, sempre em ritmo vertiginoso, e para o que poderia ser o “Creep” de 2018 – “I’m Scum”, aceitando que se pense isso dele, mas pouco se marimbando para a opinião dessas pessoas e para debates que proliferam na sociedade actual inócuos, sendo neste caso o exemplo escolhido poder ou não um actor negro desempenhar o papel de James Bond.

“Danny Nedelko” é a melhor forma de mostrar a incoerência de uma sociedade que tanto beneficiou de um multiculturalismo e agora parece recusar totalmente esse aspecto da sua existência. Talbot fá-lo chamando para o “palco” nomes como Freddie Mercury, Mo Farah, Malala, para além de Nedelko (seu amigo britânico de raízes ucranianas). “Love Song” ataca a pouca vontade de esforço que uma relação requer, ironizando com “Look at the card I bought / It says “I love you” e chega. “June” é a canção mais dura do álbum, trazendo à tona o momento mais dificil de Talbot – a morte no nascimento da sua filha. Talbot fá-lo de forma crua, utilizando parte de um breve conto “babies shoes, never worn”.

Mais para a frente, “Samaritans” pretende mostrar a falência do modelo de macho que existia na geração anterior a esta, enquanto que “Television” ataca um tema cada vez mais premente, a relação entre humanos e tecnologia, a dependência de um sobre o outro, que, não sendo de agora, avança a um ritmo desregrado, descontrolado. Mesmo a encerrar o álbum “Rottweiler” é uma ode de sete minutos de barulho visceral, como se de um encerramento de concerto se tratasse, onde já vale tudo, desde solos a destruição de guitarras até ficar só o pedal a debitar som. E assim ficamos também nesta crónica, com os ouvidos a zumbirem, mas com a vontade de deixa lá ouvir esta merda outra vez.