terça-feira, 22 de outubro de 2024

Amália Rodrigues “Amália Canta Luís de Camões” (1965)

 Um EP juntou três primeiras incursões da voz de Amália pela poesia de Luís de Camões, com música de Alain Oulman. A polémica dividiu opiniões mas sobre o caso Amália respondeu: “achei uma burrice”. O tempo deu-lhe razão, naturalmente. 

Lado A: Lianor + Dura Memória

Lado B: Erros Meus

(Columbia, 1965)

As “polémicas” por vezes escapam aos mais distraídos. E em 1963 Amália tinha já cantado Luís de Camões. Fê-lo com Dura Memória, com música de Alain Oulma, que incluiu no alinhamento do álbum Amália 1963, que editou em França pela Ducretet Thomson. Porém foi quando, em 1965, juntou a Dura Memória outras duas incursões pelas palavras de Camões, que o “caso” estalou entre nós. Cantar Camões? Que ousadia!…

“Houve uma grande polémica por eu cantar Camões. Achei uma burrice. Por pior artista que seja, ninguém consegue destruir um grande poeta, se o cantar. E, se não fosse o Alain fazer uma música que eu achei que fica bem, nunca o teria cantado. Mas onde está a ofensa?”. As palavras, da própria Amália Rodrigues, fixadas na biografia de Vítor Pavão dos Santos, dizem tudo. Mas o burburinho instalou-se. As opiniões dividiram-se, surgindo ora vozes incomodadas ora deliciadas… Amália, inteligente, sempre respondeu sem ceder. Cantava… porque gostava. E ainda bem que gostou.

Três anos antes, com o álbum ao qual muitos começaram a chamar “Busto”, tinha começado a caminhar por terrenos de maior desafio, tanto na música como na escolha das palavras. Em 1965, no álbum Fado Português, consagrava-se definitivamente a visão musical que Alain Oulman propunha para Amália. E o leque de poetas envolvidos abria-se mais ainda, abrangendo, além de David Mourão-Ferreira e Pedro Homem de Melo, nomes como José Régio ou… Luís de Camões, de quem cantava “Lianor”, um dos poemas mais célebres da lírica do poeta, numa abordagem com música de Oulman e arranjos e direção de orquestra de Jorge Costa Pinto.

No mesmo ano em que era lançado o álbum Fado Português Amália juntava Dura Memória e Lianor a uma leitura (uma vez mais com música de Alain Oulman), de Erros Meus num disco de 45 rotações. Nasceu assim o EP Amália Canta Luís de Camões, que acentuou o “caso” que então deu que falar… O tempo deu-lhe razão. E das palavras de Camões nasceria um momento maior na sua obra, que deu inclusivamente título a um álbum histórico editado em 1970, claramente um dos mais importantes da sua discografia. Chamou-lhe Com Que Voz…

De José Mário Branco (Mudam-se os Tempos Mudam-se as Vontades) a José Afonso (Endechas a Bárbara Escrava ou Verdes São os Campos) ou Sérgio Godinho (citação em Definição do Amor), de Amélia Muge (Os Olhos de Helena) a Cristina Branco (Saudade) ou José Cid (Camões, As Descobertas… E Nós), Camões habita hoje, sem polémicas, a música popular portuguesa. As ousadias de Amália olharam acima do horizonte. E abriram caminhos…  




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