Já vou começar esse review deixando claro a minha posição sobre a carreira do Judas Priest. Pra mim, a banda inglesa não lança um álbum digno de nota há 32 anos, desde o controverso Turbo. Sendo um pouco mais cabeça dura, dá até pra aumentar esse tempo para 34 anos e considerar Defenders of the Faith, que chegou às lojas em janeiro de 1984, como o último grande disco do Judas Priest. Uma vida e tanto, né? E sim: na minha opinião, Painkiller (1990) é um álbum bem mediano e cuja faixa-título até hoje soa como uma gritaria sem sentido aos meus ouvidos. Daí tivemos a fase com Ripper Owens - que gerou os meia-bocas Jugulator (1997) e Demolition (2001) - e o posterior retorno de Rob Halford com dois discos apenas medianos - Angel of Retribution (2005) e Redeemer of Souls (2014) -, além do pior álbum da carreira do quinteto, o horrendo Nostradamus (2008).
Agora que vocês já leram o primeiro parágrafo e estão me mandando para os lugares mais criativos possíveis, vamos a Firepower. O décimo-oitavo disco de uma das maiores instituições do metal britânico é surpreendente. Produzido por Tom Allon (a primeira colaboração entre ambos desde Ram It Down, de 1988) e Andy Sneap (um dos mais reconhecidos produtores do metal contemporâneo, aqui em sua primeira parceria com a banda), é o segundo a contar com o guitarrista Richie Faulkner e não lembra nada do que o Judas Priest entregou nos últimos tempos. Firepower é muito superior a tudo que o Judas criou nas últimas décadas, e com folga. Ótima notícia, né?
São quatorze faixas que mostram na prática porque a banda carrega a alcunha de Metal Gods nas costas. O Judas Priest gravou um álbum moderno, alinhado com o que está sendo produzido no cenário metálico contemporâneo mas sem soar forçado como em Painkiller. Isso se dá porque a banda conseguiu equilibrar com experiência e sabedoria elementos atuais sem abrir mão dos ingredientes que compõe a sua sonoridade clássica. Estão aqui os belos riffs, os duetos inspirados de guitarra, a voz rascante de Rob Halford, a batida contagiante e a energia pulsante. E tudo feito com a mais alta qualidade.
Tem gente que acha que quem escreve sobre música sente prazer em criticar e detonar discos ruins. É divertido, admito, escrever sobre os problemas evidentes de álbuns como Nostradamus, Virtual XI ou St. Anger, mas é muito mais gratificante ser surpreendido faixa após faixa por um trabalho como Firepower. A sensação de estar ouvindo um clássico moderno do estilo é onipresente, e esse sentimento não tem preço que pague.
De modo geral, o que o Judas Priest fez foi olhar muito mais para os álbuns solo de Halford do que para os seus trabalhos mais recentes na hora de compor Firepower. As influências de Resurrection (2000) e Crucible (2002) são evidentes, como se o vocalista finalmente estivesse livre, pela primeira vez após o seu retorno em 2003, para aplicar o seu modo de ver as coisas na banda que o consagrou.
Rob Halford está cantando de maneira incrível em Firepower, em nada aparentando os quase 67 anos de vida. As guitarras, como sempre, são um destaque, com a juventude de Faulkner energizando Glenn Tipton como há tempos não se via. E a cozinha, com a dupla Ian Hill e Scott Travis, é de uma solidez arrepiante.
Não há destaques entre as faixas. Todas são fortes e consistentes e passeiam por características da sonoridade do grupo, indo de composições mais rápidas a momentos mais épicos. A inspiração é a protagonista em todas elas, e isso é tão evidente que soa até mesmo surpreendente, pois não é algo que se esperaria de uma banda como o Judas Priest após quase cinquenta anos de carreira. É como se ao quinteto atingisse outro ápice criativo em sua maturidade, algo bastante raro de presenciar no heavy metal, onde um dos poucos exemplos similares está em 13 (2013), o canto do cisne do Black Sabbath.
Firepower pode não ser o último disco da carreira do Judas Priest, mas se a banda resolvesse encerrar as atividades após a sua turnê de divulgação seria um fechamento perfeito para um dos nomes mais emblemáticos e influentes da história do metal.
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