Diz-se que foi um disco que redefiniu o glam rock e lançou algumas das bases da new wave. Seja como for, Roxy Music (a banda, mas sobretudo o disco com o seu nome) são incontornáveis, por isso resolvemos hoje festejar o álbum lançado em 1972.

Fará, no mês de junho próximo, quarenta e seis anos de vida. Com a idade que tem, e já vai sendo alguma, uma ou outra ruga sonora não poderia deixar de ser audível, mas isso pouco importa, sobretudo por estarmos em presença de um disco histórico, pensado, na sua quase totalidade, pela cabeça de Brian Ferry, mas também com a presença de um particular músico que seguiu, mais tarde, um caminho bem diferente e bem distinto daquele que trilhou primeiro, sobretudo à medida que o seu interesse musical foi fletindo pare outros fantásticos lugares. Nesse avanço de tempo, muita coisa aconteceu na história do grupo, mantendo-se ainda capaz de nos proporcionar mais alguns belos trabalhos, embora nenhum deles com os predicados deste primeiro longa duração, uma autêntica pedrada no charco nas ondas experimentais e vanguardistas do art rock e do glam. Para muitos dos fãs da banda, este não é o melhor dos discos de estúdio dos Roxy Music. É sempre assim, quando se expressam opiniões sobre quem se gosta. Há quem prefira o segundo (For Your Pleasure, 1973), há quem se encante particularmente com o último (Avalon, 1982), muito por culpa dos enormes sucessos que foram “Avalon” e “More Than This”. Pelo meio, há ainda outros cinco discos que merecem respeito e consideração mais ou menos unânimes. Mas por hoje, só Roxy Music nos interessa.

O lado A (era assim que se dizia, quando saiu a 16 de junho de 1972) abre com “Re-make / Re-model”, tema em que os músicos, todos ainda muito incipientes na forma como se conjugam, parece que lutam para que o seu instrumento prevaleça sobre os restantes. Segue-se “Ladytron”, tema responsável pelo nome da conhecida banda de electropop sediada em Liverpool, surgida nos finais dos anos noventa. É algo hipnotizante o efeito sonoro inicial produzido por Brian Eno no seu VCS3. A canção resulta clássica e futurista ao mesmo tempo, sobretudo pela citação de Sergei Prokofiev através do oboé de Andy Mackay. “If There Is Something” chega logo de seguida, parecendo trazer, de início, um certo travo a country, até que a guitarra e o saxofone vão tomando conta do recado, não esquecendo, para que o efeito resulte na totalidade, a voz livre e melancólica de Bryan Ferry. Depois, uma lição de boa pop. “Virginia Plain” ainda hoje provoca arrepios a quem a escuta. Composição que avança e para na sua particular construção repleta de ruídos e brilhos muito característicos, “Virginia Plain” é um verdadeiro achado sonoro. Curiosamente, a canção não aparecia na edição inglesa, o que ainda hoje nos parece difícil de perceber a razão para uma falha tão gigantesca. O lado A termina com “2HB”, tema dedicado ao ator herói de Casablanca, o mais que famoso filme de Michael Curtiz. “2HB” (ou, se preferir, “to Humphrey Bogart”) vive muito da aproximação que faz a “As Time Goes By” através do saxofone de Andy Mackay.

Tempo para mudar de lado. Tempo para ouvir a guerreira  “The Bob (Medley)”, título acrónimo para Battle of Britain, que introduz, a meio do refrão, ruídos de canhões e outras armas de fogo. É, na nossa opinião, uma batalha desinspirada, o momento menor do álbum. Em seguida, instala-se a estranheza inquietante de “Change Meeting”, inicialmente marcada pelo som de um piano bem comportado, mas depois acabando com estridências vanguardistas à moda de Brian Eno. Até que surge a belíssima balada (que logo deixa de ser balada para ser rock puro) “Would You Believe?”, tema de grande fôlego que poderia muito bem ter sido composta e cantada por David Bowie, por exemplo. Uma malha do tamanho do mundo! Segue-se “Sea Breezes”, o tema mais longo de todo o disco, que vive sobretudo da bateria que emerge a meio da canção, assim como a poderosa linha de baixo que também ganha destaque nessa mesma altura. É mais uma composição que vai ficando no ouvido à medida que vamos insistindo nela. “Bitters End” fecha o disco num meio tom de fim de festa bizarra, servindo com total propósito toda a extravagante excentricidade que é Roxy Music. Os arranjos vocais são totalmente british style, pelo que a canção encerra o álbum de estreia da banda de Ferry, Eno, Mackay, Phil Manzanera, Graham Simpson e Paul Thompson da melhor maneira possível.