sábado, 22 de fevereiro de 2025

Nina Simone “Blackbird – The Colpix Recordings (1959-1963)”

 Em inícios de 1959 Nina Simone tinha dado primeiros passos em disco como resultado de uma sessão de gravação, em Nova Iorque, na qual ficara o repertório que, por aqueles dias, apresentava regularmente nas suas atuações em Filadélfia. Logo ali havia registado sinais de personalidade quando, ao interpretar “Little Girl Blue”, juntava aos compassos iniciais uma citação, ao piano, do cântico “Good King Wenceslas” (com origens medievais e transformado depois ao logo dos séculos), ao juntar um instrumental de sua autoria a fechar o alinhamento ou, ainda, ao retirar o “s” quando cantou clássico “I Loves You Porgy” (ficou como “I Love You Porgy”) da ópera “Porgy & Bess” de Gershwin. E, perante um alinhamento essencialmente tranquilo, necessitando de um momento mais ritmado, capotou então uma versão de “My Baby Just Cares For Me” (anos mais tarde se tornaria num êxito global). Por aqueles dias foi contudo o single com “I Loves You Porgy” que lhe deu um inesperado episódio de sucesso, alcançando o número 18 na tabela norte-americana, arrastando consigo atenções sobre o álbum “Little Girl Blue”. Não terá sido surpresa para a pequena Bethlem Records que, então, um acordo discográfico de maior fôlego acabasse por chamar a si a jovem cantora.

Foi a Colpix Records, divisão discográfica da Columbia Pictures, quem então assegurou um acordo com Nina Simone, nascendo desse relacionamento um conjunto de oito álbuns editados entre 1959 e 1963, desde logo traduzindo o lote de lançamentos um peso significativo de gravações ao vivo. De resto, do lote, agora recuperado na caixa “Blackbird – The Colpix Recordings (1959-1963)” contam-se apena dois álbuns de estúdio já que, como explica o texto nas liner notes, “Forbidden Fruit” (1961), terá correspondido a uma gravação em ambiente (ou pelo menos rotinas) “live” e não exatamente ao clássico registo de sessões em estúdio. Nesse caso, e nesse contexto, encontramos aqui “The Amazing Nina Simone” (1959), com Nina Simone ao piano, acompanhada por uma orquestra dirigida por Bob Mersey, e “Nina Simone Sings Ellington” (1963), disco nascido de um desejo da própria cantora em em dedicar todo um alinhamento a canções de Duke Ellington, com arranjos assinados pela própria. 

É contudo ao vivo que se conta grande parte desta etapa na discografia de Nina Simone, num percurso que se inicia com a sua estreia no nova-iorquino Town Hall, gerando o álbum “Nina Simone at Town Hall” (1959), no qual surgem, ao lado da cantora, Wilbur Ware (baixo) e Ben Riley (bateria) e em cujo alinhamento Nina Simone regista pela primeira vez canções de sua autoria entre as várias versões que ali apresenta. No seguinte “Nina Simone at Newport” (1960), gravado na edição desse ano do Festival de Jazz de Newport (em Rhode Island), surge pela primeira vez o trio constituído por Al Schackman (guitarra), Chris White (baixo) e Bobby Hamilton (bateria), que a acompanhará não apenas no já referido “Forbidden Fruit”, como depois em “Nina Simone at the Village Gate” (disco de 1962 onde surge uma versão de “The House of the Rising Sun”). O lote de lançamentos reunidos nesta caixa termina com “Nina Simone at Carnegie Hall”, álbum de 1963 que guarda parte da gravação da noite de estreia da cantora na prestigiada sala nova-iorquina, surgindo a restante parte das fitas no alinhamento do seguinte “Folksy Nina” (editado já em 1964). O conceito do álbum duplo ainda não era coisa em prática por aqueles dias…

Logo desde “The Amazing Nina Simone” fica claro que cada disco de Nina Simone não se fecha num mesmo universo de géneros e referências (salvo, nesta etapa, o álbum dedicado a Duke Ellington), cruzando standards de jazz com canções vindas do teatro, do cinema, e também dos espaços da folk, da música africana ou de várias frentes da canção popular ocidental (com o tempo acabando por abraçar também a pop ou a soul). Essa coexistência, que dividiu opiniões, sublinha todavia as fortes marcas da personalidade de Nina Simone que, na verdade, moldava invariavelmente as canções à sua voz e, sobretudo, a uma intensa relação com o piano. O velho sonho, não concretizado, de uma carreira como pianista na área da música clássica viveu uma breve janela de comunicação no Carnegie Hall quando interpreta uma transcrição para piano da ária “Mon cœur s’ouvre à ta voix” da ópera “Sansão e Dalila” de Saint-Saëns, na mesma noite em que, também ao piano, presenteou a plateia com um excerto da música criada, por Irving Berlin, “Sayonara”. 

Estes oito álbuns originalmente editados entre 1959 e 1964 surgem reunidos agora numa caixa que os apresenta em versões “expandidas” com faixas extra que resultaram de material encontrado em arquivo nos últimos anos, juntando ainda em alguns casos gravações apresentadas em singles que a Colpix lançou também nesta etapa. 

Um outro olhar sobre Nina Simone chega agora com uma reedição de “Nina’s Back”, álbum lançado em 1985 e que então correspondeu ao primeiro de uma série de discos que a cantora apresentou no catálogo da VIP. Nascido após um hiato que se sucedeu a “Fodder on My Wings” (disco de 1982 dominado por composições da própria Nina Simone), “Nina’s Back”, caracterizado por uma sonoridade marcada pelos “sinais dos tempos”, cruza standards  (entre os quais uma nova leitura de “Porgy”) e composições da própria, surge neste novo lançamento com uma capa diferente da original. 

“Blackbird – The Colpix Recordings (1959-1963)”, de Nina Simone, é uma caixa de 8CD disponível numa edição pela Cherry Red. “Nina’s Back”, de Nina Simone, está disponível numa nova edição em LP, CD e igualmente disponível nas plataformas de streaming, num lançamento da Verve. 




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