quarta-feira, 12 de março de 2025

Rodrigo Cuevas “Manual de Romeria”

 Pode parecer uma alvorada algo tardia, já que o cartão de identidade aponta como data nascimento o ano de 1986. Mas na verdade o percurso de Rodrigo Cuevas, natural de Olviedo (nas Astúrias) passou por etapas de formação que ora passaram pelo conservatório na sua cidade natal (sobretudo focado no piano e tuba) e, depois, a Escola Superior de Música da Catalunha para ali estudar som. Ao percurso académico juntou experiências vivenciais, entre as quais uma marcante mudança para a Galiza, aos poucos encaminhado o seu espaço de vida para a placidez e distância que caracterizam o dia a dia numa aldeia. Começou o seu percurso integrando o coletivo La Dolorosa Compañía, depois com um primeiro EP em 2012 onde reinterpretava, à sua maneira, canções tradicionais galegas. Entre a ruralidade e as experiências da cultura global, entre as raízes do folclore e as eletrónicas, entre os ecos da terra e os palcos, assim foi desenhando um caminho que, firme na expressão de uma visão e uma identidade, o levaram, depois de mais dois EP (entre 2016 e 2018), ao álbum de estreia “Manual de Cortejo” (2019), disco produzido por Raül Refree, ao qual se seguiu a digressão Trópico de Covadonga que nos visitou em 2021 na Womex (Porto) e, em 2022, no MED, em Loulé. 2023, que o devolveu uma vez mais a palcos nacionais no FMM Sines, e o apresentará brevemente no cartaz do Misty Fest, propõe um passo seguinte e determinante, na forma de “Manual de Romeria”, um disco que de certa forma traduz a síntese do que até aqui acontecera mas, sobretudo, abre definitivamente possibilidades maiores de comunicação para a sua música.

Contando desta vez com Eduardo Cabra (ex-Calle 13) como parceiro na produção, Rodrigo Cuevas retoma em “Manual de Romeria” uma série de pistas já antes ensaiadas, porém com maior confiança, mais arrojo e um sentido pop claramente mais vincado. Esta dimensão luminosa, festiva até (o próprio título do álbum nota a ideia de uma romaria), contemporânea e pop não apaga contudo a alma de um músico que há muito encontra nas raízes os pontos de partida para a sua música. O alinhamento do disco inicia o percurso e, depois, abre frestas entre canções a momentos nos quais há vozes que nos encaminham ao reencontro de velhas tradições orais. Depois, é entre temas como “Más Animal”, “Casares” ou “Como Yé?!” que se desenham os novos caminhos pop que investem até pela pista de dança com DNA eletrónico no empolgante “Matinada”. Expressão de uma personalidade com discurso político bem claro, tanto que em tempos se falava sobretudo da sua música como sendo um caso de “agitação folclórica”, a música de Rodrigo Cuevas não celebra o hedonismo como fuga à realidade, mas antes como um modo de sublinhar a tenacidade de uma personalidade. O disco não foge por isso às nuances e até mesmo contradições que habitam em todos nós, alargando os planos cénicos para além das heranças naturais daquilo que em tempos teria conhecido como rótulo a expressão world music e destes episódios de “romaria” pop a instantes onde alguma introspecção e melancolia geram instantes de contraste que se escutam em canções como “Allá Arribita” ou “Valse”. Exuberante, mas sóbrio, moderno, mas atento às raízes, focado numa geografia cultural mas capaz de comunicar mais adiante, “Manual de Romeria” tem tudo para levar a música de Rodrigo Cuevas ainda mais longe. 

“Manual de Romeria” de Rodrigo Cuevas está disponível em LP, CD e nas plataformas digitais numa edição da Sony Music.



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