Os Xutos editaram entretanto várias compilações, mas o seu grande “best of” será sempre este disco ao vivo: vinte e oito clássicos gravados no pico absoluto da sua carreira.

Recuemos no nosso DeLorean para a noite de 31 de Julho de 1986. Cerca de mil espectadores no Rock Rendez Vous cantam em uníssono “é amanhã dia 1 de Agosto”. No dia seguinte, o clube enche de novo. Os míticos concertos foram gravados, captando os Xutos no auge da sua fase de banda de culto. Infelizmente, este registo só vê a luz do dia catorze anos depois.

Avancemos agora exactamente dois anos, para a noite de 31 de Julho de 1988. Os fãs dos Xutos cantam outra vez “é amanhã dia 1 de Agosto”, uma data mágica na sua mitologia. Mas tudo o resto é diferente. Entretanto aconteceu o sucesso tremendo dos LPs Circo de Feras e 88, para não falar do sétimo single “A minha Casinha”. Os Xutos já não são apenas uma banda de culto: são agora a maior banda nacional. O exíguo Rock Rendez Vous não conseguiria albergar tantos fãs, razão pela qual o concerto acontece num espaço bem mais amplo: o Pavilhão dos Belenenses, com uma lotação de mais de seis mil pessoas. O Pavilhão enche três noites seguidas: 29, 30 e 31 de Julho. O culminar de uma digressão nacional de 60 concertos em apenas quatro meses, apresentando o álbum 88 a mais de 240 mil pessoas. Portugal nunca tinha visto nada assim.

Estes concertos no Restelo foram gravados e desta vez não ficaram na gaveta. Em Novembro de 1988, é publicado o álbum triplo Ao Vivo, um disco que regista os Xutos no auge da sua criatividade e popularidade. Por isso, o alinhamento é de sonho: uma enxurrada de clássicos que toda uma geração sabe de cor. Até 88 os Xutos não sabiam fazer más canções (o primeiro deslize surgiria um ano depois com o mediano Gritos Mudos). Por isso, todos os temas são colossos rock, hinos que sabemos de trás para a frente. Que outra banda da altura tinha vinte e oito canções perfeitas para nos mostrar, dando-se mesmo ao luxo de deixar de fora pérolas como a “Se Me Amas”?

A produção do disco foi corajosa. Os microfones fizeram questão de captar o ruído do pavilhão. Num dilema entre a qualidade acústica e a autenticidade, optou-se, e bem, pela última. De maneira que o som é sujo mas cheio de vivacidade, atirando o ouvinte para o centro do pavilhão, como se lá estivéssemos também, aos saltos, entornando o copo de cerveja e as borras do cigarro para cima dos fãs do lado.

O disco foi um sucesso. Pudera, um triplo-disco ao preço de um era um convite irrecusável. A ideia roubaram aos mestres Clash, que fizeram o mesmo com o seu triplo-álbum SandinistaAo Vivo foi disco de platina, à semelhança do que acontecera com 88. Mesmo para a melhor banda de rock português, dois discos de platina no mesmo ano é obra.

Os Xutos editaram entretanto várias compilações, mas o seu grande “best of” será sempre este disco: vinte e oito clássicos captados no pico absoluto da sua carreira. Se cometerem o crime de terem na vossa colecção  apenas um disco dos Xutos, então que seja este. Estareis então perdoados.