Numa cultura tantas vezes marcada pelo primado do “eu” não deixa de ser interessante observar momentos em que músicos, já com obra gravada (e aclamada) optam por ceder protagonismo, apresentando-se a bordo de uma banda. Um exemplo maior aconteceu com David Bowie quando, na reta final dos anos 80, o músico resolveu encerrar a década de maior sucesso comercial da sua vida surgindo em 1989 como elemento dos Tin Machine. Ou quando a brasileira Tulipa Ruiz se juntou a três amigos (entre os quais o irmão Gustavo) para criar o coletivo Trago com o qual gravou um (belo) álbum em 2024. Estes são casos algo diferentes do momento que viu Bob Dylan ou George Harrisson (juntamente com Tom Petty, Roy Orbison e Jeff Lynne) a formar os Travelling Wilburys, na verdade, mais próximos do conceito da “superbanda”. Isto para não falar de bandas que nasceram com músicos que vinham de bandas anteriores. E aí, dos Erasure aos Foo Fighters, dos Big Audio Dynamite às Breeders, dos Luna aos Pluto, a história é bem mais vasta. Tudo isto para chegarmos a Sharon Van Etten que, ao cabo de seis álbuns, lança agora um sétimo disco partilhando a sua comunicação com a banda que a acompanha, assim se justificando o título: “Sharon Van Etten & The Attachment Theory”.

Sem perder marcas de personalidade, que no anterior (e magnífico) “We’ve Been Going About This All Wrong” (2022) a viam a refletir sobre a vulnerabilidade e a dúvida (ecoando os ainda nada distantes tempos de pandemia), eis que junta a essa faceta assombrada da sua alma novas evidências de heranças new wave numa espantosa coleção de canções nas quais os sintetizadores moldam arranjos que transpiram essa ideia de sonoridade de banda. Uma vez mais marcada por observações e reflexões sobre o mundo que a rodeia e os nossos comportamentos como sociedade, a música de Sharon Van Etten ganha neste disco um maior fôlego na composição cénica dos espaços, traduzindo o trabalho em banda uma capacidade em dar à voz (a do canto e também a criativa) de Sharon uma dimensão ainda mais sedutora. Os ambientes não perdem o tom tenso de outrora, mas ganham novas cores e músculo pop (com vitaminas que ecoam os oitentas), como se escuta em “Live Forever”, “Afterlife” ou “Idiot Box”. Mais adiante, ao som de “Fading Beauty”, voltamos a entender porque David Lynch em tempos levou a sua música a “Twin Peaks”.
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