domingo, 14 de dezembro de 2025

Grandes álbuns do Prog-Rock: Pulsar - "Halloween" (1977)

Originário de Lyon, França, este grupo foi formado em 1971 particularmente influenciado pelo Pink Floyd e compositores eruditos como Gustav Mahler. A jovem cena Prog francesa estava repleta de novidades e boa parte buscava um som sinfônico e teatral, mas o Pulsar buscou recriar o som do Pink Floyd com seu toque gaulês. Suas origens remontam à 1966 no colégio de ensino médio Saint-Just quando os colegas Jacques Roman (teclados, com alguns anos de estudo de piano clássico), Gilbert Gandil (guitarra e vocais principais, filho de um famoso acordeonista e, portanto, familiarizado com holofotes) e Victor Bosch (bateria) formaram um grupo de R'n'B, coisa de amigos para tocar covers (os três compartilhavam gosto pela música negra americana, pelo Blues e pela Soul Music), chamado "Soul Experience". Durante alguns anos, eles fizeram shows locais até que a Psicodelia reciclou tudo em seu caminho e transformou o "Soul Experience" em "Free Sound". Nesta fase, a banda já contava com Philippe Roman (baixo, irmão de Jacques). A onda da psicodelia, da improvisação e dos "delírios musicais" levou Jacques a se interessar pelos direção musical indicada por um certo Keith Emerson (do Nice). Nesta fase, também agregaram um "velho amigo" de Gilbert, Georges Chalandon, para a função de cantor/flautista. Georges agregou seu carisma (estilo Jim Morrison) e seu gosto pelo drama (no futuro, ele se tornaria o editor-chefe do jornal "Libération!"). Atrás dele, os quatro músicos o deixavam se divertir com sua capa preta/movimentos teatrais e embarcavam em peças musicais com estruturas cada vez mais complexas, apoiadas num espetáculo eficaz de luzes. Um show do Pink Floyd em Lyon em fev/70 os influenciou ainda mais. O "Free Sound" passou a dedicar mais da metade de seus shows a fazer covers do Floyd ("Set The Controls For The Heart Of The Sun", ""Careful with That Axe, Eugene", "Cymbaline", entre outros), sobrando pouco espaço para coisas como "Rondo" e "Dawn" (do primeiro álbum do The Nice) ou "Hibou, Anemone and Bear" (do segundo álbum do Soft Machine). Mas logo começaram a aparecer composições próprias. A maioria iria formar o primeiro álbum da banda. Nesta fase, aconteceu um grande concerto em jan/71 em Lyon para cerca de 5 mil pessoas, abrindo para o Family. Georges Chalandon saiu e Gilbert Gandil recuperou a função de cantor (que ocupava no início). Faltava um passo: tornar-se um grupo com identidade própria e não apenas uma banda-cover. Para isso, resolveram trocar de nome e, através de uma proposta de Philippe Roman, nasceu o "Pulsar". Durante o verão de 71, com o novo nome, o grupo foi vencedor de uma competição organizada no sul da França, que lhes deu acesso ao palco do famoso nightclub "Golf Drouot", em Paris. Ali, o Pulsar dividiu palco com outros aspirantes do Rock francês. Nessa ocasião, o selo Philips sugeriu a gravação de um álbum conjunto. Foi assim que o Pulsar conseguiu participar da lendária compilação "Groovy Pop Session". Retornaram à estrada e aos shows.
Em 74, Roland Richard, flautista que acompanhava o cantor/compositor/ator Jacques Higelin, juntou-se a eles e integrou-se perfeitamente bem. Foi quando decidiram tornar-se músicos profissionais e enviar uma demo tape para diversas gravadoras francesas. Sem sucesso. Um amigo contou-lhes sobre uma gravadora inglesa que era muito mais aberta a esse tipo de Rock aventureiro. Assim, o Pulsar tornou-se o primeiro grupo de Rock francês a assinar e ser distribuído por um selo inglês, a Kingdom Records, do ex-empresário do Caravan, Terry King. Estimulados, o Pulsar finalmente entrou num estúdio (em St-Etienne), após 8 anos de perseverança, para gravar seu primeiro álbum.
O seu álbum de estreia, "Pollen", de jan/75, foi aclamado pela maioria da imprensa francesa (apesar do fracasso comercial no Reino Unido), que os viam como uma brisa de ar fresco (pelo menos, na França), porque não se limitavam a copiar um estilo, mas acrescentava alguns toques sinfônicos que proporcionava um sabor especial. Na verdade, era mais Space Rock do que Prog, no sentido estrito, aliás, soando como o Pink Floyd num álbum tranquilo e de desenvolvimento lento (pense no Floyd da fase "More"). Música suave, algo experimental, cantada em francês (letras e vocais de Philippe), repleta de sitetizadores (Solina, ARP 2600 etc.). Claro, era derivativo (do Floyd), mas representou um marco no Rock Progressivo francês. Uniu o lado sinfônico com o espacial, fantásticas paisagens sonoras (viagens astrais), flauta delicada, ótimas interações, canções marcantes (à nível francês), bem cativante, vibração tipicamente francesa, num resultado bastante bom (apesar de não ter o requinte mágico Prog dos dois álbuns seguintes, os melhores deles). O grupo passou a ser chamado de "Pink Floyd francês". Para promover o álbum, o grupo fez alguns shows em clubes lendários de Londres, como o Marquee, onde obteve algum sucesso (contextualizando que 1975 foi um ano próspero para o Prog francês já que o Atoll lançou seu excelente segundo álbum, "L'araignée-mal" e o Ange estava lotando o Palais des Sports com o lançamento de "Emile Jacotey", seu quarto álbum, após o sucesso mais flagrante com "Au-delà du délire" no ano anterior).
A grande mudança (a justificar a inclusão da banda aqui nesta coluna de grandes álbuns do Prog-Rock) começaria com o segundo lançamento, "The Strands Of The Future", de set/76, quando se transformaram num quarteto, após a saída de Philippe Roman (em jan/76, não querendo suportar as pressões de um músico profissional e continuar a sustentar o ritmo dos shows), deixando seu irmão Jacques a cargo do baixo e dos teclados. O álbum foi um sucesso, vendendo 40 mil cópias em seis meses e tornando-os o segundo grupo em vendas no Rock francês. Isto os fez realizar cerca de 160 concertos naquele mesmo ano. Gravado no estúdio Aquarius, em Genebra/Suíça, "The Strands Of The Future" (um nome retirado do título de um romance de ficção científica que Philippe adorava), de fato, trouxe progressos notáveis em todos os aspectos (som, interpretação, composições, profissionalismo, letras assinadas por um professor amigo, François Artaud). Definitivamente, este álbum tem natureza muito mais sinfônica que seu antecessor, apesar de todo o Space Rock. O lado 1 era totalmente ocupado pela faixa-título (mais de 22 minutos), uma suíte suntuosa, mantida a inspiração floydiana (talvez, o momento definitivo da banda ao encapsular vários sabores típicos deles). No lado 2, "Flight", curtinha de menos de 3 minutos (meio Camel, meio Tangerine Dream), "Windows", de quase 9 minutos e "Fool's Failure", de mais de 10 minutos. A flauta é mais usada, momentos acústicos maravilhosos, Prog na essência, solos de guitarra de vibração hipnótica, camadas de sintetizadores. Pode-se dizer que este é o típico Prog francês poeticamente apaixonado, porém não no sentido do Ange/Mona Lisa (mais teatral), mas em climas melancólicos/introspectivos, algo como uma viagem psicológica aos reinos mais profundos/obscuros do "eu individual". A banda já havia ficado insatisfeita com a insuficiente promoção e má distribuição do álbum de estreia, mas para este segundo a Kingdom Records provou-se ser abaixo de qualquer expectativa. Isto obrigou o Pulsar a autofinanciar-se nos esforços de promoção. Felizmente, o álbum foi um grande sucesso de público e isso gerou um justo retorno do investimento. Como consequência, a banda decidiu não renovar o contrato inglês e contactou outras gravadoras. Acabou escolhedo a CBS, que lhes promoteu recursos substanciais para a produção do álbum seguinte.
Enquanto os dois álbuns anteriores foram gravados praticamente ao vivo em estúdio, "Halloween" foi refinado ao longo de cinco semanas nos estúdios Aquarius e se beneficiou dos mais recentes avanços tecnológicos da época, podendo competir com as melhores produções inglesas em termos de qualidade sonora. O quarteto, então, acrescentou mais um amigo, Michel Masson, como novo baixista e se dedicaram com toda força na criação do terceiro trabalho. "Halloween" (lançado em dez/77), em sua embalagem cuidada e luxuosa, era uma espécie de viagem imaginária de uma menina à terra das bonecas tristes. As letras (em inglês, como foco no além fronteiras francês) eram criações do grupo, porém inspiradas numa história idealizada pelo baterista Victor Bosch. Musicalmente, a inspiração veio do romantismo conturbado de Gustav Malher (regente/compositor Tcheco-austríaco de origem judaica, considerado um dos maiores compositores do período romântico da música erudita) e no romantismo ambíguo/lânguido do filme "Morte em Veneza" (1971), do diretor Luchino Visconti. Tal como em "The Strands Of The Future", havia momentos de pura magia, levando o ouvinte a sentir-se como vivendo um sonho. "Halloween" parecia iluminado por dentro, como um novo dia que amanhece (afugentando a escuridão onipresente em "The Strands Of The Future"). Foi o auge artístico do Pulsar. Estruturado em duas suítes multi-movimentos (cantadas em inglês), mantidas as paisagens sonoras floydianas (uma marca registrada da banda), porém com uma influência maior do Genesis, criando sinfonias crepusculares banhadas em sintetizadores nas quais guitarras levantam voos (aliás, como o guitarrista Gilbert Gandil cantando muito), espécie de paraíso Prog (um dos maiores momentos do Prog francês), sensação orquestral completa, psicodelia e passagens Space Rock capazes de levar ouvintes a viajar... climas reflexivos/misteriosos, melancolia vibrante, emprego de grande variedade de instrumentos (flauta, clarinete, todo tipo de teclados e percussões, violoncelo etc.), disposição quase cinematográfica, transições fluídas, densidade sombria, atmosferas oníricas (um cruzamento com a música eletrônica emergente evocando climas frios, noturnos e lunares). Se "The Strands Of The Future" significou a chegada do Pulsar à maturidade na busca de sua própria identidade, "Halloween" foi um passo à frente nesta evolução. Uma joia celebrada do Prog francês. E exatamente neste momento, a gravadora CBS (com quem a banda assinara um contrato de três álbuns) decidiu, por razões obscuras, não promovê-lo. Era 1977, a França sendo o primeiro mercado europeu onde o advento do Punk Rock chegou de maneira avassaladora (pense no Festival Punk em Mont-de-Marsan, em ago/76), talvez "Halloween" tenha vindo na hora errada. O show business e a imprensa especializada estavam voltados para o Punk Rock. A CBS também passara por duas mudanças de diretores artísticos e eles não fizeram esforços para apoiar o álbum, que se perdeu à sombra de um sonho. No ano seguinte, após se apresentar diante de 15 mil pessoas em Lisboa/Portugal, como prova final de seu sucesso/potencial, o Pulsar jogou a toalha e deixou a CBS. 


P.S.: abalados pelo episódio CBS, o Pulsar passou a se recusar jogar o jogo da grande mídia e do circo do R'n'R. "Bienvenue au Conseil d'Administration" (de 81) e "Görlitz" (de 89) foram álbuns de menos impacto e sucesso, embora ainda muito bons (sem estarem no nível dos primeiros). Todos da banda agora mantinha carreiras musicais proprias. Por isso, os longos períodos entre álbuns (sendo álbuns de reunião). Em 2007, surgiu inesperadamente "Memory Ashes", provavelmente o melhor deles pós-"Halloween".

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