segunda-feira, 2 de janeiro de 2023

O Rock And Roll E Sua Eterna Luta Com O Passado: Vocalistas

 

O assunto em questão é: vocalistas masculinos que perderam suas vozes.

Nós que gostamos de música “das antigas” (anos 60, 70 e 80), temos que entender que nossos heróis já estão todos na casa dos 55 anos pra mais. Isso não é nenhum problema, e é uma coisa muito legal ver homens mais velhos ainda no palco tocando seus instrumentos ou cantando ao redor do mundo (quando os mesmos não tentam se passar por meninos de 20 anos, ai a coisa fica ridícula). No entanto, existe uma linha que a grande maioria dos vocalistas dos anos 70 e 80 já cruzaram, faz tempo. É incontável o número de vocalistas que perderam suas vozes mas que continuam a cantar como se nada tivesse acontecido.

Antes de me aprofundar no porque, (e sem me alongar demais, pra não deixar o artigo chato) deixe-me tentar explicar que o que acontece, na maioria das vezes, é um problema: a) Físico e b) Psicológico. Existe um fator físico, que acontece com toda pessoa (homem ou mulher), mas é muito mais notório na voz masculina. Não vou tentar descrever o que acontece, existem muitos outros lugares para ler sobre isso (como no site A Terceira Idade). Mas basicamente o que acontece é que a voz vai, gradativamente, ficando mais grave e também perdendo sua força, como todo músculo (e a voz é basicamente um músculo). Existem tratamentos para tentar manter as qualidades da voz, mas me digam, que roqueiro se trata, medicamente, com antecedência?

Como eu expliquei ali em cima, esse processo vem em duas partes. O físico, quando bate, é basicamente irreversível, o psicológico é algo que pode ser cuidado. Nós, como fãs, poderíamos fazer algo no aspecto psicológico, por exemplo, não elogiando toda e cada bizarrice que eles fazem no palco… Muitos desses vocalistas passaram 30 ou mais anos em cima do palco, dizer pra eles que não é mais possível fazer o que sempre fizeram pode ser uma coisa dolorosa e impossível de se aceitar.

Um fator externo importante e que dá razão às presepadas dos nossos heróis são os próprios fã(nático)s, por diversas vezes fui vocal em minhas ideias sobre vocalistas e como eles deveriam parar, pois estavam manchando sua reputação e fui recebido com os famosos: “Você faz melhor pra poder criticar?” “Está fazendo o que aqui se você não gosta?” “Vai ouvir Axé, seu idiota” (resposta muito popular entre os amáveis Brasileiros) e a resposta que eu mais fico encantando ao ler: “Você não sabe nada de música, o cara é foda e canta pra caralho!”.

Acredito eu que exista um pensamento escondido na cabeça do fã que tem que justificar todo o tempo que ele investiu em seu artista favorito defendendo todo e cada segundo do que ele faz. Uma bobeira sem tamanho, mas ai entramos no papo psicológico mais uma vez…

Colocando todos esses fatos de lado, essa condição física que eu mencionei faz com que todo vocalista com mais de 50 anos perca sua voz (salvas raras exceções). Isso não atrapalha muito vocalistas que sempre exploraram tons mais graves, no entanto, como bem sabemos, o Rock And Roll é apaixonado pelos registros agudos e é aí que os vocalistas se ferram mais tarde!

São diversas as histórias de vocalistas que, quando jovens, eram capazes de ‘piruetas vocais’ e ‘canto castrati’  que ao envelhecer sobem no palco como se nada tivesse acontecido e fazem aquele papel vergonhoso. E hoje em dia com o Youtube… “ninguém será perdoado…”

Alguns vocalistas são honestos e vão a público em entrevistas ou notas e explicam que não dá mais. Outros simplesmente baixam o tom original das músicas para ainda tentar alcançar os velhos agudos. Já outros continuam como se nada tivesse acontecido e ai temos coisas ‘lindas’ como os exemplos da lista logo abaixo.

Mas veja bem, a minha intenção aqui não é simplesmente ‘detonar’ esses vocalistas, muitas das bandas dessa lista estão entre as minhas favoritas. A minha intenção é mostrar, principalmente ao fã, que não é por que o artista é seu herói que ele não falha. Se o motorista do ônibus estivesse quase cego e precisasse parar de dirigir você não o defenderia para continuar a dirigir, não é verdade? Sejamos honestos com nós mesmos.

A maioria desses vocalistas não precisa mais de dinheiro, todos tem a conta bancária forrada, então não é uma questão mercadológica, é ego, e enquanto todos aplaudem os desafinados no palco, novos e talentosos artistas não tem espaço, pois o fã vai ver o herói desafinar pela décima vez, mas não dá uma chance ao novato bom de gogó.

Bom, chega de queixa, abaixo a lista de vocalistas. O primeiro link é de uma faixa clássica dos anos de ouro do cantor, o segundo é a mesma faixa mas gravada há poucos anos atrás. Tudo, é claro, ao vivo.

E se você acha que eu simplesmente peguei um dia ruim do vocalista, fique a vontade e vá você mesmo ao Youtube pesquisar!


Paul Stanley (Kiss)

Strutter” (1975) x “Strutter” (2012)



Axl Rose (Guns N’ Roses)

Sweet Child O’ Mine” (1988) x “Sweet Child O’ Mine” (2014)


Andreas “Andi” Deris (Helloween)

If I Could Fly” (2003) x “If I Could Fly” (2013) 


Dave Mustaine (Megadeth)

Holy Wars… The Punishment Due” (1992) x “Holy Wars… The Punishment Due” (2016) 


Ian Gillan (Deep Purple)

Highway Star” (1972) x “Highway Star” (2012)


Geddy Lee (Rush)

Red Barchetta” (1981) x “Red Barchetta” (2011)


 

Jon Bon Jovi (Bon Jovi)

Livin’ On A Prayer” (1995) x “Livin’ On A Prayer” (2016)


Ian Anderson (Jethro Tull)

Thick As A Brick” (1977) x “Thick As A Brick” (2014)


 

Edu Falaschi (Angra)

Nova Era” (2001) x “Nova Era” (2011) / “Nova Era” (2015)


Ozzy Osbourne (Black Sabbath)

Paranoid” (1970) x “Paranoid” (2016)


Nota: vamos ser honestos e dar crédito a quem merece, vocalistas como Steven Tyler (Aerosmith), Paul McCartney (The Beatles, solo), Mick Jagger (The Rolling Stones), Glenn Hughes (Trapeze, Deep Purple), Paul D’Anno (ex-Iron Maiden), Bruce Dickinson (Iron Maiden), James Hetfield (Metallica), Jon Anderson (Yes), Robert Plant (Led Zeppelin), John Fogerty (Creedence Clearwater Revival) e outros ainda seguram a onda muitíssimo bem!

Também deixei de citar vocalistas que pararam de cantar ou que agora cantam em um estilo completamente diferente.

Os defensores do metal: Hellish War

 

Hoje o heavy metal tradicional está em alta aqui no Brasil por conta das diversas bandas mais novas que levantam a bandeira oitentista. Foi criado até uma sigla, aos moldes na NWOBHM, para nomear esse enorme grupo de bandas que vem surgindo no mundo todo, a NWOTHM – ou New Wave of Traditional Heavy Metal. Recentemente tratei de outro grupo brasileiro que também levanta essa bandeira, o Battalion, matéria que você pode ler aqui. O Hellish War facilmente seria incluído nesse grupo de bandas, já que o que se ouve em seu som é uma amálgama dos grupos ingleses e alemães da primeira metade da década de 80. Entretanto os brasileiros já têm bastante experiência na cena metálica nacional, o que nos impede de considerá-los uma banda nova e sua formação foi em uma época em que o metal tradicional estava longe de ser unanimidade.

Oriundos da cidade de Campinas, estado de São Paulo, o grupo se junto ainda em 1995, época em que o grunge e as bandas de metal industrial estavam em alta, e, no ano seguinte, gravam uma demo chamada The Sign ainda atuando com um trio capitaneado pelo guitarrista Vulcano. Alguns anos depois regravam as músicas de The Sign e com mais seis faixas lançam o primeiro full lenghtDefender of Metal (2001). A formação, bastante alterada em relação à demo tape, já tinha se estabilizado como um quinteto e continha o já citado Vulcano na guitarra, Daniel Job como o segundo guitarrista, o baterista Jayr Costa, Gustavo Gostautas no baixo e no vocal Roger Hammer.

A instrumental “Into the Battle” nos leva até a faixa que deu nome à banda, um metal rápido que seria facilmente classificado como speed metal caso tivesse sido lançado em 1983. Músicas com nomes como “We Are Living for the Metal”, “Defender of Metal” e “Memories of Metal” nos dá um pouco do clima do álbum, ou seja, uma ode ao metal. Acredito que todos que ouvirem o disco terão suas atenções para o trabalho de guitarras. Muitas melodias, solos e riffs velozes ao longo de todas as músicas. Inclusive as faixas mais longas “Sacred Sword”, minha preferida, e “The Law of the Blade” me fez lembrar da alternância de solos que temos em músicas do Helloween no início de carreira. A produção poderia ser melhor, mas sua qualidade é compreensível que uma banda em início de carreira, mesmo que isso não seja um fator desabonador e sequer chega a atrapalhar o som da banda.

O baterista Jayr Costa deixa o grupo após o primeiro disco e é substituído por Daniel Person. Depois de um longo tempo finalmente sai em 2008 seu segundo álbum Heroes of Tomorrow. Lançado de forma independente, o álbum foi bastante elogiado tanto aqui no país quanto fora e os levou para uma primeira turnê europeia. Heroes of Tomorrow mostrou uma banda mais madura, com produção mais bem feita e uma técnica musical mais apurada. Esses shows em solo europeu resultaram em um disco ao vivo lançado no ano de 2009 chamado Live in Germany, gravado de seu último show em solo alemão no Razorblade Festival.

Após um pequeno hiato em que o guitarrista Vulcano chegou a acompanhar Ripper Owens em turnês aqui na América do Sul o Hellish War voltou com uma formação diferente para gravar Keep It Hellish (2013). Saíram Roger Hammer e Gustavo Gostautas que foram substituídos por Bil Martins e JR, respectivamente. Durante esse tempo o Hellish War contou até com uma cantora chamada Thalita.

A faixa título abre o álbum mostrando que se houve evolução técnica da banda e o vocal de Bil Martins se mostram um pouco mais melódicos e com menos drive que Roger Hammer, mas a troca não foi suficiente para descaracterizar o som que a banda sempre foi fiel.  Podemos encontrar elementos de diversas bandas ao longo do disco como Helloween, Iron Maiden, Metallica e o Viper com André Matos e essa comparação não tem a menor intenção de diminuir a criatividade do grupo. Aliás, é exatamente a criatividade que ajuda a transformar ideias que podem parecer simples, sem a necessidade de firulas musicais, em faixas empolgantes e que vão agradar todos aqueles que entendem que o metal old school será sempre o melhor.Particularmente sou um aficionado naquelas bandas e a audição dos discos do Hellish War me deram a mesma boa sensação que tenho quando eu encontro um bom lançamento de uma banda qualquer de 1984.

Está marcado para julho o relançamento do álbum de estréia, Defender Of Metal, que trará uma faixa bônus inédita. O relançamento direcionado para a imprensa vem em um cardboard que consta na contracapa que a nova edição é dedicada à memória de Jayr Costa. Como não encontrei em nenhuma entrevista ou matéria sobre eles alguma informação sobre isso só posso deduzir que o antigo baterista já é falecido (se isso não for verdade por favor me desculpem). Defender Of Metal é um importante marco para a carreira do Hellish War e conseguiu ao longo desses anos um bom reconhecimento, principalmente na Europa – algo que acontece com mais frequência do que desejávamos. Os comentários vindo de lá dizendo que este seria um disco que qualquer banda européia gostaria de ter gravado enche a banda de orgulho. Após quatro anos do seu último lançamento agora é esperar por novos trabalhos dos campineiros.

Sugaray Rayford – In Too Deep

 

Em In Too DeepSugaray Rayford entrega um álbum tecnicamente impecável, repleto de energia e alma.

Sugaray Rayford é o nome artístico de Caron Nimoy Rayford, cantor e compositor norte-americano de blues e soul. Apesar de não ser tão conhecido pelo público, ele vem atraindo a atenção da crítica especializada, seu último álbum, Somebody Save Me (2019), foi indicado ao prêmio Grammy na categoria de “Melhor Álbum de Blues Contemporâneo”.

In Too Deep é o sexto álbum de estúdio da carreira de Rayford. O material foi produzido e composto por Eric Corne, profissional que possui no currículo colaborações com John Mayall, Joe Walsh (James Gang e Eagles), Edgar Winter, Glenn Campbell, Nancy Wilson (Heart) e muitos outros artistas.

Ao todo são dez poderosas faixas que combinam melodias clássicas da soul music com o lamento do blues, a intensidade do gospel, a urgência do rock e o balanço do funk. As letras abordam assuntos sérios como estresse pós-traumático (doença mental muito comum em soldados), direitos civis e justiça social, além de temas sentimentais como o amor e solidão. Sob o aspecto instrumental, as performances são irretocáveis, repletas de energia e autenticidade. Contudo, o que mais chama a atenção é a intensidade e profundidade do trabalho vocal de Rayford, seguramente um dos melhores cantores de soul da atualidade.

Sugaray Rayford

A canção que abre o disco (“Invisible Soldier”) é um soul raivoso com naipe de metais em que Rayford, um ex-marine, fala sobre as consequências dos traumas pós-guerra, principalmente dificuldade para dormir.

“In Too Deep”, faixa suplicante que nomeia o álbum, percorre o terreno do blues rock com um pé cravado no gospel. “Under the Crescent Moon”, por sua vez, possui uma levada soul com ares pantanosos que remetem às regiões ribeirinhas da Luisiana.

Em “Miss Information”, o artista clama por justiça social cantando em cima de uma base sustentada por uma linha de contrabaixo pulsante, percussão latina e metais.

O lado sentimental está muito bem representado nas baladas sensuais “No Limit to My Love”, “One” e “Golden Lady of the Canyon”. De outro lado, o groove impera em “Gonna Lift You Up” e “United We Stand”.

Um dos pontos altos do álbum é a canção “Please Take My Hand”. Nela, Rayford canta como um pastor pregando numa igreja pentecostal no interior do Mississippi. O ritmo é conduzido por palmas, vocais de apoio masculinos em uníssono e a batida de um cowbell ao fundo que enfatiza a emocionante performance do cantor.

Em In Too Deep, Sugaray Rayford não poupa esforços e mostra que possui todas as credenciais para ser considerado um dos melhores cantores de soul da atualidade: voz potente, excelente repertório, interpretações intensas e carisma. Energia bruta! 

FICHA TÉCNICA

Artista: Sugaray Rayford

Álbum: In Too Deep

Produção: Eric Corne

Duração: 37m51s

Data de Lançamento: 04 de março de 2022

Gravadora: Forty Below Records

Faixas:

01. Invisible Soldier (Corne)

02. In Too Deep (Corne/Rayford)

03. No Limit to My Love (Corne)

04. Under the Crescent Moon (Corne)

05. Miss Information (Corne)

06. Please Take My Hand (Corne)

07. One (Corne)

08. Gonna Lift You Up (Corne)

09. Golden Lady of the Canyon (Corne)

10. United We Stand (Corne/Rayford)

Clique aqui para ouvir In Too Deep.

Pink Floyd – The Division Bell (1994)


 Lançado em 28 de março de 1994, The Division Bell é o décimo quarto álbum de estúdio gravado pelo Pink Floyd, o segundo sem a presença do baixista Roger Waters.

Ao todo são 11 faixas, a maioria delas composta por David Gilmour e sua esposa, a escritora e jornalista Polly Samson. O tecladista Richard Wright também contribuiu significativamente no processo de composição, chegando a cantar em uma faixa (“Wearing the Inside Out”). A produção ficou a cargo de Bob Ezrin, profissional que trabalhou com a banda em The Wall (1979) e A Momentary Lapse of Reason (1987).

The Division Bell não chega a ser um álbum conceitual, mas a temática predominante aborda questões sobre a comunicação interpessoal e como ela pode ser utilizada para dirimir conflitos.

O Pink Floyd em 1994: Rick Wright, David Gilmour e Nick Mason.

Apesar de ter alcançado enorme sucesso comercial, The Division Bell recebeu críticas mornas por parte da crítica especializada. Na tradicional revista Rolling Stone, por exemplo, o álbum recebeu nota 2,5/5.

Dentre as canções, destacam-se positivamente a inquiritorial “What Do You Want From Me”, “Coming Back to Life” e a sombria “High Hopes”, uma das melhores canções da carreira da banda. A propósito, as duas últimas são presenças constantes nos setlists dos shows solo realizados por David Gilmour.

The Division Bell não possui a genialidade de um Dark Side of the Moon, mas não faz feio na consistente discografia do Pink Floyd. Aliás, é o melhor trabalho lançado pela banda desde The Wall

Curiosidades:

– The Division Bell atingiu o primeiro lugar no Top 200 da Bilboard.

– Vendeu mais de três milhões de álbuns apenas nos Estados Unidos. As vendas já ultrapassaram seis milhões de cópias em todo mundo.

– A música “Marooned” recebeu um Grammy na categoria “Melhor Performance de Rock Instrumental”.

– Faixas não aproveitadas em The Division Bell foram lançadas no álbum The Endless River (2014).

– A famosa arte da capa foi criada por Storm Thorgerson, velho colaborador que criou praticamente todas as capas de discos lançados pelo Pink Floyd desde A Saucerful of Secrets (1968).

A emblemática capa de The Division Bell.

FICHA TÉCNICA

Artista: Pink Floyd

Álbum: The Division Bell

Data de lançamento: 28 de março de 1994 (UK) e 05 de abril de 1994 (EUA)

Tempo de duração: 66m32s

Produção: David Gilmour e Bob Ezrin

Gravadora: EMI Records (UK)/Columbia Records (EUA)

Faixas:

01. Cluster One (Gilmour/Wright)

02. What Do You Want From Me (Gilmour/Samson/Wright)

03. Poles Apart (Gilmour/Samson/Laird-Clowes)

04. Marooned (Gilmour/Wright)

05 A Great Day For Freedom (Gilmour/Samson)

06. Wearing the Inside Out (Moore/Wright)

07. Take It Back (Ezrin/Gilmour/Samson/Laird-Clowes)

08. Coming Back to Life (Gilmour)

09. Keep Talking (Gilmour/Samson/Wright)

10. Lost for Words (Gilmour/Samson)

11. High Hopes (Gilmour/Samson)

CRONICA - KING CRIMSON | In The Wake Of Poseidon (1970)

 

Em outubro de 1969, o primeiro álbum do King Crimson havia acabado de enterrar os anos sessenta, deixando a voz livre para os anos 70 do ponto de vista musical. O domínio do rock psicodélico na Inglaterra e em todo o continente europeu estava chegando ao fim. Era hora do rock progressivo. Mostrando grande maturidade, o grupo de Robert Fripp acabava de desferir um golpe. Ao abalar códigos e princípios, coube ao Crimson King dar uma boa sequência a In The Court Of Crimson King .

Apesar do sucesso, o grupo não escapou da separação ocorrida menos de três meses após o lançamento do primeiro álbum. O saxofonista Ian McDonald, logo acompanhado pelo baterista Michael Giles, preferiu sair para formar sua própria banda. Era assim urgente para o guitarrista binoclard encontrar novos recrutas para voltar ao trabalho.

A nova formação foi reforçada por Keith Tippet no piano, Mel Collins no sax e Peter Giles no baixo deixando Greg Lake na largada apenas nos vocais (no álbum anterior ele também fornecia o baixo). Em maio de 1970, foi lançado In The Wake Of Poseidon .

Todos os ingredientes que aparecem em In The Court serão usados ​​em In The Wake : síntese entre intensidade de emoção e sofisticação de escrita, fusão impressionante entre jazz, clássico, folk, ênfase majestosa, heavy see garage, surrealismo negro, lirismo atormentado e imagens medievais . Tudo isso com uma delicadeza e requinte de tirar o fôlego e cuja formação, reconstruída ou não, é um mestre do gênero.

O álbum começa e termina com “Peace”, cantada a cappella com uma voz tímida e frágil de Greg Lake. A sequência é um início de fanfarra em Pictures Of A City que mescla hard rock e jazz, passagem flutuante e momento delirante e na guitarra da qual Robert Fripp tem o segredo com stop, counter beat e uso de agudos.

"Cadence And Cascade" revela um King Crimson mais intimista com esse violão feltrado, esse piano sutil e límpido sem esquecer essa flauta quente. Queremos nos aconchegar em uma poltrona aconchegante perto de uma lareira enquanto olhamos pela janela para uma bela noite estrelada. Mas surpresa, o canto não é fornecido por Greg Lake, mas por um recém-chegado: Gordon Haskell, que estará presente em futuras produções.

A faixa homônima nos mergulha na melancolia com este mellotron sensível e superficial. A voz de Greg Lake é quase melancólica e desesperada, apesar de uma guitarra às vezes dissonante.

Após o interlúdio “Peace – A Theme” tocado no violão, abra caminho para o jazz bluesy e funky “Cat Food”. O canto de Greg Lake torna-se mais rock e Keith Tippet nos gratifica com belos vôos de piano que são ao mesmo tempo sinfônicos, jazzísticos e intrigantes.

Já a longa peça que é “O Triângulo do Diabo” (mais de 11 minutos), mergulha-nos na angústia e no pesadelo com este mellotron ameaçador e niilista, este ritmo militar, este vento que parece varrer tudo ao longo da sua passagem. Reina como uma atmosfera de fim do mundo, de guerra punitiva, de apocalipse, de juízo final com estes sons de trombeta da morte, este dilúvio sonoro e este flashback musical que nos remete ao primeiro álbum do rei púrpura. Depois, no final, tem esse violão que nos livra dessa bad trip de dar suores frios.

King Crimson tinha acabado de confirmar o status de uma grande banda de rock, apesar das saídas de Greg Lake para o ELP e Michael Giles. Mas essas decepções não impediriam o surgimento de um grupo que nada mais tinha a provar.

Títulos:
1. Peace – A Beginning
2. Pictures Of A City
3. Cadence And Cascade
4. In The Wake Of Poseidon
5. Peace – A Theme
6. Cat Food
7. The Devil’s Triangle
8. Peace – An End

Músicos:
Robert Fripp: Guitarra, Mellotron
Greg Lake: Vocal
Mel Collins: Saxofone, Flauta
Michael Giles: Bateria
Peter Giles: Baixo
Keith Tippett: Piano
Gordon Haskell: Chaht
Peter Sinfield: Letrista

Produção: Robert Fripp, Peter Sinfield

MUSICA AFRICANA


Gil Futa - Gil Futa (2020)




Érica Boaventura - Escolho-te a Ti (Novo Single 2020)




Venom Vnm - Love & Party, Vol.2 (2020)



The Incredible String Band – The Hangman’s Beautiful Daughter (1968)


 

O terceiro disco dos Incredible String Band, The Hangman’s Beautiful Daughter, é um dos clássicos maiores do folk psicadélico. Pai do Tim Buckley. Avô dos Fleet Foxes.

Os Incredible String Band vêm do circuito folk dos pubs de Edimburgo, começando por fazer música tradicional e respeitável. Até que a primeira dose de LSD muda tudo: a harmónica é agora rosa-choque, a viola transforma-se numa cítara fluorescente, o microfone pensa que é um relógio de Dali. Se a própria realidade se molda como plasticina colorida, porque não haveria a criação de ser barro igualmente maleável? Daí que Hangman’s Beautiful Daughter, terceiro disco do duo escocês, seja um salto no desconhecido, folk nos timbres acústicos e referências celtas, psicadélico na desbragada experimentação.

Não é a tradição em si mesma que é rejeitada, apenas qualquer ideia de pureza na pescaria. Mil referências contraditórias são reunidas na mesma demente torre de Babel: baladas trovadorescas jogam à bisca com hinos gospel, coros operáticos entrelaçam-se com vozeares arabescos, cítaras à Ravi Shankar apanhadas no prostíbulo com o mais burlesco music hall. Uma trip de ácidos, portanto: tudo está ligado a tudo, o passado e o futuro são um só…

Um humor nonsense atravessa o disco, algures entre a Alice no País das Maravilhas e os interlúdios de animação dos Monty Python. Em “The Minotaur’s Song” ficamos a saber que a pobre criatura mitológica não consegue dormir convenientemente por causa dos seus desconfortáveis cornos! “Witches Hat” e “Koeeoaddi There” têm o mesmo humor desconcertante, surreal e vitoriano ao mesmo tempo. Na próxima semana o macaco vem visitar-nos? A senhora Thompson ofereceu-me um urso? Que diabo! Se Lewis Carroll não tomasse banho escreveria assim…

The Hangman’s Beautiful Daughter não é um objecto fácil. Mesmo os temas mais orelhudos são subvertidos por arranjos excêntricos. Veja-se a dylanesca “Mercy I Cry City”, onde uma flauta anti-musical, piando ao acaso como um pássaro estúpido, corrompe o convencionalismo da canção. A experimentação nas vozes está sempre no limbo entre a dissonância avant-garde e a dolorosa desafinação. À primeira escuta confessamos crimes; à quarta, juramos amor eterno.

Muitos acusarão The Hangman’s Beautiful Daughter de ser irremediavelmente datado mas a história escreve direito por linhas tortas. Falamos do movimento freak folk do início do milénio, quando os neo-hippies Devendra Banhart e Joanna Newsom reclamam o seu legado. Sem a excentricidade barbuda dos Incredible String Band não haveria Fleet Foxes ou Grizzly Bear, Iron & Wine ou Bon Iver. Os clássicos nunca são datados, por definição…

Destaque

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