quarta-feira, 3 de julho de 2024
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Kikagaku Moyo – Masana Temples (2018)
Em Masana Temples, os japoneses Kikagaku Moyo dão-nos a mão para uma viagem a várias latitudes sonoras com o rock psicadélico como fio condutor.
Os Kikagaku Moyo (qualquer coisa como padrões geométricos, em português) são uma banda de Tóquio formada em 2012 e já com quatro álbuns e dois EP’s editados. O seu último trabalho, Masana Temples, foi gravado em Lisboa e produzido por Bruno Pernadas, e sim, japoneses psicadélicos na capital portuguesa vai ter sempre um toque bizarro e é mesmo isso que se espera.
Fruto desta relação, à partida improvável, ou das várias influências e viagens dos membros da banda, este disco vai além do psicadélico, prog ou rock, abraçando novas abordagens e criando uma viagem emocional com altos e baixos, desde o animado wah-wah com toques dos anos 60 em “Dripping Sun”, que abre num rock cheio de pratos de choque, ao dançável e sincopado “Nana”.
O facto de não entendermos as letras leva-nos a apreciar a música por si, e isso ajuda a salientar a qualidade das composições e da gravação, que convida a um bom sistema de som ou um par de auscultadores de qualidade, para perceber as várias camadas de sons que a banda criou neste álbum.
Comparando este Masana Temples com algumas canções anteriores de Kikagaku Moyo, a banda está mais polida e consistente. As influências culturais sempre lá estiveram, como em “Streets of Calcutta” de 2014 e os vários estilos também, como comprovam várias canções no disco House In The Tall Grass de 2016. Neste novo trabalho, “Gatherings” talvez seja a música que mais soa aos anteriores trabalhos, com o fuzz psicadélico e a composição em crescendo mas de uma forma geral, estes Kikagaku Moyo são mais fáceis no ouvido, a lembrar por vezes a luminosidade de uns Boogarins, na contemplativa “Orange Peel”, ou os também japoneses Sour, nos atrevimentos jazzísticos em algumas faixas (e muitos outros do estilo mas por ser cantado em japonês fez saltar esta memória musical), especialmente a extremamente bem conseguida “Dripping Sun”.
Este é o trabalho mais completo destes japoneses psicadélicos com ligação a Lisboa, um bom disco para descobrir e ouvir sem pressas.
Medeiros/Lucas – Sol de Março (2018)
Em Sol de Março, o terceiro disco da dupla Medeiros/Lucas, a voz de Medeiros está ainda mais quente e os instrumentais de Lucas mais cheios do que nos dois antecessores. E as letras de João Pedro Porto continuam a reflectir uma açorianidade das quais os principais mentores do projecto não desejam – nem devem – abdicar.
E apesar de continuarem a cantar a tradição açoriana, desta vez há piscares de olhos a África e à Europa, porque cantar e experimentar continua a não incomodar Pedro Lucas e Carlos Medeiros. E se no disco Terra do Corpo (2016), Tó Trips Dead Combo foi convidado especial (bem como Carlos Barreto e Rui de Carvalho – Filho da Mãe), continua a sentir-se a influência do guitarrista em temas como “Os Pássaros”.
Sol de Março tem momentos de tremenda beleza – a faixa título, “Obscurantismo” e “Podre Poder”, para nomear alguns – e outros menos bem conseguidos, como “Em Condicional”, em que a dupla se atira para águas demasiado profundas e perde as ligações ao cancioneiro açoriano.
Ouvir as canções de Medeiros/Lucas não substitui uma ida aos Açores (na verdade, poucas experiências podem substituir a sensação de chegar às ilhas), mas serve como um bom complemento ao cancioneiro português. Porque, tal como Zeca Afonso fez com o Cante Alentejano, Fausto Bordalo Dias com as tradições populares, ou Zé Mário Branco com os grandes poetas, ou mesmo Zeca Medeiros com a música dos Açores, esta dupla foi essencial para tornar mais “comercial” a sonoridade das ilhas. E, quando um dia se fizer uma recolha sobre a música açoriana, os Medeiros/Lucas merecem, pelo menos, uma nota de rodapé.
Jacco Gardner – Somnium (2018)
Ao terceiro disco, Jacco Gardner esquece as palavras e dá-nos uma viagem pelo seu mundo em modo ambiente. O percurso é satisfatório mas sabe a pouco.
O pequeno holandês, actualmente a viver em Portugal (quem não está nos dias de hoje?), já mostrou ser um nome a ter em conta na mais recente vaga psicadélica do início da década. O seu imaginário, bastante influenciado por Syd Barrett, fez-se sentir no seu disco de estreia, Cabinet of Curiosities, um dos discos do ano para o Altamont, no qual fizemos uma grande viagem pelo surreal e onírico. Dois anos após o seu primeiro trabalho, seguiu-se Hypnophobia, uma boa continuação daquilo que Jacco nos havia mostrado, tendo começado a explorar mais o lado instrumental.
No entanto, a grande surpresa veio este ano com Somnium, um disco totalmente instrumental e, acrescentamos, experimental. Mais que viagens surrealistas por florestas ou lagos, Jacco leva-nos a um mundo mais futurista e maquinal, onde se nota a influência do krautrock, especialmente de Tangerine Dream (“Rising”), Neu! (“Eclipse”) ou até de Mike Oldfield (“Privolva”). A falta de letras nas músicas faz com que este disco perca em comparação com os trabalhos anteriores. É um bom álbum de experimentação mas faz muita falta a voz de Jacco a guiar-nos por viagens que nos faziam lembrar os nossos tempos de criança.
Ao contrário de Endless River dos Pink Floyd, praticamente todo instrumental, onde a música e os arranjos fazem o necessário para nos sentirmos no universo Floyd e não precisarmos propriamente da música cantada, em Somnium sentimos um certo abandono de Jacco. Esperamos que da próxima vez não nos abandone num chalé na floresta apenas com os instrumentos ligados…
Morphine – Cure for Pain (1993)
Um falso jazz que é, na verdade, rock sem guitarras. À originalidade dos timbres junta-se a grandeza das canções.
No primeiro álbum, os Morphine já tinham inventado a sua imagem de marca: a única banda no sistema solar a ter apenas um saxofone, uma bateria e um baixo de duas cordas. Mas Good era demasiado delicado para que o mundo lhe prestasse atenção. Tudo mudou com o roqueiro Cure For Pain. No centro estão os riffs musculados do baixo e do saxofone, tresandando a blues e a poeira da estrada. O baixo é agora distorcido, lançando chispas com o seu slide feroz. O saxofone é mais rítmico e groovy, e o novo baterista – mais enérgico e possante. Conseguir ser tão inequivocamente rock’n’roll sem uma única guitarra é a sua grande proeza e blasfémia.
Não se deixem ludibriar pelo saxofone. Do jazz, vão buscar apenas o imaginário e não a linguagem. Tudo neles nos transporta para os clubes de bebop dos livros do Kerouac: fumarentos, noctívagos, ensopados em whisky e transgressão. A aura beatnick de Mark Sandman também ajuda, orgulhosamente anacrónica, mais próxima da North Beach dos anos 50 do que da flanela grungy dos anos 90. Uma pitada de sensibilidade noir faz o resto: a sensualidade do saxofone traz o perfume inebriante de uma mulher fatal.
Toda a grandeza dos Morphine decorre das limitações que eles se impuseram a si próprios. Fazer um instrumento com apenas duas cordas soar cheio e relevante não é um desafio fácil, como também não o é rockar sem uma única guitarra. A escassez aguça sempre o engenho.
A malta mais arty preferirá os mais experimentais Good e The Night. Quem, contudo, der primazia à beleza e eficácia pop das canções, terá aqui o seu álbum favorito. Na dúvida, ouçam todos, pois a memória desta grande banda dos nineties está a desvanecer-se. Não deixem Mark Sandman morrer outra vez.
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