As Bodas de Ouro de um dos mais importantes registos fonográficos da década de 60, comemoradas com uma edição de colecionador. Imperdível.

Na última metade do século assistimos a tudo: discos que chegam com estardalhaço e se transformam, instantaneamente, em novos-clássicos; discos atónicos e sem qualquer relevância artística; e discos que, não obstante o seu primor estético e lírico, estão de tal forma deslocados do seu tempo que ganham estatuto de culto muitos anos após o seu lançamento. Com efeito, The Kinks Are The Village Green Preservation Society conquistou esse estatuto a pulso.

Lançado a 22 de Novembro de 1968, pela Pye Records, e apesar de amplamente elogiado pela crítica da época, confrontou-se, desde cedo, com um rol de problemas de afirmação no mercado discográfico. Entalado entre os gigantes do heavy-psyche da época, o álbum parecia pairar na cena londrina com a elegância de um dandy.

Mas a Beat Generation tinha agulhas apontadas para outras moradas. Com o adensar dos problemas sociais e políticos, na Velha Albion e no mundo, tornara-se mais colérica e belicosa. E a música que procurava teria de reflectir esse lado combativo e profusamente heteróclito. Jimi Hendrix com Electric Ladyland, Led Zeppelin com o álbum homónimo, e o The Beggars Banquet dos Rolling Stones, respondiam aos seus anseios. Ao invés, os irmãos Dave e Ray Davis preferiram a delicadeza e a sofisticação melódica à agressividade dos seus congéneres.

Num registo em que, podemos afirmá-lo, a transcendência supera a imanência, os The Kinks procuraram coarctar as suas composições àquilo que verdadeiramente julgavam essencial, resistindo à tentação de dedicar, em cada tema, litanias abstrusas e estéreis aos “infiéis” contrarrevolucionários do capitalismo moderno. Ao invés, a entoação sardónica de que se revestem grande parte das composições torna-se aqui evidente e percebe-se, assim, que as facécias existentes em anteriores registos da banda não eram acidente de percurso mas, sim, linguagem própria e assumida. São disso exemplo os temas “Do You Remember Walter?”; “Picture Book” e “Animal Farm”, que, apesar disso, não descuram nunca os magníficos arranjos multi-instrumentais.

Agora que o álbum completa cinquenta anos de existência, a Sanctuary Records prepara-se para lançar uma Box comemorativa com três CD’s e memorabilia da banda, fazendo as delícias de quem, como eu, aprendeu a venerar este registo e a considerá-lo um dos mais importantes no desenvolvimento do indie rock, na década de 80.