De entre a incrível lista de discos históricos que Jorge Ben lançou, África Brasil representa um marco incontornável.
África Brasil é o décimo quarto álbum do carioca Jorge Duílio Lima Meneses, um dos maiores ícones da música brasileira (e, quiçá, mais além). Assumindo o nome artístico de Jorge Ben e posteriormente em Jorge Ben Jor, começou a contribuir para o espólio da MPB no longíquo ano de 1963, com Samba Esquema Novo. Em pleno apogeu da bossa nova, Jorge Ben soube entrelaçar a forma delicada de cantar de João Gilberto com a ginga que pululava no morro, imiscuindo samba e violão como só ele sabe.
Fast forward para treze anos mais tarde e eis que o violão ficou no canto do estúdio, aparecendo no seu lugar de forma definitiva a guitarra elétrica. Conjugando filosofia, história e futebol nas suas letras, Jorge Ben faz o seu trabalho de alquimista, transformando em ouro o seu labor como artesão sonoro. A lista de personagens que “aparecem” em África Brasil vai de Alexandre, o Grande a Zico, de um mítico Hermes Trismegisto a Xica da Silva, de Zumbi ao par Shah Jahan e a sua adorada Mumtaz Mahal, a batedeira de Jorge Ben tudo permite. Tal como as sonoridades que Jorge Ben trouxe para o disco.
Com mudança de produtor (Paulinho Tapajós, que vinha trabalhando como produtor nos álbuns anteriores, foi substituído por Marco Mazzola) e com o recrutamento de três nomes que começavam a aparecer na cena musical brasileira, o salto qualitativo foi evidente. O pianista José Roberto Bertrami, que já havia gravado com artistas como Raul Seixas, Rita Lee e Elis Regina, contribuiu nas faixas orquestradas com o sintetizador, instrumento que foi posteriormente utilizado largamente nos discos de Ben na década de 80. O saxofonista Oberdan Magalhães fundou um ano depois o grupo de música soul brasileira instrumental Banda Black Rio, dando a África Brasil o seu vigor afro-brasileiro. Por fim o baterista Wilson das Neves é, só por si, uma pérola.
Percorrendo o tracklist do álbum damos connosco a salivar com a quantidade de canções marcantes até aos dias de hoje, casos de “Taj Mahal”, “Ponta de Lança Africano”, “Xica da Silva”, “O Filósofo”, não dá para parar. Mesmo as mais escondidas/desconhecidas são pequenas preciosidades que Jorge Ben partilhou com a humanidade, “Camisola 10 da Gávea” dedicada a uma performance estonteante de Arthur Antunes Coimbra no mítico estádio do Flamengo é mais um exemplo. “Meus Filhos, Meu Tesouro” é um samba onde a cuíca domina o ritmo, um groove que tresanda a suor de Carnaval.
Por fim e para fechar com chave de ouro, neste disco Jorge Ben refaz a música “Zumbi” (previamente lançada em A Tábua de Esmeraldas) como “Africa Brasil (Zumbi), em uma versão bem mais abrasiva, com a voz oscilando entre a angústia e a raiva, seminal para novas correntes como rap e hip hop que iriam começar a aparecer uns aninhos depois. A herança afro-brasileira foi mostrada em plena ditadura com todo o seu vigor e passada adiante como uma tocha olímpica para outros que a carregaram mais à frente.
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