Os Glockenwise formaram-se na margem. Na margem geográfica, em Barcelos, uma pequena cidade industrial no Minho, onde a ideia de passar pela vida com anseio de fazer música – ou qualquer outra arte, para o efeito – era, ainda nos anos 2000, relativamente exótica… e na margem estética, forjados na energia inconformista do punk, sempre pontuados por uma característica melancolia que serviu de fio condutor até à identidade sonora presente, e que os tem vindo a demarcar de classificações mais evidentes.
No princípio, fugir da margem era um incentivo poderoso para fazer música, e era o tema fundamental do lirismo associado, “How to get out? Out of this town?”, cantavam em “Columbine”.
“Gótico Português” é, se não um regresso, um olhar apreciativo da margem. Há um Portugal a fervilhar na margem, abundante em manifestações culturais interessantes e bizarras, rico e diverso em tradições visuais e orais. Onírico, criativo e surpreendente. Há um Portugal esquecido na margem, sedento de representação, mas obstinado, que se arregaça para ocupar de forma inventiva o vazio deixado pelas carências materiais, culturais e metafísicas.
Para os Glockenwise, quase como que por epifania, tornou-se claro o paralelo entre esta atitude voluntarista e criativa – que vai da olaria de Rosa Ramalho às bênçãos de Alexandrina de Balazar – e a cultura de música Do It Yourself, que lhes permitiu transgredir os limites que pareciam à partida impostos.
Os temas “rosa e a terra”, “rosa e o galo” e “rosa e a arte” são excertos de uma reportagem de 1968 por Carlos Simões em São Martinho de Galegos, concelho de Barcelos, com a ceramista Rosa Ramalho, numa marcante identidade de quem está na margem.
“Gótico Português” tem edição agendada para 17 de fevereiro pela editora Vida Vã.
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