quarta-feira, 26 de abril de 2023

Okvsho – Kamala’s Danz (2020)

 

Num mundo musical onde o processo de descoberta dos artistas parece estar cada vez mais facilitado pela Internet, os Okvsho nasceram, e estão a crescer.

Graças à internet, uma boa parte do jazz está a viver tempos eufóricos, de rapidez criativa e de velocidade na produção. Ao longo dos últimos anos, tem sido cada vez mais comum encontrar projetos nu-jazz com indiscutível qualidade um pouco por todo o universo musical, que se afigura cada vez mais digital.

Através dos algoritmos das plataformas de streaming, chegam-nos os artistas, que misturando o jazz com a eletrónica, a eletrónica com o soul, e o soul com o funk, começam a ficar nos radares e nas playlists de quem os ouve. Tom Misch (e companhia) é, provavelmente, o exemplo mais forte do fenómeno a que me refiro, mas há mais músicos que provam que a música que junta hip-hop, jazz e disco está cada vez mais na moda.

Estamos perante um género musical que, em pleno século XXI, revitalizou a parte sul da cidade de Londres! Isto quer dizer alguma coisa. Esta maneira de viver e fazer jazz, no entanto, não vive apenas na capital inglesa; encontramo-la um pouco por todo o mundo.

Há dois anos, em Zurique, os irmãos Okvsho lançavam o EP Traphouse Jazz, e deram os primeiros passos na passadeira da popularidade. Em Portugal, a rádio Oxigénio tratou de puxar muitas vezes esse disco, e fê-lo na esperança de estar a desvendar um novo grande nome desta cena jazz (à qual eu gosto de chamar “internet jazz”). Agora, em 2020, o duo lançou Kamala’s Danz, e as reações têm sido bastante positivas.

Agora que podemos avaliar a performance destes dois miúdos tendo uma longa-produção nas mãos, temos a possibilidade de ser mais críticos e precisos na recessão. Um dos melhores elogios que podemos oferecer a Kamala’s Danz é o facto de ser um disco muitíssimo agradável; é uma companhia perfeita para qualquer ocasião: para dias bonitos de sol e para dias de chuvas intermináveis. Musicalmente, é um trabalho conciso. É, sem dúvida, uma produção muito bem conseguida, na qual ficamos com a ideia auditiva de que tudo (os sons, os instrumentos, as passagens e os ritmos) está no sítio certo, à hora certa.

As duas primeiras faixas (“Moksha/Liberation” e a homónima “Kamala’s Danz”) constituem uns ótimos 10 minutos no total, onde quem reina é a articulação musical: se a primeira tem ritmos mais mexidos, a segunda – com o apoio de um trompete longínquo e de um contrabaixo bem próximo dos nossos sentidos – acalma a nossa batida cardíaca.

Em “Sway” entramos no planeta hip-hop. E, em “LS Shuffle”, depois de termos saído da cidade urbana construída na faixa anterior, damos por nós na selva, a cortar mato com a nossa catana em forma de phones. O interlúdio que “Luis Leads To The Galaxy” constitui é um dos melhores momentos do álbum; de repente, parece que o piano de Bill (Evans) e o trompete de Miles (Davis) entram num bar, às tantas da noite, e ficam a conversar em silêncio.

Em “Descobrir”, Serya, que já nos tinha feito companhia em “Kamala’s Danz”, canta… em português. Este é outro grande momento. É difícil não apreciar esta balada eletrónica, que, tendo o poder  do som do vento e das ondas, esvazia os nosso pensamentos, e faz-nos sonhar.

Se já tínhamos estado na selva, e se, depois disso, à beira-mar numa deserta praia brasileira, agora estamos a beber uma cerveza fresca numa qualquer vila sul-americana, árida, mas cheia de cor: “Danza De La Sombra” aproxima-se do fim do álbum.

“Thé Froid” é a penúltima faixa e, aqui, contamos com a colaboração vocal de MATONDO (que ninguém diria que é suíça; mais parece ter vivido toda a sua vida numa New York dos 2000’s).

Quando o álbum termina, sentimo-nos revitalizados, com mais energia do que a que tínhamos no início. Kamala’s Danz é um álbum delicado, sendo uma daquelas produções que tem o poder mágico de agradar a todos – é um feito raro e, que por isso, merece ser referido.

Num mundo musical onde o processo de descoberta dos artistas parece estar cada vez mais facilitado graças pela Internet (… o que não garante diretamente qualidade!…), os Okvsho nasceram, e estão a crescer. Em apenas dois anos, voltaram ao estúdio, refinaram as suas intenções musicais, e, mantendo-se fiéis àquilo que já tinham feito no seu (bom) EP de estreia, procuraram criar um álbum com uma estética instrumental própria e característica.


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