Stella Donnelly é mais uma jovem adulta de guitarra na mão, é verdade. Mas esta não canta só breakup songs com dedilhados cliché, ao contrário de 95% das cantautoras de hoje. Em Beware of The Dogs, o seu disco de estreia, a australiana é doce, sim, mas é mordaz e espevitada, petulante e divertida nas canções de amor, ao longo de 13 temas. Apesar de não trazer nenhuma novidade musical, Donnelly consegue agarrar-nos, contando-nos a sua história: como conseguiu empoderar-se através das suas vulnerabilidades.
“Eu uso o meu vibrador a pensar que és tu”, declara Donnelly ao seu novo amor em “Mosquito”, admitindo estar de tal forma inebriada pela paixão que chega a ser chata como “um mosquito da malária”. Além de saber contrariar Pessoa, provando que é possível escrever cartas de amor que não são ridículas recorrendo a estrofes masturbatórias, Stella Donnelly vai além da lamechice. Quando não fala de relacionamentos, tenta surfar a onda do #MeToo: “Rapaz, se voltas a tocar nela, eu conto à tua mulher e filhos”, canta em “Old Man”, uma canção que é uma ameaça contra um pivot de televisão que abusa sexualmente de mulheres. “Se pões a tua pila na cara de alguém, os teus traços de personalidade não contam (…) Tens medo de mim, seu velho, tens medo do que eu possa fazer?”
Antes que revire os olhos, caro leitor conservador, não pense que este é o típico álbum feminista. Donnelly é tão doce como uma Dolly Parton nos 70’s, aquela que pedia à “Jolene” (a da canção) para não lhe roubar o marido. Neste caso, Donnelly pede outra coisa: com a doçura de uma fada do lar, toca progressões de acordes comoventes e pede aos machistas e abusadores para se irem foder. E não só: ao longo do disco, a australiana faz o mesmo a um familiar (“Season’s Greetings”) e ao chefe que não lhe paga e que passa o dia inteiro a masturbar-se em frente às câmaras de vigilância. (“U Owe Me”): “You’re jerking off to the CCTV · While I’m pouring plastic pints of flat VB.”
Acima de tudo, o indie pop de Stella Donnelly é viciante. Os refrões e melodias ficam na cabeça e a voz, que ainda não impressiona, tem qualquer coisa de especial. Com este disco em 2019, Donnelly juntou-se ao leque de artistas australianas que está a dominar o mundo. Courtney Barnett, Tame Impala, Julia Jacklin e King Gizzard & The Lizard Wizard… e a lista parece que não vai parar por aqui. O que é que se passa com o abastecimento público de água na Austrália?
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