The Blue Hour é quase uma ópera rock. Denso, negro, para ouvir de uma assentada, só aqui e ali há sinais dos Suede mais pop e luminosos – felizmente nada há a temer porque a nova vida dos londrinos continua feita de intensidade e bom gosto.

Já quase tudo foi dito sobre a segunda vida dos Suede: o regresso aos palcos após sete anos de pausa deu-se em 2010, e três anos depois surgia Bloodsports. Outros três anos foi o tempo necessário para um novo álbum, Night Thoughts, e apenas dois mediaram esse disco e a novidade The Blue Hour, por estes dias editado.

Alerta para quem – lamentavelmente – ainda não tomou contacto com a nova vida dos Suede: a pop mais soalheira é miragem e agulha em palheiro: pontualmente existe, a guitarra de Richard Oakes ainda dá uns ares de felicidade, as melodias ainda são, aqui e ali, facilmente memorizadas, mas os Suede desta década são uma banda maior, crescida, ainda inventiva mas mais exigente do que nunca, até mais do que no híper-conceptual e artístico Dog Man Star, de 1994, então o segundo de originais.

É com esse disco que The Blue Hour mais se assemelha: trabalho quase sem pausas, o novo dos londrinos é ambicioso, pujante e revigorante. Mostra uns Suede vivos, atesta a reinvenção da banda iniciada em 2013 mas vai buscar o imaginário negro já vivido em 1994 – na altura a banda vivia rodeada de heroína e crack, agora há pais de família, nomeadamente o vocalista e centro-de-tudo Brett Anderson, e tudo é diferente.

Cordas, muitas teclas (este é o disco em que mais se sente a marca do teclista/guitarrista Neil Codling), alguns coros, spoken word e muita epicidade, meio caminho entre o anúncio de after-shave e um filme de época sobre a guerra de Tróia: boa parte de The Blue Hour é isto, embora por cada “As One” ou “Flytipping” haja espaço para sussurros e murmúrios como “The Invisibles” ou “Tides”.

Não é com o novo disco que os Suede vão conquistar novos fãs. O tempo, fora de Londres e meia dúzia de bairros saudosos da pop britânica dos 1990, não está para bandas assim. Os fãs do passado, contudo, têm muitos motivos para sorrir: o regresso do grupo fez-se, felizmente, de redobrada criatividade em disco e não somente de concertos de reviver de memórias, o que só por si, admitamos, já não seria nada mau.

Os Suede nunca inventaram a roda mas foram felizes, no arranque de carreira, em reinventar os mestres (David Bowie, The Smiths) e são eficazes no tempo presente, no concretizar de um processo de autorregeneração. As temáticas das músicas evoluíram, como a vida de Brett Anderson e companheiros – e a nossa – avançou: já não somos os mesmos mas partilhamos todos, ainda, qualquer coisa de especial que não sabemos bem o que é. Mas ouvir os Suede é ainda, para os fãs, um bálsamo inestimável. Assim continue.