No seu quinto registo na banda que criou em 2006, Damon McMahon permanece firme, mas, no entanto, não evoluiu nem cresce, lançando um disco que não ofende nem surpreende, não choca nem desagrada, que se escuta mas não se recorda. Ouve-se, que é talvez um dos mais neutros adjetivos com os quais se pode classificar um álbum.

Em outubro de 2014, Taylor Swift assumiu o trono das rádios comerciais um pouco por todo o mundo com o lançamento do seu quinto álbum de estúdio, 1989, que produziu pelo menos uns quatro ou cinco singles loucamente orelhudos aos quais foi impossível escapar nos anos que se seguiram. Dominavam a rádio, a internet, a televisão, a publicidade, as festas, os jantares, até as conversas daqueles que ainda pregam um olho distraído nas últimas tendências do tirano mundo da música dita popular. Dominavam até o espaço daqueles que se escondem por entre as sombras do mundo da assim chamada “música alternativa”, e alguns destes eremitas musicais até se viam na tão aterrorizante situação de ocasionalmente, sem ninguém a ver, entoar um refrãozinho apanhado numa estação pela qual passavam distraidamente no carro, antes de se aperceberem, petrificados, do que cantavam, e calarem-se de imediato. Felizmente, a salvação deste exercício exaustivo de auto censura estava a chegar; pois em setembro do ano seguinte, um dos meninos bonitos do rock independente alternativo americano, Ryan Adams, vestia a camisola da coragem e lançava uma cópia exata do disco da senhora Swift, convertendo o seu pop cor-de-rosa de pastilha elástica em versões de guitarradas springsteenianas e vocais torturados inventados pelos homens tristes da música alternativa.

Finalmente, rejubilavam-se os tímidos fãs, alguns homens crescidos; agora posso gostar de Taylor Swift em paz, porque, afinal de contas, já não estou a ouvir uma miúda pindérica de saias a cantar sobre corações partidos e amores desencontrados – estou a ouvir um homem feito a cantar sobre exatamente a mesma coisa, a dizer as mesmas palavras e a suspirar as mesmas melodias orelhudas, só que, desta vez, sob o pano de fundo de uma guitarra, um baixo e uma bateria. Alguns apelidaram a versão de Adams como superior, dotando-a de uma sinceridade que não conseguiam localizar na pop explosiva da senhora Swift, com os seus cinquenta produtores, letras escritas a quatro mãos e sintetizadores que não existem fora de um ecrã de computador. Mas onde localizamos a sinceridade naquilo que não é mais de uma cópia adulterada para agradar a quem tem vergonha de gostar do que passa na rádio de todos?

O que mais lembra Freedom, o mais recente álbum de Amen Dunes, lançado no passado dia 30 de março pela Sacred Bones Records, é talvez este disco de Adams. A banda de Damon McMahon distingue-se, obviamente, por nos trazer onze temas originais e novos que em parte nenhuma foram escritos por mais ninguém. Mas o quão originais ou novos são, na verdade? Após uma faixa de abertura na qual um sample de uma voz de criança parece prometer que nos devemos preparar para algo verdadeiramente revolucionário, seguem-se os restantes dez temas, que vão tombando uns nos outros sem que nenhum mereça atenção particular, no bom ou no mau sentido. Estão lá os ingredientes todos alinhados para criar uma banda de palco secundário de festival de verão: os riffs tocados sem erro, a bateria certinha, a voz ligeiramente anasalada de McMahon, voz de quem não se esforça demasiado, porque, afinal de contas, o rock é a arte de descontração, as letras que não saem nunca do quotidiano, que não aleniam nem emocionam – “I’ve got money ‘cause i work all day / don’t get down a mile away / when evening comes / i go call up the band”, por exemplo, que pode ser escutada no primeiro single do novo álbum, “Blue Rose”.  É exaustivo tentar encontrar uma descrição distinta para o segundo, “Miki Dora”. Assim como para as restantes faixas do disco, que seguem todas a mesma fórmula matemática que não cansa mas também não motiva. Com todas as influências certas vertidas cuidadosamente para dentro das suas novas músicas, falta-lhes tudo o que elevou estas do plano de meros músicos para referências artísticas reconhecíveis: o charme narrativo de Springsteen, a poesia observacional de Dylan, o poder da canção simples mas eficaz de Buckley.

Amen Dunes sempre foram, e, talvez, agora, mais do que nunca, tudo o que faz uma banda e que a desfaz um ano depois, até lançarem mais um disco e o mundo se lembrar mais ou menos da sua existência: são sinceros, mas não têm nada de novo a declarar; fazem músicas minimamente agradáveis mas que nunca deixam de ser ruído de fundo numa festa até que alguém se lembre de meter outra coisa a dar; tocam bem os seus instrumentos mas não melhor do que qualquer par de putos enfiados numa garagem algures; chegam para satisfazer quem tem vergonha de ouvir Taylor Swift mas que não tem tempo para procurar música demasiado alternativa; não são péssimos, porém não são óptimos. Freedom é, assim, como se costuma dizer, um álbum para todos – ou seja, um álbum para ninguém. E isso não é mau, mas também não é bom.