A melhor banda do mundo que o mundo não conhece brinda-nos com o seu terceiro álbum. Ou melhor, a sua terceira pérola.
Comecemos por relembrar as pérolas anteriores, More Than Any Other Day, e Sun Coming Down, que muito nos alegraram em 2014 e 2015, respectivamente. Pelo meio, o vocalista Tim Darcy ainda lançou um álbum a solo, mostrando que veia artística e inspiração não lhe faltam. Outra coisa que não falta à banda é coragem. Coragem de experimentar coisas diferentes, introduzir novos elementos, arriscar mudar. A expansão sónica relativamente aos álbuns anteriores é notória, e vão desde a utilização de saxofone, clarinete, coros, até à forma diferente de Darcy na utilização da voz. Onde o instrumento voz era utilizado de uma forma quase sempre falada, agora é utilizada na forma cantada com um à vontade assombroso.
Os Ought são uma banda fora do seu tempo, já que entre 2018 e 1980 vão três, ora três vezes seis 18, 18, bem é fazer as contas, alguns anos, e hoje praticamente ninguém quer saber de new wave para nada. Os Gang of Four são uma relíquia do passado que só alguns seres iluminados conhecem, Mark E. Smith morreu mas há mais notícias sobre o Festival da Canção do que sobre música. O lado entretenimento claramente venceu o lado artístico e quem ousa dizer mal é rotulado de intelectual ou snob e chutado para canto. Felizmente, há-de sempre haver uma resistência às forças vigentes, seja na forma de um mestre Jedi, de uma aldeia gaulesa, de um João César Monteiro, de uma banda baseada no Canadá chamada Ought (aqui considerada a última banda rock com veia crítica sobre a sociedade).
Em Room Inside the World, os Ought são menos políticos, e percebe-se. Hoje em dia, e sobretudo nos Estados Unidos, tornou-se facílimo apontar o dedo ao cenário actual. Ainda assim, uma música de nome “Disgraced in America” não precisa de palavras explicativas. Um dos pontos fortes da sonoridade dos Ought são as variações de ritmo dentro de uma só música – o exemplo mais premente de como fazer isto é “Disaffection”, uma malha pós-punk que a meio quebra, como que para carregar as baterias para novo arranque, enquanto se afirma “Well here’s some liberation, you can order it online” ou “Well here’s some medication, you can get it through the phone”. Mais à frente há sintetizador a marcar o ritmo em “These 3 Things” no que poderia ter sido um hino synth-pop, se feito na sua altura. “Take Everything” tem laivos psicadélicos que, a pouco e pouco se desmontam, transformando-se numa balada que inquieta a alma de quem a canta “And the soul’s indecision/ Keeps you at bay”.
E deixo para o fim o ponto alto do álbum, e, quiçá, da carreira dos Ought. “Desire” é um portento de música a todos os níveis – elegante, sensível, aos poucos a ganhar corpo, metendo ao barulho um coro que lhe dá uma intensidade arrebatadora. Há um escriba aqui no Altamont que desmonta bandas com um simples argumento – “Não tem canções”, diz ele. Pois bem, se padeciam desse mal, os Ought acabam de o calar com esta canção maior que a vida sobre um amor destruído.
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