Resenha
Pale Communion
Álbum de Opeth
2014
CD/LP
Dentro da nova abordagem que a banda decidiu seguir a partir de Heritage, sem dúvida alguma, é onde eles mostraram seu maior potencial
Dentro da nova proposta musical do Opeth, Pale Communion certamente foi um longo passo adiante. Se alguma coisa mudou desde 2011, é que o Opeth se tornou confiante o suficiente neste novo estilo para finalmente abrir suas asas e escrever composições encorpadas sobre as ideias individualmente atraentes que pontilhavam Heritage. O que isso quer dizer? Que a banda estava soando com uma melhor capacidade para agradar aqueles que se desapontaram com a música entregue em seu disco anterior. De certa forma, Pale Communion mostra que a antipatia por Heritage tinha menos a ver com o estilo em si e mais com uma espécie de falta de coerência e convicção em relação ao que a banda estava fazendo. Obviamente, falo isso em caráter pessoal e baseado em muitos comentários de quem não gostou de Heritage – o que não foi o meu caso. Se tem algo que eu considero uma das maiores virtudes de Heritage, é o seu senso no geral de surpresa e estranheza, sendo que a banda conseguiu consolidar isso em Pale Communion, enrijecendo-a com as virtudes e formas sólidas com que as composições são entregues. É possível perceber uma grande quantidade de atmosferas de rock progressivo clássico que vão desde o King Crimson, passando pelo Jethro Tull ainda que em menor escala e chegam até o rock progressivo italiano, porém, dentro de uma energia única que por vezes acaba superando o que podemos associar com a cena progressiva retrógada. Produzido por MIkael e mixado por Steven Wilson, acaba não sendo nada surpreendente que o disco entregue uma sonoridade fina, detalhada e visceral que combina perfeitamente com a música abordada pela banda. A classe da musicalidade é excelente e as performances instrumentais são orgânicas e compactas, enquanto o vocal de Mikael são distintos e entregues com convicção. Um outro ótimo recurso encontrado na música de Pale Communion são os vocais de apoio e as suas harmonias. “Eternal Rains Will Come” começa o disco por meio de uma sonoridade bastante complexa executada em uma excelente união entre teclado, bateria e guitarra. Então que a peça se acalma por alguns instantes antes de regressar ao ritmo mais intrincado. Os vocais são ótimos, sendo bastante cativantes e bem-organizados. Em sua melodia principal, também há um uso massivo de mellotron - algo que é muito bom. Na sua parte final a banda entrega uma instrumental bastante intensa. “Cusp Of Eternity” foi o single do álbum, então temos aqui uma música fácil de digerir. Possui um ritmo constante e inquieto, soando como um heavy metal mais clássico e direto, apesar, por exemplo, da influência fusion da guitarra em alguns pontos – solo principalmente. A seção rítmica é brilhante e novamente o uso de mellotron soa esplendoroso. “Moon Above, Sun Below”, com quase 11 minutos é a faixa mais longa e diversa do disco – incluindo os vocais de Mikael que soam bem diversificado durante toda a peça. Logo nos seus primeiros segundos é possível perceber um grande aceno ao som do Riverside. É cheia de voltas e reviravoltas silenciosas como é de se esperar de uma peça desse tamanho. O solo de guitarra por volta de 4:20 mostra o quanto Fredrik Akesson é um músico excelente e que apesar de ser considerado um guitarrista de metal, possui uma grande influência no jazz fusion, como, por exemplo, em Allan Holdsworth. Seção rítmica sólida, guitarras muito bem desenvolvidas e até alguns ataques mais densos de um teclado sinfônico, tudo sempre muito bem equilibrado e coeso. Belíssima peça. “Elysian Woes”, logo no começo é possível perceber uma vibe bastante forte da música encontrada em Damnation. A riqueza dos violões é de uma elegância tão grande que é possível lembrar do Genesis – tanto com Phillips quanto com Hackett. A seção rítmica é melodiosa e o uso de mellotron é muito refinado. Os vocais de Mikael transmitem melancolia e dor, completando a construção de uma música de beleza ímpar. “Goblin” não possui esse nome por acaso, pois é uma homenagem a banda italiana de rock progressivo. Inclusive, nem parece ser uma peça do Opeth, soando muito mais como uma banda de jazz fusion dos anos 70. Uma jam instrumental que ressalta os talentos musicais de todos da banda, mas eu destaco principalmente o trabalho das teclas, como o piano elétrico e órgão. Sem dúvida a música de maior essência progressiva do disco. “River”, lembro quando ouvi essa música pela primeira vez, ela me fez associar algo que jamais imaginaria, a The Allman Brothers Band em uma peça do Opeth, mas sim, a sua veia country faz com que a banda dos irmãos Allman venha em mente. Porém, também lembra algo que o Steven Wilson criaria. Positiva e otimista, soa muito diferente do que esperamos de uma música do Opeth. Excelentes órgãos e mellotron, belos licks de guitarra, linhas sólidas de baixo e uma bateria que embora não brilhe, entrega exatamente o que a música pede. Em determinado momento, a música entrega uma atmosfera mais obscura, talvez unicamente para não esquecermos que estamos diante de uma peça do Opeth. “Voice Of Treason” possui uma agressividade já conhecida da banda, porém, sem o uso dos vocais de death metal – o que acaba não soando muito bem. Mas mesmo assim, ainda há bons atrativos, como, por exemplo, uma seção rítmica que é bastante dinâmica, principalmente a bateria que consegue soar simples mesmo dentro de uma sonoridade complexa. Os vocais por vezes dolorosos de Mikael, também merecem elogios. Mas no geral, se for pra escolher a peça menos interessante do disco, fico com essa. “Faith In Others” é a última peça do disco e que o finaliza de maneira grandiosa. Mellotron espacial, vocais dolorosamente lindos e uma batida quase fúnebre, esses são apenas alguns dos ingredientes que fazem com que “Epitaph” do King Crimson – pra mim, uma das músicas mais belas existentes - venha em mente. Muito emocional, soa bastante diferente do que podemos esperar de uma composição do Opeth. O arranjo sinfônico que permeia basicamente toda a música e tocado pelo convidado Dave Stewart é simplesmente brilhante e sinistro em certos pontos. O disco não poderia chegar ao fim de maneira melhor. Tudo bem que Pale Communion jamais alcançará a aclamação de discos como Blackwater Park ou Still Life, mas dentro da nova abordagem que a banda decidiu seguir a partir de Heritage, sem dúvida algum é onde eles mostraram seu maior potencial. Enquanto Pale Communion certamente se aprofunda na cena do rock progressivo, hard rock e até no jazz fusion dos anos 70 em busca de inspiração e apresenta um som retrô, eles fazem isso de uma forma mais natural e bem-acabada do que em seu antecessor.