sábado, 5 de agosto de 2023

BIOGRAFIA DE Nando Reis

 

Nando Reis

José Fernando Gomes dos Reis (São Paulo12 de janeiro de 1963), conhecido artisticamente como Nando Reis, é um cantorcompositor e produtor musical brasileiro.

Foi membro da banda Titãs entre 1982 e 2002.

Biografia

Carreira

Nando Reis era percussionista e crooner da banda de salsa Sossega Leão quando os Titãs foram formados. Na primeira apresentação pública dos Titãs, ele figurou como baterista. Após o lançamento do primeiro disco deles, ele chegou a sair do grupo por duas semanas, preferindo o Sossega Leão por razões financeiras, mas acabou mudando de ideia e foi aceito de volta.[1]

Saiu dos Titãs após a gravação do álbum A Melhor Banda de Todos os Tempos da Última Semana, em 2001. Na época, alegou "incompatibilidade de pensamento", e informou que ainda estava abalado pela morte dos amigos Cássia Eller e Marcelo Fromer.[2] Em entrevista posterior, afirmou que sua saída se deveu também à sua vontade de se dedicar mais à sua carreira solo - chegou a propor à banda que pausassem suas atividades por um ano após o lançamento do álbum.[3] Afirmou ainda que seu isolamento como compositor na banda vinha crescendo, o que era evidenciado pela quantidade de músicas escritas apenas por ele nos últimos álbuns.[3] Hoje, o músico e a banda já voltaram a se falar normalmente,[3] e Nando participou do show de 30 anos de carreira dos Titãs que ocorreu no Espaço das Américas, em São Paulo, na noite de 6 de outubro de 2012.[4]

Em 2001, foi indicado ao Prêmio Multishow de Música Brasileira na categoria "Revelação solo", mas Wanessa Camargo se sagrou vencedora.[5]

Teve uma participação breve em um trabalho envolvendo a dupla sertaneja Zezé Di Camargo & Luciano. Na fonografia da trilha sonora oficial do filme biográfico 2 Filhos de Francisco, álbum lançado em 2005, interpretou a faixa "O Lavrador", ao lado da filha de Zezé Di Camargo, Wanessa Camargo.[carece de fontes]

Canções suas fazem parte de lançamentos de Skank (os sucessos "É uma Partida de Futebol", "Sutilmente" e "Ainda Gosto Dela") e Jota Quest ("Do seu lado").

Em 10 e 11 de agosto de 2010, gravou o DVD Bailão do Ruivão, um projeto com músicas nacionais e internacionais com várias participações especiais, como Zezé di Camargo e Luciano, Joelma e Chimbinha (Banda Calypso) e o grupo Zafenate. O DVD foi gravado em São Paulo, no Carioca Club.[carece de fontes]

Em 2012, Nando figurou na lista dos dez artistas que mais lucraram com direitos autorais no primeiro semestre daquele ano, segundo o Ecad.[6][7] Em 2016, estava na 15ª posição do mesmo ranking, além de ser o 6º no ranking de arrecadação com shows e o primeiro no ranking de arrecadação de música reproduzida em locais públicos.[8]

Em 2013, participou, juntamente a Adriana Calcanhotto, de um show de apoio ao partido político Rede Sustentabilidade.[9]

Em 2014, seu álbum Sei Como Foi em BH foi indicado ao Grammy Latino de Melhor Álbum de Rock em Língua Portuguesa.[10] Ainda em 2014, afirmou que entraria em estúdio em 2015 para gravar um novo álbum.[11]

Nando Reis durante show em Brasília, 2014

Em fevereiro de 2016, foi revelado que o álbum teria participações de seus ex-colegas de Titãs Branco MelloSérgio BrittoPaulo Miklos e Arnaldo Antunes (estes dois últimos também ex-membros da banda, embora Paulo ainda a integrasse na época da gravação), além das cantoras PittyLuiza Possi e Tulipa Ruiz.[12] Posteriormente, as participações dos músicos Peter Buck (ex-R.E.M.) e Mike McCready (Pearl JamMad Season), bem como de quatro filhos de Nando (Zoé, Sophia, Theo e Sebastião; estes últimos formam a dupla 2Reis), foi anunciada também.[13]

No mesmo mês, foi anunciado que o cantor, juntamente à banda Os Paralamas do Sucesso e às cantoras Paula Toller e Pitty, participariam de uma turnê promovida pelo projeto Nivea Viva Rock Brasil, que ocorre anualmente desde 2012 e leva artistas para turnês pelo Brasil. A série de sete shows homenageará o rock brasileiro.[14]

Em 2016, foi revelado que Nando participaria de algumas faixas do supergrupo Levee Walkers, formado por Mike McCready, Duff McKagan (Guns N' Roses/Velvet Revolver) e Barrett Martin (Mad Season/Screaming Trees) - este último participou de alguns álbuns de Nando.[15]

Lançou em novembro de 2016 seu novo CD Jardim-Pomar. A capa do álbum foi assinada pela artista plástica Vânia Mignone.[16] No dia 16 de setembro do mesmo ano, lança o primeiro single do álbum: "Só Posso Dizer".[17] Jardim-Pomar foi premiado com o Grammy Latino de Melhor Álbum de Rock ou de Música Alternativa em Língua Portuguesa em 2017.[18]

Em 2017, formou o supergrupo Trinca de Ases com Gilberto Gil e Gal Costa.[19] Em 2018, o projeto dos três artistas se tornou um CD e um DVD, lançados no mês de março[20].

Em outubro de 2018, lançou a música "Rock 'n' Roll".

Em 18 de setembro de 2020, lançou "Espera a Primavera", com participações de Jack EndinoLulu SantosWalter VilaçaCéu e seu filho Theo. A canção faz referência ao "amor multicolor", que segundo ele é uma oposição ao discurso "negacionista, reducionista e obscurantista" que ele acredita estar sendo posto em prática pelo governo brasileiro.[21]

Em 2021, recebeu mais duas indicações na premiação: uma por seu EP em parceria com Duda Beat Duda Beat & Nando Reis, na categoria Melhor Álbum Pop Contemporâneo em Língua Portuguesa; e outra por sua canção "Espera a Primavera", na categoria Melhor Canção em Língua Portuguesa.[22]

Também em 2021, Nando lançou duas regravações de sucessos antigos de sua carreira. Em 11 de junho, relançou, com a participação de Pitty, "Um Tiro no Coração", música outrora executada num dueto de Sandra de Sá com Cássia Eller. Já em 26 de novembro, relançou "Não Vou Me Adaptar", originalmente gravada pelos Titãs no disco Televisão (1985) e escrita por Arnaldo Antunes, que participa da regravação. Ambas as músicas foram lançadas em preparação para a turnê Nando Hits, que estreou no dia 23 de dezembro em São Paulo.[23]

Vida pessoal

Nando é um dos cinco filhos de José Carlos, um engenheiro, com Cecília, que seguiu carreira na fonoaudiologia após uma irmã de Nando ficar surda. Em casa, ela cantava e tocava violão, o que influenciaria Nando e o tornaria admirador de vozes femininas, como as de Cássia e Marisa. Cecília morreu de um câncer fulminante quando Nando tinha 26 anos e preparava o álbum Õ Blésq Blom com os Titãs.[19]

Sua irmã mais velha, Maria Cecília Gomes dos Reis, também conhecida como "Quilha", é escritora, filósofatradutora e professora na Universidade Federal do ABC, tendo lhe dedicado alguns de seus livros e traduções.[24][25]

Chegou a cursar matemática na Universidade Federal de São Carlos por um ano, antes de desistir para dar atenção total aos Titãs.[19][26]

Torcedor do São Paulo Futebol Clube, manteve uma coluna semanal sobre este tema no jornal O Estado de S. Paulo[27] até 2010. Em 2009 lançou o livro infantil Meu Pequeno São-Paulino, pela editora Belas Letras, que fala sobre a paixão de um torcedor pelo São Paulo e as conquistas obtidas pelo time.[carece de fontes]

Em entrevistas em 2010 e 2011, declarou-se ateu[28] e atraído por homens e mulheres.[29] Namorou a cantora Marisa Monte no início dos anos 1990[30].

Foi casado com sua colega de escola Vânia de 1985 a 2003, e depois de 2013 até hoje.[19] Tem cinco filhos: Theodoro, Sophia, Sebastião, Zoé e Ismael. Theodoro e Sebastião também são músicos e tocavam em duas bandas diferentes[31] até se juntarem para formar o grupo 2 Reis.[32] Também tem um sobrinho, chamado Christian. É primo irmão da cantora e compositora Vange Leonel,[1] morta em 2014.

Nando tem uma propriedade em Jaú, estado de São Paulo, onde cria abelhas, mantém uma agrofloresta e recupera a mata ciliar.[33]

Os Infernais

É a banda que atualmente o acompanha em seus shows. A partir do álbum MTV ao Vivo, todos os lançamentos da banda passaram a ser creditados a "Nando Reis e os Infernais" em vez de apenas "Nando Reis". Na época do lançamento de Sim e Não, ele explicou a mudança dizendo: "(...) eu escrevo as canções e a gente decide os arranjos em conjunto. Foi uma percepção gradativa [a mudança de nome de Nando Reis para Nando Reis e os Infernais], quando eu reparei que gostava de ser visto como um artista que tinha um diálogo com uma banda em vez de um artista apoiado por uma banda."[34]

O nome da banda, segundo ele, passa a ideia "de um som quente e profano. Toco violão, mas não faço MPB, meu som é muito mais ligado ao rock."[34]

Antes da banda ser oficialmente formada, o tecladista Alex Veley e o guitarrista Walter Villaça já haviam trabalhado com Nando em seu álbum Para Quando o Arco-Íris Encontrar o Pote de Ouro, gravado em Seattle.[35]

Apesar de Nando morar em São Paulo, a banda é sediada no Rio de Janeiro.[6]

Membros Atuais[carece de fontes]
  • Nando Reis - vocal e violão
  • Walter Villaça - guitarra
  • Felipe Cambraia - baixo
  • Alex Veley - teclado
  • Diogo Gameiro - bateria
  • Gil Miranda - backing vocal
  • Hannah Lima - backing vocal
Ex-integrantes[carece de fontes]
  • João Vianna - bateria
  • Barrett Martin - bateria
  • Carlos Pontual - guitarra
  • Juju Gomes - backing vocal
  • Leonardo Trindade - sopro

Discografia

Ver artigo principal: Discografia de Nando Reis

Álbuns de estúdio

Em parceria com PittyPITTYNANDO


Duran Duran – Rio (1982)

 

Amazing Grace – Aretha Franklin (1972)

 

Guru – Guru’s Jazzmatazz Volume 1 (1993)


 

A feliz junção entre jazz e hip-hop, que continua a dar frutos até hoje.

Em plena explosão do grunge e da britpop, o resto do mundo não estava parado, embora pudesse parecer. Nos EUA o hip-hop estava num momento de viragem sob vários aspectos, ainda centrado nos projectos das primeira e segunda gerações clássicas do estilo, mas ganhando balanço para a explosão mainstream das décadas seguintes. Até que em 1993 surge um ovni que, ouvindo hoje, faz todo o sentido. Guru’s Jazzmatazz é o seu nome.

Guru era um rapper de Boston, metade do duo de hip-hop Gang Starr. Entre discos deste conjunto, decidiu avançar com uma ideia que lhe andava na cabeça havia algum tempo: explorar a fundo as ligações entre duas formas musicais genuinamente afro-americanas, o jazz e o hip-hop. Não foi ele o primeiro a fazer essa ligação, uma vez que esse namoro andava já em curso. A diferença é que, até então, o jazz americano servia sobretudo como uma das fontes onde o hip-hop ia buscar samples e bases musicais. Alguns desses exemplos ouviam-se em trabalhos de grupos como A Tribe Called Quest ou Stetsasonic, entre vários outros. A aposta de Guru, que é descrita pelo próprio logo na faixa introdutória de Jazzmatazz Volume 1, é juntar, no mesmo plano e no mesmo momento, dois géneros marcantes da música negra, ambos partindo da realidade do dia a dia. O encontro seria real, em estúdio.

Para ajudar nesta tarefa, Guru chamou alguns pesos-pesados do jazz, como Donald Byrd, Branford Marsalis, Lonnie Liston Smith ou Roy Ayers. A estes juntou uma série de MC e vocalistas, entre os quais o francês MC Solaar ou N’Dea Dvenport, cantora dos Brand New Heavies. A base rítmica vem da típica batida hip-hop que, juntamente com a instrumentação, acaba por dar a todo o disco um toque de acid jazz. Guru vai aparecendo sempre, aqui e ali, com um estilo laid-back que agora nos lembra coisas posteriores como os saudosos Ithaka, de Darin Pappas.

À distância dos anos, o som pode parecer-nos algo datado e já visto, mas isso foi porque esta série Jazzmatazz teve eco e sucesso, gerando novos capítulos (o volume 4 saiu em 2007) e muitos sucessores. Mais, a solução encontrada de comunhão real entre músicos destes dois géneros não era necessariamente óbvia, até porque muitos músicos estabelecidos de jazz viam o hip-hop e o rap como uma forma menor de música e um downgrade da mensagem musical dos negros norte-americanos.

Agora, quase nos interrogamos como ninguém se lembrou de fazer aquilo antes. Foi Guru quem o fez, e não nos deixou só um grande disco: influenciou nas décadas seguintes o diálogo estreito entre o jazz e o hip-hop. Ouçam-se os fantásticos últimos discos de Kendrick Lamar, com Kamasi Washington e Thundercat a bordo, para encontrar uma das muitas influências que a série Guru’s Jazzmatazz plantou entre nós.



Bob Marley – Survival (1979)

Depois do exílio e do maior sucesso da sua carreira, Marley volta à Jamaica e faz o seu disco mais político, um hino à unidade africana

Bob Marley passou boa parte do ano de 1977 em Londres, depois da tentativa de assassinato sofrida no final de 76, na Jamaica. Esse período londrino deu dois discos: Exodus, de 77, e Kaya, do ano seguinte.  Se o primeiro é considerado por muitos como o trabalho mais bem conseguido da sua carreira, juntando de forma quase igualitária o Marley político e o Marley “romântico”, Kaya ficaria marcado por um som mais leve, mais desprendido, mais “pop”.

Algumas vozes se levantaram, críticas. Estaria Marley, o lutador, conquistado por Londres e pela fama que não parava de crescer, esquecendo a sua mensagem e as suas raízes? Kaya, depois do monumento que era Exodus, parecia dar força a esta teoria, mas na verdade as faixas de ambos os discos foram gravadas na mesma altura, com os mesmos músicos, no mesmo lugar, em Londres. Entre tudo o que foi gravado, Marley e Chris Blackwell, o seu produtor e patrão da Island Records, decidiram o que iria para cada disco.

Esse tempo longe de casa foi, segundo muitos relatos, um período abençoado para Marley. Foi uma forma de processar, lentamente, o atentado que havia sofrido, o significado da sua música, o caminho a seguir. Os anos seguintes seriam importantes por vários motivos, entre eles o regresso à Jamaica, e a participação cívica no violento e efervescente ambiente político local; e a viagem a África, nomeadamente à “pátria espiritual”, a Etiópia, a terra de Haile Selassie, o “santo” da cultura Rasta.

Marley foi a África várias vezes. No final de 78, foi ao Quénia e à Etiópia. Neste país, ficou hospedado numa área gigantesca destinada por Selassie para os povos negros americanos que quisessem regressar a África. Era o centro da ideologia de Marley, a libertação do homem negro que havia sido levado à força para as Américas, e o seu regresso a casa, a África. Não foi a única viagem do músico ao continente. Chegou a ir ao Gabão, convidado pelo presidente Omar Bongo, para tocar na sua festa de aniversário. Bongo era um ditador que oprimia o seu povo, algo de que aparentemente Marley e a sua banda só se aperceberam já no país. Outro facto curioso dessa visita foi o envolvimento amoroso de Marley com a filha do ditador, Pascaline Bongo, que acabou por ser importante no reforço da ligação do cantor ao continente africano e às suas história e cultura. Outra famosa visita foi ao Zimbabué, quando este se tornou independente e largou o nome de Rodésia, vindo depois a ficar nas mãos de Robert Mugabe.

Depois da leveza de Kaya, a resposta teria de vir de todos estes acontecimentos, com África e a Jamaica no centro da acção. Survival, originalmente chamado de Black Survival, seria o primeiro tomo de uma planeada trilogia política que descreveria o caminho do homem negro, da sobrevivência à sublevação (o disco seguinte chama-se Uprising) e, no final, a vitória, a libertação.

Se dúvidas houvesse do sentimento político deste disco, bastaria olhar para a capa. Aí ostentam-se as bandeiras de todos os países africanos, à excepção de um: a África do Sul, sob o domínio do apartheid, ficou de fora da fotografia, e prontamente baniu as vendas do álbum no país. Mas há outra imagem fundamental na capa de Survival: uma faixa a preto e branco, onde surge o nome do disco, e que retrata uma ilustração do que era o espaço de “armazenamento” de escravos que iam de África para a América, a bordo do navio Brookes, de Liverpool, no século XVIII.

Com este enquadramento, as músicas de Survival surgem tematicamente ligadas, fazendo deste, provavelmente, o álbum mais coeso da discografia de Marley. Gravado no seu estúdio Tuff Gong, na Jamaica, praticamente sem a presença do já mencionado Blackwell, o músico estava completamente à vontade para agir (a sua única concessão foi deixar, relutantemente, cair a palavra “Black” do título do disco).

O arranque é com “So much trouble in the world”, uma das músicas mais bonitas e sentidas de toda a sua carreira, mostrando mais uma vez a extraordinária capacidade de Marley em passar uma mensagem profunda sob uma instrumentação doce e relaxada. “Zimbabwe” é dedicada à luta pela independência do país, que na altura ainda era dominado por colonos brancos. Não é de estranhar que este tema fosse ouvido na selva, pelos guerrilheiros, e que Marley fosse o convidado de honra da festa/concerto que celebrou o fim da Rodésia e o nascimento do Zimbabué, em Abril de 1980. Segue-se “Top Rankin”, uma crítica aos chefes de máfia negros da Jamaica que, ao serviço dos dois partidos rivais espalhavam o terror por entre a população. Um pedido de união e uma chamada de atenção: “They don’t want to see us unite” e, mais tarde, “All they want us to do is keep on killing one another“.

“Babylon System” é a descrição do mal no mundo, aquilo que impede o homem de ser bom e livre. É um pedido para que o homem negro se revolte, corte de vez com a escravatura mental e impeça que o “sistema vampiro da Babilónia” se continue a alimentar do sangue dos sofredores. Segue-se a faixa-título, com o slogan “we’re the survivors, the black survivors“, um hino contra a desigualdade social e económica, que tem como resultado o sofrimento dos mais vulneráveis, algo que ainda hoje é tão actual. “Africa Unite” é exactamente o que diz, uma exortação ao levantamento dos países africanos face ao domínio colonial que ainda não tinha acabado, com Marley a juntar o desejo o regresso de todos os africanos à terra-mãe.

“One Drop” é uma luz de esperança no meio da luta. Ao mesmo tempo que pede resistência contra o sistema, assegura que “Deus nunca nos desapontará”. De seguida, “Ambush in the night” dá-nos a primeira vez que Marley reage musicalmente ao atentado à sua casa, ao qual sobreviveu apesar de ter sido baleado. Mais do que a sua traumática experiência pessoal, a mensagem é alargada à violência na Jamaica, provocada por líderes políticos gananciosos para quem a vida dos jamaicanos pouco ou nada valia.

Survival fecha com “Wake up and live”, uma incursão suave pelo funk à moda da Jamaica, possivelmente uma influência de James Brown, de quem Marley era um grande fã. Depois de nove faixas de luta, desespero e sofrimento, a última canção do disco é um hino à vida mas também à capacidade de resistir às contrariedades, com certeza na vitória. “Rise, ye mighty people, there’s work to be done” é a frase-chave.

O disco mais político até então da carreira de Marley é servido com uma música que nos hipnotiza. Depois do salto qualitativo das gravações feitas em Londres, a produção de Survival continua a ser excelente, embora talvez um pouco menos polida e artificial. A banda está mais coesa que nunca e, num trabalho tão marcado pelo sangue e pela angústia, as vozes incríveis das I-Three (o coro feminino no qual pontuava Rita Marley, mulher de Bob) e a construção musical dão ao conjunto uma doçura e uma beleza difíceis de igualar.

Mesmo que não se prestasse atenção às letras, Survival seria sempre um grande disco e uma delícia de ouvir. Ouvindo as palavras, temos perante nós uma obra cuja beleza sonora é igualada pelo seu profundo significado político.



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