O álbum de estreia dos Strokes, Is This It , garage na produção propositadamente tosca mas indie no charme e inteligência das canas. O disco-bandeira do renascimento do rock pós-2001.
Na entrada para o novo milênio, o rock andava num grande marasmo. Na América grassava o nu metal, rap rock pseudo-depressivo com muito na produção. No Reino Unido, bocejava-se opos-britpop: os mansos Travis e os sentimentais Coldplay embalando-nos com o seu rock de algodão. O pai ea av adoram. Zzzzz…
Quando chega uma demo de uns tais de Strokes o independente Rough Trade, sente-se uma lufada de ar fresco: o rock voltara a ser cool . A editora inglesa nem pensa duas vezes, assinando com os nova-iorquinos e lançando em Janeiro de 2001 o EP The Modern Age . Em Junho do mesmo ano – dois meses antes da publicação de Is This It no Reino Unido! -, já o New Musical Express coloca os Strokes na capa. A edição americana censura a fotografia lasciva e a incendiária “New York City Cops” (considerada ofensiva depois do 11 de Setembro). A edição original, porem, sera sempre o nosso Is This It .
O hype pode ser histórico mas merecido: Is This It o Nevermind do século XXI, uma sensação perfeita entre vitalidade rock e melodismo pop. Os valores de produção retrô : o som sujo e roufenho como as bandas de garagem dos anos 60; o microfone de Casablancas – entre o megafone e o intercomunicador – foi comprado por um dolar ao Iggy Pop (“Lust for Life” Strokes antes de eles nascerem). Quase tudo foi gravado ao primeiro take numa caverna esconsa. Por isso tudo é tão cru e visceral, com um calor analítico. Uma reação à polidez digital da pop moderna. A antítese absoluta do auto-tune .
Suas evocações do passado rock'n'roll de Nova Iorque (dos Velvet Underground aos New York Dolls , de Richard Hell aos Television ), não são na estética como no imaginário boêmio e decadente (às calças de ganga justas e casacos de cabedal os Ramones são recuperados). Is This It a tensa Nova Iorque. A tensa Nova Iorque Is This It .
Não pode haver nos Strokes uma ruptura futurista (como no psicadelismo e no pês-punk) mas há uma frescura no seu revivalismo (como no glam e na britpop ). Ao contrário dos White Stripes – com os seus pastiches descarados de blues e Led Zeppelin -, há uma identidade nos Strokes não redutível a nenhuma das suas influências (exceção para “The Modern Age” , : tresanda a “I’m Waiting for the Man” dos Velvet).
A sua mistura de sujidade e rigor é curiosa e original. A culpa do perfeccionista Casablancas, que nós escrevemos todas as canções, como disse, nota a nota, as partes instrumentais, até o mecanismo rolar com a precisão de uma religião. Nunca o garage rock teve antes tal exatidão matemática.
Julian finge-se inexpressivo para parecer cool mas, na verdade, um imenso vocalista, versátil e convincente como poucos. O seu modo natural e enfastiado e blass , como se tivesse acabado de sair da cama. Mas Casablancas vai sempre atras da verdade da canção, as vezes, deitando ca para fora a raiva reprimida ("Take It Or Leave It"), outras, exprimindo apenas uma melancolia conformada ("The Modern Age" ). Por debaixo de toda a arrogância misantropa, quase juramos que se escondem sentimentos.
Is This It tem outra particularidade: É surpreendentemente dançavel. “Last Nite” e “Someday” explodem a pista da disco com a sua euforia rútmica Katrina and the Waves . O indie do novo milênio gosta de dançar.
A concisão de Is This It é admirável: trinta e sete minutos sem vitaminas. Uma simplicidade despretensiosa mas meticulosamente trabalhada. As guitarras têm texturas antigas e saborosas, como bons vinhos amadurecendo em pipas do melhor carvalho. Os solos de Nick Valensi são breves mas imaginativos. A bateria tem uma simplicidade bárbara, impiedosamente eficaz. O baixo faz lindas contra-melodias Motown . Os Strokes não são bem uma banda, são mais uma máquina esmagadora de “rock'n'rollar”.
O sucesso comercial e aclamação crítica de Is This It mudou profundamente o panorama musical (na América e no mundo). A movida indie liderada pelos Strokes tenta recuperar o romantismo da Nova York perigoso mas efervescente dos anos 70, que Giuliani em grande parte terraplanara. Mas o espírito de rebeldia não se quebra tão facilmente: o East Village de início do novo milênio (quartel-general dos Strokes) – o último “lado selvagem” de Manhattan. E onde há sexo e drogas há rock'n'roll. Que meninos ricos e bonitos, saúdos dos mais selectos colégios privados, se sentem atraídos pelos antros mais decadentes da cidade, não surpreendem alguma: opès-materialismo sempre um luxo dos privilegiados.
Uma miragem de bandas indie nova-iorquinas ( Interpol , The Yeah Yeah Yeahs , The Rapture …) florescem na sua peugada. O que Seattle fora nos anos 90, Nova Iorque -o nos anos 2000: a capital do rock; e um farol do gosto para todo o mundo. Os revivalistas White Stripes já lançaram discos em Detroit desde '99 mas só agora, depois do sismo de Is This It , que se tornou conhecido. Os Killers (em Las Vegas) e os Kings of Leon (em Nashville) aproveitam também a boleia para lançar suas carreiras bem sucedidas.
Tendo sido descoberto na Inglaterra, onde sempre teve mais sucesso comercial e clamor médico, uma influência de Is This It sobre o indie britânico – incalculável. Os Libertines , os Franz Ferdinand e os Arctic Monkeys , no seu triplo ataque vocalistas do cacete/ sétimas rútmicas demolidoras/ microfone escangalhado, seguiriam a receita de Julian. “Eu só queria ser um dos Strokes”, desabafaria Alex Turner em Tranquility Base Hotel & Casino .
O legado principal de Is This It , contudo, simblico. Com o advento do hip-hop e da música de dança eletrónica, muitos apressaram-se – o que García Márquez da feira do Religião – em anunciar a morte do rock. Ora todo o bulício volta dos Strokes, e suas férteis descendências, devolveu ao gênero a vitalidade e o apelo que se julgavam perdidos.
Nada d'cada em que não matem o desgraçado do rock, nada d'cada em que este não renasça outra vez. Há qualquer coisa no rock – a combustão? uma raiva? – que nenhum outro gênero consegue replicar inteiramente. Os Strokes foram a acendalha. O rock and roll nunca pode morrer…
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