terça-feira, 30 de abril de 2024

Muddy Waters “At Newport 1960” (1960)

 

Um dos mais icónicos encontros da história do rock’n’roll ocorreu numa estação de comboios de Dartford, nos arredores de Londres, numa manhã de outubro em 1961. Dois jovens dirigiam-se às respetivas aulas… Um levava consigo uma guitarra. O outro segurava, nas mãos, dois LP. Um deles era Rockin’ at the Hops de Chuck Berry, o segundo sendo a compilação The Best of Muddy Waters que, poucos anos antes, reunira num álbum uma série de singles que Muddy Waters havia registado para a Chess Records, casa de referência dos blues de Chicago, desde a aurora dos anos 50. Se juntarmos à história os nomes das personagens e algumas consequências daquele momento o jogo de coordenadas ganha mais sentidos. Quem levava consigo a guitarra era Keith Richards. E os discos seguiam nas mãos de Michael Taylor (que o mundo conheceria pouco depois como Mick Jagger)… Os LP motivaram uma conversa e um primeiro encontro para ouvir mais discos… Alguns meses mais tarde, na hora de pensar o nome para a banda que juntaria os dois, olharam para o alinhamento do ‘best of’ de Muddy Waters e encontraram a pista no título de uma das faixas: Rollin’ Stone. 

Não era preciso esta narrativa para justificar a importância da obra de Muddy Waters, figura central na divulgação mundial dos blues de Chicago e importante força no desafio de eletrificar os blues, facto que na altura custou (sem surpresa) a crítica dos espíritos mais conservadores. Na verdade a obra gravada de Muddy Waters precede em muito aquele disco que ajudou a juntar Jagger e Richards, tanto que, mesmo antes de registar o seu primeiro 78 rotações em finais dos anos 40, já na alvorada dessa mesma década fora figura presente numa das históricas gravações de campo de Alan Lomax. Mas o peso icónico que o músico conquistou através desse episódio recorda quão marcante foi a sua voz para uma nova geração de músicos para a qual, além daquele ‘best of’, o disco ao vivo registado no Festival de Jazz de Newport (no estado de Rhode Island, nos EUA) em 1960 foi outra importante fonte de encantamento e ideias.

Gravado e editado nesse mesmo ano, At Newport 1960 (que foi um dos primeiros LP de Muddy Waters e representou a sua primeira edição de uma atuação ao vivo) capta ecos não apenas do momento da desafiante abordagem elétrica aos blues como traduz um tempo em que esta música começava a ganhar focos de atenção junto de novos públicos, nomeadamente entre jovens brancos norte-americanos e também em solo europeu. O concerto que podemos escutar em disco na verdade esteve quase para nem acontecer, já que os motins que se seguiram à atuação de Ray Charles na véspera por pouco não levaram ao seu cancelamento. Já frente a serena plateia, Muddy Waters entrou em palco ao fim da tarde de 3 de julho (de 1960, claro), vestindo de negro, em contraste com a opção (a branco) dos elementos da banda que o acompanhava. O disco abre com a gravação então inédita de I Got My Brand on You, gravada cerca de um mês antes. E lança depois um alinhamento histórico ali registado que, a dada altura, e perante uma questão ao público, sobre o que queriam ouvir, e ao obter por resposta “Mojo”, volta a investir por I’ve Got My Mojo Working, que acabara por interpretar, o que explica o facto de ali surgir em duas faixas, a segunda apresentada como I’ve Got My Mojo Working (Part 2).

“At Newport 1960” conheceu edição original em mono, em 1959 pela Chess Records nos EUA chegando, pouco depois ao Canadá e Reino Unido.. O disco conheceu algumas reedições nas décadas de 60, 70 e 80, mantendo o alinhamento, mas a dada altura começando a surgir numa mistura em estéreo, a mesma que encontramos na primeira edição em CD, pela Chess, em 1986. É com uma reedição em CD feita no Japão em 1989 que surgem as três faixas extra que hoje habitualmente encontramos em edições recentes do disco nos formatos digitais.

Da discografia de Muddy Waters vale a pena descobrir álbuns como:
“The Best of Muddy Waters” (1958)
“Sings Big Bill Broonzy” (1960)
“Down on Stovall’s Plantation” (1966)




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