Ao sétimo álbum pós-Pavement, Stephen Malkmus dá-nos aquele que bem poderá ser o seu melhor trabalho a solo até agora.

Já não era suposto Stephen Malkmus andar por aqui. Não tanto pela idade – anda perto dos 50 – mas porque a sua icónica banda de juventude está tão ensopada no som e no espírito dos anos 90 que dificilmente se admitiria que o seu legado pudesse realmente durar até aos dias de hoje. Ele próprio afirmou, há bem pouco tempo, “estar acabado”. Pois, afinal parece bem que não.

Por outro lado – e voltemos à sua idade – os cinquentas são aquela época em que um autor começa a ganhar mais ambições, a fazer covers de Dylan ou discos conceptuais, no fundo a dar ao seu ofício uma aura de respeitabilidade e de respeito de que poderá não ter usufruído no auge de uma carreira. Mas Malkmus não é assim. Aos 51 anos, continua a ser o mesmo slacker de Portland, de calças coçadas e boné na cabeça. E com indie-rock nas veias, diga-se. E agradeça-se.

Malkmus, que nos últimos largos anos se tem rodeado dos Jicks – banda eficiente e de bom gosto -, continua a fazer o que sempre fez: rock alternativo de guitarras, espírito aventureiro e lo-fi antes de isso ser moda, distorção q.b., riffs simples mas viciantes, tudo coberto por aquilo que faz verdadeiramente a diferença para tantos projectos que por aí andam: um sexto sentido perfeito para a melodia pop.

Sparkle Hard não difere substancialmente do que Malkmus tem feito em discos anteriores, como é o caso do antecessor Wig Out at JagbagsA verdade é que, ao longo dos seus 11 temas, o novo disco soa mais coeso, mais assertivo, mais confiante. Desde os tempos dos Pavement e dos saudosos Silver Jews – de que fez parte – Malkmus sempre gostou de misturar beleza e ruído, às vezes escondendo pormenores de incrível brilho no meio do lixo movido a pedal de distorção. Agora, os riffs estão maiores, mais brilhantes, mais “in your face” na mistura, sem vergonha de servirem de traves-mestra a hinos maiores que a vida, como temos alguns por aqui.

Nem tudo são raios de sol, naturalmente. Há o quase space-rock de “Kite”; há a beleza tranquila de um subúrbio branco narcotizado em “Solid Silk”, com as suas discretas cordas, que regressam em “Brethen”; e há até o pseudo-country de “Refute”, com a participação de outra realeza do indie-rock, a inimitável Kim Gordon.

Ainda assim, somos doidos por uma boa canção luminosa, e não podemos deixar de destacar o hino a la Frank Black de “Shiggy” e, acima de tudo, “Middle America”, uma absoluta pérola que condensa, em três minutos e meio, tudo que de bom tem a já longa carreira de Stephen Malkmus.

O homem que sempre compôs e tocou de forma a não parecer estar a esforçar-se demasiado mantém esse charme juvenil, mas o resultado é mais adulto (até as letras tocam, aqui e ali, temas dos dias de hoje, como o racismo ou o assédio sexual), mais coeso e, na nossa opinião, ainda mais satisfatório que o habitual.

Um disco de que o indie-rock estava a precisar e candidato a um dos álbuns do ano.