sábado, 30 de julho de 2022

POEMAS CANTADOS POR RUI VELOSO


 Inimiga De Classe

Rui Veloso


Eu era um combatente de causas meritórias

Meu verbo inteligente floria em oratórias

Eu era mais austero que monge ou faquir

Eu odiava veludo eu não sabia rir


Um dia tu chegaste vinda dos lugares

Onde brilha o podernas gemas dos colares

Olhando como quem não vê quem mais ali passasse

E logo ali fiz de ti uma inimiga de classe


Uma inimiga de classe


Depois de um volte-face dos que só há em novela

Perdi toda a firmeza quase virei cinderela

E num instante de glória foste princesa que olhou

Ao materialismo da história o amor se adiantou


Comi na tua mesa bebendo teus movimentos

E como um escanção provei-te em tragos lentos

Analisei com cuidado o fundo do teu coração

E depois de analisado não vi sinal de exploração


Uma inimiga de classe


Toda essa bastilha que eu tinha em mim inflamada

Tremeu de maravilha abriu mesmo pela fachada

Tu mudaste a minha vida em cento e oitenta graus

Torceste-me as raízes por ti juntei-me aos maus


Agora não sei quem sou não sei mais o que fazer

Sei que me aburguesaste com o teu savoir-faire

Sentado nos teus sofás de criador afamado

Eu canto os amanhãs e não me sinto culpado


Já NãO Há CançõEs De Amor

Rui Veloso


Um deste dias vou poder

apaixonar-me outra vez

sem me importar de saber

se vai durar um ano ou um mês


Correr e saltar num dia

depois não dormir tranquilo

pensar que o amor é isto

e descobrir que afinal é aquilo


Já não há canções de amor

como havia antigamente

já não há canções de amor


Um destes dias vou ser capaz

de encontrar a felicidade

avançar em marcha atrás

ir de verdade em verdade


Dizer que o amor é aquilo

que ontem estava descoberto

e ver que o fim duma paixão

espreita sempre um deserto


Já não há canções de amor

por não haver quem acredite

já não há canções de amor

por não haver quem acredite


E vós almas tão ingénuas

cujo amor não tem saída

que buscais nas tolas canções

o açúcar que adoça a vida


Não percebeis que é o engano

que prova que há uma chance

acertar à primeira não é humano

é a essência do romance


Já não há canções de amor

como havia antigamente

já não há canções de amor

vou investigar o caso

com o máximo rigor

tirar a limpo a verdade

que há nas canções de amor

vou saber se ainda é possível

escrever canções de amor


Jura

Rui Veloso


Jura que não vais ter uma aventura

Dessas que acontecem numa altura

E depois se desvanecem

Sem lembrança boa ou má

E por isso mesmo se esquecem


Jura que se tiveres uma aventura

Vais contar uma mentira

Com cuidado e com ternura

Vais fazer uma pintura

Com uma tinta qualquer

Que o ciúme é queimadura

Que faz o coração sofrer


Jura que não vais ter uma aventura

Porque eu hei-de estar sempre à altura

De saber

Que a solidão é dura

E o amor é uma fervura

Que a saudade não segura

E a razão não serena

Mas jura que se tiver de ser

Ao menos que valha a pena


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