sábado, 1 de junho de 2024

Review: Rhapsody – Legendary Tales (1997)

 


O ano era 1997. Esqueça a versão cinematográfica de O Senhor dos Anéis, esqueça o aclamado Game of Thrones e também desconsidere a grande febre de RPG que invadiu o mundo lá pro começo dos anos 2000. Apesar de ser comumente vinculado a diversas dessas coisas, todas são posteriores ao início da grande epopeia do Rhapsody. Estamos falando dos nobres cavaleiros da terra de Algalord, ou dos músicos de Trieste, Itália. E quando juntamos música e Itália na mesma equação, é bastante possível que tenhamos um trabalho muito bem feito de cunho neoclássico. Os italianos sabem bem como lidar com a música. Quando Luca Turilli começou a procurar companheiros que estivessem dispostos a partir numa jornada para reunir a música sinfônica com o heavy metal, nunca pensou que no horizonte glorioso estaria o panteão da vitória do power metal.

Com Legendary Tales, definitivamente, nasce um fenômeno. Aqui, surge o que viria a ser tratado com symphonic power metal ao redor do mundo nos anos seguintes. Com Turilli e Alex Staropolli é criada a melhor junção de orquestração e metal de viés melódica já feita. Goste da banda ou não, é inegável a importância do Rhapsody para a cena em questão e pela difusão do estilo para uma nova gama de fãs. Epopeias, jornadas sangrentas, batalhas gloriosas e o eterno embate entre o bem e o mal não eram novidades no metal, mas nunca haviam sido tratados com a profundidade que foi apresentada na época.

Conheçam a Emerald Sword Saga, ou a Saga da Espada Esmeralda. A Terra de Algalord, coração das Terras Encantadas, encontra-se sobre a ameaça de um antigo mal, o Lorde Negro Akron, munido com o poder do demônio Kron. Ele só pode ser derrotado com a ajuda de uma arma milenar, forjada com o poder dos anjos, a Espada Esmeralda. Apenas aquele com o coração puro poderia alcançar a Espada e derrotar seus inimigos. O Guerreiro do Gelo, um bravo homem do norte, parte em sua jornada ao lado de diversos guerreiros bravos, belas donzelas, magos e sábios, numa luta contra os monstros e criaturas mais horrendas, pelas cidades já destruídas e arrasadas pelo mal. Pode parecer clichê, mas tal história é traduzida nas canções do Rhapsody de uma maneira nunca vista, o que conseguiu cativar fãs de grupos novos e empolgados. 

Legendary Tales, como se tornaria tradição na carreira da banda, é aberto por um prelúdio instrumental operístico, cheio de corais em crescendo. “Ira Tenax” dá espaço a “Warrior of Ice”, a primeira canção, propriamente dita do Rhapsody apresentada ao mundo. Desde o início podemos observar os detalhes que seguiriam todo o CD. Staropolli e Turilli são tremendamente entrosados, é quase absurda a forma como compartilham criatividade. Outro detalhe: Fabio Lione, até então pouco conhecido, já despontava como um dos mais versáteis e habilidosos vocalistas do metal, o que seria comprovado futuramente. “Rage of the Winter” comprova tais fatores, um refrão muito inspirado e cativante, revelando um vocalista capaz de notas altas, porém poderosas, com um carregado sotaque carcamano que não consegue esconder as origens da banda. Até hoje, não consigo entender porque o rótulo de folk nunca foi atribuído ao Rhapsody, afinal, ouvindo “Forest of Unicorns” você consegue escutar a música tradicional européia da Idade Média com muita clareza. Cinzia Rizzo auxilia no estranho porém grudento refrão.

O próximo ponto alto do disco, e um dos maiores da carreira da banda, é “Land of Immortals”, definitivamente a melhor música do disco, com um refrão espetacular, corais e solos enérgicos, contando com um trabalho muito consistente dos músicos. Vale ressaltar que a banda não contava, aqui, com um baixista oficial, e o instrumento foi executado pelo produtor, Sascha Paeth (Heavens Gate, Angra, Avantasia). A bateria, por sua vez, ficava a cargo de Daniele Carbonera, que tem visíveis (ou audíveis) dificuldades em acompanhar o nível dos demais músicos, e pode contar como um ponto fraco do disco. Ele seria substituído pelo incrível Alex Holzwarth no futuro.

Após esse momento, o disco perde um pouco de força, mas continua sólido e oferece ao ouvinte uma experiência completa, capaz, inclusive, de deixá-lo curioso e ansioso pelo que viria no futuro, seja musical ou literariamente. “Echoes of Tragedy” é uma música dramática e densa, enquanto “Legendary Tales”, uma faixa longa, prepara o fã para mais uma tradição da banda: canções épicas e enormes para fechar os álbuns.

A fórmula do Rhapsody vem sendo emulada, replicada e copiada por muitas bandas desde então, inclusive pelos próprios membros em alguns projetos paralelos. Hoje o grupo passa por momentos confusos, mudou de nome, graças a problemas jurídicos e adicionou um intragável prefixo, passando a chamar-se Rhapsody of Fire. Seu fundador e maior compositor, Luca Turilli, saiu  e montou uma banda própria, chamada … Rhapsody, já que ele havia recuperado os direitos pelo nome. Fabio Lione e Alex Holzwarth deixaram a banda nas mãos de Staropolli, que recrutou um novo line-up. Apesar da bagunça, Alex Staropolli, Fabio Lione e companhia continuam sendo alguns dos nomes mais fortes do metal. Legendary Tales pode não ser o melhor registro da banda, mas é um dos pontapés iniciais mais significativos do gênero.




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