Entalado entre Wish You Were Here e The Wall, Animals é um disco duro e violento, mas que merece o seu lugar entre os melhores da discografia dos Pink Floyd.
Animals surge, na discografia dos Pink Floyd, entalado no meio da sequência mais adorada da sua carreira: Dark Side of the Moon em 1973, Wish You Were Here em 75, depois Animals em 77 e, dois anos depois, The Wall.
Talvez seja essa a razão pela qual o disco tem vindo a ser relativamente menos valorizado, o que, na nossa opinião, tem algo de injusto.
Em 1977, em Inglaterra, havia um novo patrão nas ruas: o punk. Os Pink Floyd, que desde o início haviam sido vistos como vanguardistas, eram agora considerados velhos. Mais, eram considerado o símbolo de uma certa obesidade conceptual e de se terem tornado ricos e amados por meio mundo, à boleia de colossos de popularidade como Dark Side of the Moon e Wish You Were Here.
Nas ruas, Johnny Rotten desfilava com uma muito adequada t-shirt, agora famosa, com a simples frase “I hate Pink Floyd”. O punk cultivava a urgência e não o planeamento e a falta de destreza técnica era uma medalha. Neste novo mundo de 1977, qual foi a resposta da banda de Water e Gilmour? Fazer um disco agressivo, violento, de protesto social…mas à sua maneira.
Este foi o disco em que, de certa forma, se desenhou o futuro imediato da banda, e tudo começou a desmoronar. Waters assumiu como nunca a direcção criativa da banda, conjugando a sua nunca escondida ambição com a falta de inputs criativos relevantes dos seus companheiros, esgotados por anos seguidos de grandes discos e enormes digressões. O baixista ocupou esse vazio, e tirando alguns contributos de Gilmour, não havia espaço para mais ninguém.
O conceito-base já estava na cabeça de Waters havia alguns anos: pegar na distopia Orwelliana de Animal Farm e adaptá-la à Inglaterra de então. Nasce assim um mundo governado por porcos, com cães como o exército e a polícia que ajudavam a controlar as ovelhas, as massas. Se os Pistols cantavam “God Save the Queen” em três acordes cuspidos ao ar, os Floyd queriam também ser relevantes e fazer ruir à sociedade, mas à boleia da literatura e de mais um álbum conceptual.
Animals tem apenas cinco temas, com “Pigs on the Wind”, em duas partes, a abrir e fechar o disco. São os momentos mais tranquilos, e cheios de beleza, com Waters em modo acústico. Das restantes três, “Sheeps” e “Dogs” já vinham de anos antes e eram temas cujas versões iniciais eram tocadas em concerto, chamadas então “Raving and Drooling” e “You Gotta Be Crazy”. Estas, juntamente com “Pigs (Three Different Ones)” constituem o coração do disco, sempre acima dos dez minutos cada.
“Dogs”, ao longo dos seus 17 minutos, é Floyd vintage e talvez a música que melhor ilustra sonoramente este mundo pós-apocalíptico que Waters estava a tentar construir, com momentos que vão da energia ao abandono, do blues aos sintetizadores solitários.
Já “Pigs” arrasta-se num tempo mais lento, com uma nuvem ameaçadora por cima das casas e roncos de porcos sintetizados a assustar os incautos. É preciso dizer, no entanto, que sendo este o recreio de Waters, Animals acaba por deixar espaço para alguns dos solos mais marcantes de Gilmour, que elevam claramente o conjunto. O mesmo sucede em “Sheeps”, com um tom rock mais marcado.
A dureza deste tríptico – embora sempre feita com melodia de grande qualidade – é a razão pela existem as duas versões de “Pigs on the Wind”: “de outra forma, Animals teria sido apenas uma espécie de grito de raiva”, nas palavras do próprio Waters. Que diz do álbum que “embora a violência seja temperada com tristeza – e até traços de compaixão aqui e ali – Animals é um disco muito violento”.
Será, mas é também um grande, grande disco, que no catálogo de outra banda poderia ter sido o seu pináculo.
Os passos seguintes nasceriam daqui. Waters começou a viajar sozinho entre os concertos. As digressões com bonecos insufláveis gigantes e temas complexos tiveram vários problemas técnicos. E a alienação da banda e do próprio Waters atingiu o ponto de ruptura em Montreal, em que o baixista cuspiu furiosamente num espectador particularmente desrespeitoso. Surgia aqui a ideia de uma banda isolada do público, atrás de um muro…
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