Controle da Missão... decolamos. E lá vamos nós! Hawkwind acertou em cheio desde o início, alimentado por ácido e imaginação, este álbum marca o início de uma jornada que continua rumo aos confins do espaço, cerca de 50 anos depois. Hurry on Sundown oferece aquela tela acústica espacial que os fãs adoram e que os Hawks têm construído a cada álbum. Mas é a insanidade de ambas as partes de Paranoia que realmente te deixa saber que você está prestes a ver algo diferente. Os membros da banda vinham e iam, mas o som essencialmente permanece o mesmo. Portanto, este álbum, embora não seja marcadamente diferente de seus outros trabalhos, oferece um excelente modelo do que está por vir. É uma bela viagem.
Mais suave e com um toque mais psicodélico quando comparado às coisas mais recentes, mais voltadas para o hard rock (o cover de "Cymbaline" do Pink Floyd como faixa bônus dá uma ideia de pelo menos uma fonte de inspiração), o que é legal até você lembrar que esses caras nunca foram os melhores compositores, então a energia e as texturas sonoras dessas coisas mais recentes são, na verdade, preferíveis a essas, que são honestamente bem sem graça.
Olá, sou profundamente grato por este e todos os álbuns que você publicou. Muito obrigado! Nerkon
Crônicas do Motor Cósmico: Hawkwind Ano Zero
Em 1970, em meio aos escombros fumegantes do hippie e ao crescente zumbido da tecnologia, algo se acendeu no oeste de Londres: uma faísca radioativa, um experimento sonoro sem bússola chamado Hawkwind. Seu primeiro álbum não chegou rotulado como uma revolução, mas sim como o eco de uma profecia. Não há hinos de estádio ou estruturas complacentes aqui; esta é uma criatura em gestação, um álbum que respira pelos poros da improvisação, onde as arestas do blues, do free jazz e da psicodelia se curvam em direção a uma nova dimensão: um prelúdio lisérgico para o Space Rock. Essas faixas são movidas mais pela intuição do que pela técnica, mais pela urgência do que pelo virtuosismo, como se os instrumentos fossem antenas captando sinais interplanetários ainda a serem decodificados. Este álbum de estreia, lançado pela United Artists, ainda não definia sua direção final, mas deixava claro que a banda tinha os pés na imundície do underground e a cabeça orbitando fora do sistema solar. Era 1970, mas Hawkwind já estava escrevendo sobre um futuro que ainda não existia.
01. Hurry On Sundown 02. The Reason Is? 03. Be Yourself 04. Paranoia Part 1 05. Paranoia Part 2 06. Seeing It As You Really Are 07. Mirror Of Illusion Bonus 08. Bring It On Home 09. Hurry On Sundown 10. Kiss Of The Velvet Whip 11. Cymbaline
Estranhamente, a faixa de abertura me lembra do início de "Santana" (não, não estou bêbado). O som dos teclados é tão furioso quanto o de Gregg Rollie e as percussões não estão longe de "Jingo". Uma boa, mas surpreendente faixa, devo dizer.
Krautrock forte e flutuante com uma pitada de Hawkwind e uma gota de PinkFloyd.
Flutuando: A Primeira Revelação do Viajante Cósmico
Este é um álbum primoroso e soberbo que revela o lado mais selvagem da banda. Sua performance é claramente eclética: aqui, o hard rock se funde com o rock progressivo, adornado com artefatos psicodélicos que transformam a audição em uma experiência intensa e imersiva.
Sem dúvida, é um álbum muito interessante, cheio de nuances, texturas e uma atmosfera psicotrônica que, por vezes, evoca as influências progressivas do Pink Floyd. Composto por cinco músicas cantadas sob a influência da lisergia, o álbum eleva sua sonoridade aos céus. Encontramos arranjos vãos, mudanças de ritmo, atmosferas sombrias e uma sonoridade profundamente ligada à psicodelia. Tudo isso com uma sonoridade densa, até pesada, pontuada por ecos metálicos e um aroma que, por vezes, beira o space rock e o krautrock. A execução instrumental é eficaz e precisa. O conceito que a banda buscou capturar é claramente concretizado. As guitarras são afiadas, repletas de bons riffs, e marcam o ritmo com solidez. A dupla baixo/bateria cumpre seu papel com perfeição: sustenta a estrutura rítmica com facilidade, enquanto os teclados — sejam Mellotron, Hammond ou sintetizador — surgem como presenças sutis, quase espectrais, responsáveis por moldar as atmosferas que envolvem cada passagem. O resultado final é um álbum completo e intenso, sem dúvida um dos ápices do hard prog. O primeiro grande auge artístico da banda.
Impressões Pessoais: Escuridão, Texturas e Fogo Azul
As impressões que esta aventura sonora me deixou foram mais do que positivas. As memórias que eu tinha do álbum não foram fragmentadas ou distorcidas. Pelo contrário: a experiência se expandiu, enriqueceu-se. Cada seção do álbum me trouxe de volta àqueles velhos tempos de psicodelia, de krautrock, de noites banhadas em fumaça azul. Eu temia que um pouco daquele charme tivesse desaparecido com o tempo, mas não: ele permanece intacto. A dose de ácido ainda está presente, amalgamada a elementos da Kosmische Musik, criando uma jornada densa e envolvente. O início é violento, mas logo você mergulha em ondas cósmicas hipnotizantes, apenas para recuperar as forças em uma dança de energia e atmosfera. Músicas titânicas como "The Light from Deep Darkness" mergulham você na lisergia que é "Floating" — o título diz tudo. Ecos de Pink Floyd e Hawkwind mancham os sulcos do vinil e tingem o ambiente de cor. É um álbum profundo, dinâmico, às vezes sombrio e em constante mudança.
Aqui, a banda dá mais um passo em direção à evolução. Sinto-me mais maduro do que em seus trabalhos anteriores. Não há dúvida: estamos em um ponto de virada, o início de uma nova era. Mais tarde, Eloy abandonará seu perfil psicotrônico para se aprofundar nos territórios mais refinados do progressivo, moldando suítes mais elegantes, sóbrias e sofisticadas. Mas essa é outra história. Enquanto isso, aproveitem este álbum cult, uma jornada épica cósmica rumo ao space-prog. Até mais.
01. Floating 02. The Light From Deep Darkness 03. Castle In The Air 04. Plastic Girl 05. Madhouse
Uma excelente tentativa australiana inicial de hard rock progressivo, sério e original, com uma faixa excepcional. "Seasons Of Change", de John Robertson, é, na minha opinião, a segunda melhor música já lançada neste país, um rock triste com todos os elementos na medida certa: uma melodia magnífica e assombrosa, baixo, bateria e cordas perfeitos, um vocal gritado, porém belo, e imagens líricas apocalípticas: "Estrela prateada caindo no chão..."
"A Battle in Your Head": Como um sinal dos tempos, "At the Mountains of Madness" é um álbum conceitual. Mas, para minha grande alegria, ele se aproxima muito mais da psicodelia deslumbrante do que do rock progressivo bombástico, e o álbum também é baseado em guitarras e bastante pesado. A música é excentricamente melodiosa e, como esse tipo de excentricidade sobrevive bem ao tempo, o álbum soa totalmente novo, mas também nos traz aquele zeitgeist específico da era da loucura florida.
Nas Montanhas da Loucura: Crônica de um Doce Veneno
Retornar a este álbum foi como abrir uma caixa lacrada com piche e sol do meio-dia. Uma caixa que continha os ecos de dias corridos, copos de rum sem gelo e densas baforadas de fumaça azul que não só turvavam a visão, mas também aguçavam a audição.
At the Mountains of Madness não foi apenas um álbum para mim: foi um pano de fundo, alimentou muitas manhãs e, acima de tudo, foi uma espécie de animal mitológico que rastejou sobre meu toca-discos repetidas vezes, até que a agulha soubesse seus rugidos de cor. Naquela época, eu o devorava com tanta paixão que ele deixou suas marcas, aquelas que se tornam mais perceptíveis com a idade, quando você volta e ouve não apenas com os ouvidos, mas com as cicatrizes. Ouvi-lo hoje, mais velho, mais calmo, mais cercado de discos do que de excessos, foi como reencontrar um velho amigo que, sem mudar de roupa, me diz coisas diferentes. Há algo em sua ferocidade que eu antes ignorava. Talvez eu fosse jovem demais para notar aquela ponta escondida entre os riffs, aquele senso de ritmo tão no limite, tão escorregadio. Hoje eu o percebo com uma clareza diferente: este álbum exala poder, sim, mas também atravessa certos precipícios que lhe dão personalidade e o tornam ainda mais memorável.
É uma obra-prima progressiva? Acho que não. É uma peça cult essencial para entender o rock australiano dos anos setenta? Sem dúvida. Este não é um álbum para quem busca a perfeição. É para quem ama as arestas, as rachaduras, a fermentação. É um álbum que parece vivo e, como tudo o que vive, às vezes vacila... mas nunca para de avançar. E isso, caro leitor, é o que distingue álbuns que transcendem. Blackfeather nunca soou como uma escola progressiva, mas sim como um ritual selvagem e livre. Há beleza nessa desordem. Em sua mistura de estilos, há uma declaração. E em sua voz, um eco ainda ressoa daquela era vertiginosa em que tudo era possível e as montanhas da loucura estavam logo ali na esquina. Até logo.
01.At the Mountains of Madness 02.On This Day That I Die 03.Seasons of Change Part 1 04.Mango's Theme Part 2 05.Long Legged Lovely 06.The Rat (Suite): a.Main Title (The Rat) b.The Trap c.spanish Blues d.Blazwaorden (Land of Dreams) e.Finale (The Rat)
"Glue" foi o álbum de estreia desta banda peruana de rock psicodélico. Seu som tem elementos pop e garage bem definidos, misturados ao som psicodélico. A maioria dessas músicas é agradável. "And I Saw Her Walking" é provavelmente a única música que não gosto aqui. Por outro lado, mesmo que todas as músicas sejam boas, nenhuma delas é uma verdadeira obra-prima. É por isso que não posso dar a este álbum uma classificação melhor do que 3,5 estrelas de cinco. Na minha opinião, este LP não merece mais.
Um disco altamente consistente e equilibrado, mas o álbum precisaria de faixas de destaque mais impressionantes para obter uma classificação melhor. Ainda assim, muito bom.
Cola e a Sala Encolhida
"Nas rachaduras de um vinil gasto, dorme o murmúrio de uma Lima que sonhou ser Londres, mas acabou dançando descalça entre incensos e eletricidade."
Parte 1: Primeira Imersão na Psicoselva Peruana
Nos anos em que o rock era uma nova língua que falávamos com nosso próprio sotaque, uma estranha efervescência irrompeu nas ruas de Lima: tímida, corajosa e psicodélica. Das cinzas fumegantes do The New Juggler Sound — nome dado àqueles que sonhavam ao ritmo do fuzz e das quimeras elétricas — emergiria uma criatura com tentáculos de órgão Hammond e um coração voltado para a música wah-wah: Laghonia . Seu álbum de estreia, Glue , veria a luz do dia em 1970, em um país onde a modernidade chegava aos trancos e barrancos e os discos de vinil eram passados de mão em mão como contrabando sagrado.
Glue não era um álbum maduro. Era mais uma colagem barulhenta e desorganizada, um primeiro tiro de alerta disparado das cavernas úmidas do subconsciente crioulo. Soava cavernoso, com uma textura que oscilava entre a experimentação e a ousadia. E, no entanto, atingia — como o próprio nome sugere — uma força que não era totalmente compreendida, mas que podia ser sentida. Naqueles grooves ressoavam ecos dos Kinks, dos Stones e dos Beatles mais psicodélicos, mas reconfigurados por aquele filtro tropical e urbano que só Lima podia oferecer. Um rock com sotaque peruano, latino, de rua, e sim: um pouco cafona às vezes, mas com uma intenção honesta e inflamável. Lembro-me da primeira vez que ouvi Glue como alguém que se lembra da primeira bebedeira da adolescência: com uma mistura de ternura, vertigem e revelação. Foi, sem dúvida, o trampolim. O ponto de ignição. A partir daí, comecei a vasculhar a terra do meu próprio país para encontrar aquelas veias de música enterradas que hoje são ouro puro para a alma: El Polen, El Álamo, We All Together, Traffic Sound... Cada descoberta era uma epifania, como descobrir que se vivia em ruínas psicodélicas sem saber.
E embora o álbum não tenha o refinamento de seu sucessor (Etcétera, lá vai, cavalheiros, mãos à obra), há uma crueza encantadora nele. O som é áspero, primitivo, direto. Parece gravado em uma caverna com incenso e ampolas de LSD. Há músicas que pegam fogo como fósforos molhados e outras que simplesmente ficam penduradas, como quadros tortos na parede de uma casa hippie. Mas tudo isso faz parte do charme.
Parte 2: A Linguagem Incompleta da Psicodelia de Lima
Ouvir Glue é como abrir uma caixa de fósforos molhados: você sabe que algo pode pegar fogo, mas nem sempre. No entanto, quando a faísca se acende, ela brilha mais do que aparenta. Em sua aparente falta de jeito técnico e espírito amador, este álbum esconde as sementes de um som mais sofisticado que eventualmente germinaria plenamente em Etcétera. Mas em Glue, a banda ainda explorava sua própria linguagem, montando um quebra-cabeça cujas peças vinham da Inglaterra, mas os dedos que o montaram estavam cobertos de solo peruano.
Laghonia , nesta fase, funciona como um transmissor que ainda não afinou sua frequência. E, no entanto, isso não impede que imagens nítidas surjam desse zumbido. A mistura de órgão Hammond — queimando como uma vela negra — com guitarras saturadas de fuzz e efeitos wah-wah cria um som envolvente e denso, como se estivéssemos afundando em uma sopa quente de psicodelia de garagem. Há intenção, há eletricidade e, acima de tudo, há aquele desejo palpável de inventar uma identidade em meio ao mato de influências estrangeiras. Às vezes, o álbum parece rastejar por um túnel sonoro onde a psicodelia coexiste com ritmos locais disfarçados de batida anglo-saxônica. E aqui reside o verdadeiro valor de Glue: não em sua perfeição — porque lhe falta —, mas em seu esforço para traduzir uma linguagem que não lhe pertence inteiramente. É um álbum que quer falar inglês com alma peruana e, nessa tentativa, comete erros deliciosos, tropeços que o tornam mais humano, mais cativante.
Tomemos, por exemplo, a transição entre "Trouble Child"e " Neighbor " . A primeira é uma subida íngreme: um groove envolvente, órgãos que parecem invocar tempestades e uma guitarra que serpenteia com elegância tribal. Mas então desce para o plano emocional de "My Love ", uma canção cuja lentidão não relaxa, mas sim suspende, congela... e às vezes, sim, desespera. É nessa descida que o ambiente começa a diminuir, onde a experiência se transforma em delírio visual. Tudo desacelera. As cores ficam saturadas. E a psicodelia, que deveria ser crescente, torna-se viscosa. Mas também há um charme aí: Glue não pretende levá-lo a uma jornada perfeita, mas sim a uma jornada sincera. E como qualquer jornada verdadeira, ela tem altos e baixos, curvas estranhas e paisagens que você não sabe se são bonitas ou simplesmente estranhas. O fascinante sobre Glue é que ele está em meio a uma mutação. Há algo reptiliano em seu movimento: não anda em linha reta, mas está indo para algum lugar. Esse "algum lugar" será Etcétera, onde tudo o que aqui é esboço se torna mural. Mas não nos precipitemos. Em Glue , o contorno ainda é rústico, o conceito é verde, mas a fome de exploração já está latente. É o álbum de uma banda que ainda não sabe que será importante. E isso — paradoxalmente — o torna essencial.
Lembro-me de uma noite — nublada por uma fumaça doce e promessas juvenis — em que Glue soava como se o alto-falante fosse um portal. A sala encolheu, as paredes suaram e as notas do órgão flutuaram como balões de carnaval perdidos na infância. A agulha do toca-discos parecia um xamã desenhando círculos no ar, e o fuzz da guitarra abriu rachaduras no chão por onde se infiltraram memórias que nem eram minhas. Naquele transe, entendi que Glue não é um disco para buscar respostas. É um mapa incompleto, uma bússola sem norte, um espelho sujo onde você vê o que quer ver: adolescência, vertigem, erro, busca e, acima de tudo, desejo. O desejo de soar como o mundo, enquanto o mundo entra pela sua janela com um sotaque peruano e o cheiro de ruas molhadas.
A cola não é perfeita, mas é verdadeira. E nestes tempos, a verdade — mesmo que desafinada — soa como o paraíso. Até mais, do canto onde a poeira brilha.
01. Baby, Baby 02. I Must Go 03. Neighbor 04. The Sand Man 05. Billy Morsa 06. Trouble Child 07. My Love 08. And I Saw Her Walking 09. Glue 10. Bahia
Fui concebida enquanto meus pais estavam chapados de ácido, com este álbum clássico tocando no toca-discos. Não exatamente, mas é assim que eu gostaria de ter sido concebida.
Rock livre? Um álbum lendário, na verdade. Alguns vocais são realmente muito selvagens, como um crítico já disse (na página da edição original em vinil). As faixas bônus desta edição são mais psicodélicas e repetitivas (no bom sentido, é claro, eu adoro psicodelia). A primeira delas é claramente melhor.
Phallus Dei: A Gênese Profana do Krautrock
No coração da Alemanha do pós-guerra, onde as cicatrizes do passado ainda ardiam e o futuro parecia incerto, surgiu um movimento musical que desafiou as convenções: o krautrock. Nascido da necessidade de uma identidade cultural, esse gênero rejeitou as influências anglo-saxônicas e abraçou a experimentação sonora. Foi nesse contexto que a comunidade artística Amon Düül surgiu em Munique, em 1967, um coletivo onde música, política e contracultura se entrelaçavam. No entanto, diferenças criativas levaram a uma cisão, dando origem ao Amon Düül II , um grupo que buscava uma expressão musical mais estruturada sem perder seu espírito experimental. Seu álbum de estreia, Phallus Dei (1969), cujo título em latim significa " Falo de Deus", é uma obra que encapsula a essência do krautrock. Com uma mistura de improvisação livre, instrumentação diversificada e uma atmosfera psicodélica, o álbum se desvia das estruturas tradicionais do rock, oferecendo uma experiência auditiva desafiadora e hipnótica. A peça homônima, que ocupa todo o lado B do vinil, é uma suíte com mais de 20 minutos de duração que leva o ouvinte a uma jornada sonora repleta de mudanças rítmicas, texturas e emoções. É um testemunho da liberdade criativa da banda e de sua rejeição às normas estabelecidas.
Phallus Dei não é apenas um marco na história do krautrock, mas também uma declaração de independência artística. É um lembrete de que, em tempos de reconstrução e busca por identidade, a arte pode ser um poderoso veículo de transformação e resistência.
O Evangelho Sônico de uma Nação Desperta
Em algum lugar na Alemanha de 1969, em meio aos escombros ideológicos de um pós-guerra que ainda cheirava a pólvora e à utopia Technicolor de uma juventude febril, um grupo de visionários decidiu não compor canções... mas invocar entidades. Amon Düül II não gravou um álbum: ele oficiou um ritual. Ele o chamou de Phallus Dei , e o eco desse grito ainda ressoa nos túneis subterrâneos do rock experimental, como um mantra primordial do que mais tarde conheceríamos como Krautrock.
O título, "O Falo de Deus", não é gratuito. É um emblema fálico , sim, mas também um símbolo da fertilidade sonora, do caos cósmico que insemina o firmamento musical da Alemanha Ocidental. Phallus Dei é isso: um big bang elétrico em câmera lenta, um nascimento tribal, onde tambores se fundem com batimentos cardíacos e guitarras uivam como hienas famintas no meio de uma cerimônia lunar. Se alguém pensa que Krautrock foi uma tentativa de libertar a música alemã da dominação anglo-saxônica — e certamente foi — Phallus Dei representa sua gênese mais pura, mais delirante, mais ímpia. Ao contrário de seus contemporâneos britânicos, que ainda buscavam canções, harmonias, algo que pudessem assobiar, Amon Düül II escolheu a desintegração: composições atonais, vozes que parecem emergir de um coven medieval, estruturas líquidas que se dissolvem em ácido. Literalmente. Porque este álbum não soa apenas como se tivesse sido gravado sob a influência de drogas psicotrópicas: soa como uma droga em si. A atmosfera é densa, "esponjosa", como diria um ouvinte atento. Não há luz aqui, mas há visões. Não há melodia, mas há invocações. Não há lógica, mas há espírito.
Desde os primeiros minutos, a sensação é de que não se está ouvindo um disco, mas sim testemunhando um transe coletivo. É uma espécie de ato xamânico onde a identidade alemã é reconstruída por meio de ruído, ritmo e ruptura. Mas atenção: Phallus Dei não é facilmente amado. É um álbum taciturno, denso e hermético, como um grimório de símbolos esquecidos. E, no entanto, o ouvinte que ousa entrar — e permanecer — descobre uma obra profundamente generosa. As camadas são múltiplas, as texturas, inesgotáveis. Cada audição revela um novo detalhe: percussão oculta, dissonância estratégica, um grito ancestral. Às vezes, percebe-se uma certa influência britânica: ecos de Pink Floyd, explosões de Soft Machine, um toque de Cream em estado febril. Mas não se engane: Phallus Dei não imita, reinventa. Ele se baseia em rock psicodélico, free jazz, vanguarda e ruído industrial para erigir um novo totem sonoro. Um que, como poucos, captura a vertigem de uma juventude que não queria mais reconstruir.
Ao final da jornada — porque Phallus Dei é exatamente isso, uma jornada — uma pergunta permanece como incenso: até onde podem ir os filhos do silêncio e da repressão quando recebem uma guitarra, um amplificador e uma dose generosa de liberdade? A resposta está aqui, nesta obra-prima do Krautrock. Não é apenas um clássico. É uma revelação. Até mais.
A vida inteira fui barulhenta, ao ponto de me dizerem para calar a boca. A única razão que eu tinha para isso era porque precisava gritar para ser ouvida na minha família. Minha família? É, vocês leram certo. O lado da minha mãe é bem legal, a família do meu pai é a extravagância cantante, dançante musical, tudo musicalmente pirado. Disseram-me que era dotada de uma bela voz, e acho que a culpa disso é do meu pai. Ao contrário do meu pai, de sua criação e seus ascendentes, quero fazer alguma coisa com o talento com o qual fui “abençoada”. Meu pai se contenta em cantar em voz alta em seu escritório e em vender janelas. Minha mãe, no entanto, é química. Ela é quieta, reservada. Eu diria que minha vida escolar e boletins escolares estão cheio de “poderia fazer melhor” e “não aproveita seu potencial máximo”. Quero ir para algum lugar em que possa ir até o meu limite e talvez mesmo além. Cantar em aulas sem que me digam para calar a boca (desde que sejam aulas de canto). Mas, principalmente, tenho um sonho de ser muito famosa. Trabalhar no palco. É uma ambição da vida inteira. Quero que as pessoas ouçam a minha voz e simplesmente... esqueçam seus problemas durante cinco minutos. Quero ser lembrada por ser uma atriz, uma cantora, por concertos repletos e shows lotados West End e na Broadway. Por simplesmente ser... eu.
Isso foi o que escreveu Amy Jade Winehouse, uma menina judia de apenas 13 anos, ao entrar na Sylvia Young Theatre School, com o sonho de encantar o mundo. Todos os alunos, na verdade, tinham que fazer um curto ensaio e a pequena Amy escreveu praticamente um atestado, uma premonição.
Confesso que quando a vi pela primeira vez – foi num programa qualquer da MTV –, ela estava tinindo cantando pros quatro ventos que não iria de jeito nenhum para a reabilitação e não fui muito com a cara dela. Só que seu primeiro hit “Rehab” é impossível se tirar da cabeça. No, no, no. Não tente.
Eu diria que a diva era do que a música estava precisando. Ela é praticamente a Janis Joplin dos nossos tempos, o Kurt Cobain da música inglesa, afinal, pegaram carona com ela as cantoras Lily Allen e Adele, para citar apenas duas.
Mas o fato aqui é: há genialidade na música de Amy? Ou ela era só uma chorona, com letras melosas sobre relacionamentos? Creio que os dois. Ela foi acometida, em 2006, quando fez o play “Back to Black”, por um surto de iluminação. E como explicar se a música dela é realmente boa? Bem, o filósofo alemão Kant, se bem me recordo, falou em sua “Crítica da Razão Pura” que o que é belo é universalmente agradável, não importando o conceito.
O que quero dizer é que sempre vai haver comentários a favor da cantora, tentando fomentar o quanto seu som é bom e porque o é. Ele simplesmente o é. É elegante. Cheio de vida e tem grande capacidade de aceitação. (Até minha mãe gostou dela, apesar de ser a drogada que era.)
Cantora abriu as portas para outras artistas
Com efeito, Amy tentou e conseguiu. Ela pôs um fim no preconceito de certa forma. Se fosse um integrante do Oasis no lugar dela, por exemplo, ninguém faria cara feia ou nenhum tipo de esgar de asco. Contudo, no caso dela: “Oh, lá vai a Amy, mais uma vez bêbada e drogada...” – mas o Ozzy todo mundo gosta de ver doidão, flying high again and again.
Esse é o ponto. A cantora inglesa que nasceu num bairro ao norte de Londres, chamado Southgate, não era somente uma bêbada drogada miserável que dava manchetes em revistas sensacionalistas ou em portais de conglomerados fúteis.
Hoje, dia 14 de setembro, ela sairia 28 anos, saindo assim do temido clube dos 27. Com essa idade, morreram diversos monstros do rock, com Jimi Hendrix, Kurt Cobain, Jim Morrison, Janis Joplin, Robert Johnson e Brian Jones.
Se estivesse viva, ela lançaria já, já seu terceiro CD – o primeiro foi “Frank”, em 2003, referência clara ao seu mestre Sinatra. Amy também havia aceitado casar com o atual namorado, o cineasta Reg Treviss. A diva tinha decidido parar de beber, passando um tempo numa ilha, isolada também das drogas, só na base da água de coco e da rede entre coqueiros.
A família dela acredita que ela tenha morrido por ter tentando parar abruptamente de beber. A autópsia dos peritos e médicos legistas ainda não saiu – o resultado, só em outubro. E o grande culpado pelo abismo diante da cantora não foi ninguém senão seu ex, o ladrão de egos Blake Fielder-Civil, que a introduziu nas ditas “drogas pesadas”.
O pai de Amy, o taxista Mitchell Winehouse, e a mãe, a farmacêutica Janis, se separaram com a filha ainda pequena. E agora se veem diante de uma separação injusta: a pequena Amy sonhadora indo embora, da mesma forma que uma agulha tenta achar mais sulcos no vinil e não acha.
Amy, mais morena, e Reg Traviss
O que ficam são os cinco Grammy conquistados pela jovem cantora e mais de mil semanas no topo das paradas. Em todo o mundo, praticamente. O mais interessante é que Amy trouxe à tona todo o charme dos anos 1950 e 1960. Principalmente em seu look. Cabelos, roupas, tatuagens, olhar perdido e nervoso em direção do chão, sempre com um copo na mão. “Sempre que me sinto insegura, eu bebo. Muito. E eu sou muito insegura o tempo todo”, disse ela em sua biografia, escrita por Chas Newkey-Burden.
Pois bem. O álbum “Back to Black”, produzido por Mark Ronson, deixa o ouvinte arfante. De tão bom (imagine essa versão, que é deluxe). Se você abrir a mente, Amy pode entrar para nunca mais sair. É, a menininha que ganhou aos 13 uma guitarra Fender Stratocaster e tinha uma banda de brincadeira chamada Sweet’n’Sour conquistou o mundo. E deu a sua alma por isso no dia 23 de julho de 2011.
1. Rehab 2. You Know I'm No Good 3. Me and Mr. Jones 4. Just Friends 5. Back to Black 6. Love is a Losing Game 7. Tears Dry On Their Own 8. Wake Up Alone 9. Some Unholy War 10. He Can Only Hold Her 11. Addicted 12. Valerie 13. Cupid 14. Monkey Man 15. To Know Him is to Love Him 16. Hey Little Rich Girl (ft. Zalon & Ade) 17. You're Wondering Now 18. Some Unholy War (Acoustic) 19. Love is a Losing Game (Original Demo)
Amy Winehouse - all vocals Binky Griptite - guitars Thomas Brenneck - guitars Helen Tunstall - harp Perry Mason, Chris Tombling, Pigott Smith, Tom, Warren Zielinski, Liz Edwards, Mark Berrow, Peter Hanson, Boguslaw Kostecki, Everton Nelson, Johnathan Rees - violins Jon Thorne, Kate Wilkinson, Rachel Bolt, Bruce White - violas John Heley, Joely Koos, Anthony Pleeth - cello Andrew MacKintosh, Chris Davies - alto saxophone Jamie Talbot, Mike Smith , Neal Sugarman - tenor saxophone Ian Hendrickson-Smith, Vincent Henry, Dave Bishop - baritone saxophone Steve Sidwell, Dave Guy - trumpet Bruce Purse - bass trumpet Richard Edwards - tenor trombone John Adams - Fender Rhodes piano Salaam Remi, Nick Movshon - bass Troy Auxilly-Wilson, Homer Steinweiss - drums Vaughan Merrick, Mark Ronson, Victor Axelrod - hand claps Frank Ricotti - percussion
Louco de atar, o Tedão é uma figura folclórica nos Estados Unidos. Manobra sua Gibson Birdland com a mesma maestria com que manobra um rifle de caça.
O Motor City Madman, como é conhecido, concedeu uma entrevista histórica à revista Guitar Player americana nos anos 80 na qual ele disse: “precisamos entrar no palco com excesso de poder de fogo. A ideia é não precisar de retorno, afinal, o pessoal da cidade vizinha deve poder curtir o nosso show.” (Tradução livre do tio Zo aqui)
Seus shows são antológicos: sunguinha minúscula nos anos 70, calça com rabo de castor nos anos 80 e entrada triunfal sobre o lombo de um Bisão nos anos 90. Nada pode ser considerado previsível ou minimalista quando o assunto é o Tio Ted.
Não! O bichinho não está nanando no colinho do Tio Ted
É nesse clima de alta performance que o Motor City Madman (não resisti ao trocadilho) nos brindou com a gravação de um show no DTI Energy Music Centre, em Detroit, realizado em 4 de julho (data mais que providencial) de 2008. Até nisso o homem demonstra seu amor à pátria: o dia da independência dos Estados Unidos.
Quando assisti o filme A Águia Pousou pela primeira vez, vi a cena em que os americanos, diferentemente das estratégias e táticas de guerra adotadas por ingleses e alemães, entram atirando pra tudo que é lado numa missão suicida, lembrei direto do Tedão. Se ele fosse milico, ia entrar com uma metralhadora em cada braço metendo chumbo no que quer que se movesse. Mas usa uma guitarra. E esse é o seu 6.000º show em 41 anos de carreira.
O repertório é vasto, abrangendo o que de melhor o homem fez, como Cat Scratch Fever e Free For All (que na versão original de estúdio conta com Meat Loaf nos vocais). Tem clássicos do rock n’roll, como Baby Please Don’t Go. E, obviamente, o hino dos Estados Unidos que teve sua primeira versão para guitarra elétrica com Jimi Hendrix em Woodstock aparece por aqui.
A voz do cara pode ser um desastre e seus solos, às vezes, engasgados. Mas a atitude dele é demais. Poucos o igualam em energia de palco, ninguém o supera. Em algumas músicas ele recebe a ajuda de Derek St Holmes nos vocais e guitarra base, o que deixa o som bem mais interessante. Na bateria temos ninguém menos que Mick Brown (Dokken, aqui chamado Wild Mick Brown) e, no baixo, Greg Smith, que também gravou com Dokken, além de Blackmore’s Rainbow, Alice Cooper e por aí vai.
Aliás, ressalto que Mick Brown rouba a cena em diversos momentos, espancando a sua bateria e mostrando que foi criado na escola do instrumental power trio, preenchendo absolutamente todos os espaços.
Rock ‘n’ roll na veia. Pra quem não tem frescura e curte atitude. E é bom comentar neste post senão vai tomar chumbo, entendeu?
Track List
CD 1
1. Ted Nugent Intro 2. Star Spangled Banner 3. Motor City Madhouse 4. Wango Tango 5. Free For All 6. Stormtroopin’ 7. Dog Eat Dog 8. Need You Bad 9. Weekend Warrior 10. Love Grenade 11. Honky Tonk (with Joe Podorsek) CD 2
1. Wang Dang Sweet Poontang 2. Bo Diddley / Lay With Me 3. Baby Please Don’t Go 4. Geronimo And Me 5. Jenny Take A Ride (with Johnny “Bee” Badanjek) 6. Soul Man 7. Hey Baby (with Derek St. Holmes) 8. Cat Scratch Fever (with Derek St. Holmes) 9. Stranglehold (with Derek St. Holmes) 10. Great White Buffalo 11. Fred Bear 12. Outtro
Ted Nugent (guitarra e vocais) Wild Mick Brown (bateria) Greg Smith (baixo) Derek St Holmes (guitarra e vocais quando indicado)
Um motivo que muitas vezes acaba fazendo com que vários fãs se afastem do Power Metal é justamente quando as bandas esquecem o peso e dão prioridade apenas ao lado mais melódico das composições. Pois aqui, isso não acontece, graças ao idealizador do projeto, Flo Laurin, que capricha na agressividade e faz um grande trabalho. O Sinbreed ainda conta com duas figuras conhecidas da cena, o vocalista Herbie Langhans, do Seventh Avenue e o baterista Frederik Ehmke, do Blind Guardian. Depois de três demos, finalmente o grupo lança seu primeiro full-lenght. E o resultado não poderia ser melhor, com músicas empolgantes, carregadas de vibração.
Já na primeira faixa, o álbum surpreende. “Newborn Tomorrow” tem uma intro acústica, mas depois dos primeiros segundos, desemboca em uma pancadaria das boas, com direito a backing vocals perfeitamente colocados. Da mesma forma “Book of Life” contém até umas passagens com vozes quase guturais, dando um clima excelente. Mais destaques para a veloz “Dust to Dust”, a marcante “Enemy Lines”, os riffs de guitarra em profusão de “Room 101” e a ótima “Arise”, melhor do disco com uma levada de primeira, que conquista o ouvinte já na primeira escutada, além de um refrão de fácil assimilação.
Você, com certeza, já ouviu sons do tipo antes. Mesmo assim, é sempre gratificante quando aparece uma banda que consegue tirar o estilo do marasmo, oferecendo músicas que transbordam energia e talento, além de se afastar um pouco do lado arco-íris/unicórnio alado do gênero. Sem contar que o vocalista não é um canário gritador. Apesar de dois dos músicos serem ocupados com seus grupos principais, vamos torcer para que futuramente tenham tempo de tocar o Sinbreed em frente, pois algo de tamanha qualidade não pode ficar com apenas um disco registrado em sua história. Recomendado a todos os fãs de um bate-cabeça dos bons.
Herbie Langhans (vocals) Flo Laurin (guitars, keyboards) Alex Schulz (bass) Frederik Ehmke (drums)
01. Newborn Tomorrow 02. Book of Life 03. When Worlds Collide 04. Dust to Dust 05. Infinity's Call 06. Through the Dark 07. Enemy Lines 08. Room 101 09. Arise 10. Salvation